O câncer é uma das principais causas de morte em todo o mundo, com milhões de casos novos e mortes anuais. Além dos fatores de risco amplamente reconhecidos, como predisposição genética, tabagismo e exposições ambientais, a obesidade emerge como um fator de risco estabelecido para várias formas da doença.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o sobrepeso e a obesidade estão relacionados a uma porcentagem significativa das mortes por câncer em homens (14%) e mulheres (20%). Esse duo, sobrepeso/obesidade, ultrapassa até mesmo o tabagismo como uma importante causa evitável da doença.
Para compreender melhor essa relação entre obesidade e câncer, AnaMaria entrevistou o endocrinologista Ricardo Oliveira, Mestre pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro do departamento de advocacy da ABESO, e a nutricionista e profissional de educação física Sylvia Pozzobon, pós-graduada em Nutrição Clínica pela UFRJ.
MECANISMOS BIOLÓGICOS QUE LIGAM A OBESIDADE AO CÂNCER
Ricardo Oliveira destaca que há uma série de mecanismos biológicos que conectam a obesidade ao câncer, com ênfase na tríade obesidade, resistência à insulina (RI) e adipocitonegênese do câncer. Esses mecanismos incluem:
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Produção de estradiol: o tecido adiposo, além de armazenar energia, é um órgão metabolicamente ativo. Em pessoas com excesso de peso, a produção de estradiol, um estrogênio feminino, ocorre principalmente no tecido adiposo após a menopausa, o que pode aumentar o risco de certos cânceres sensíveis ao estrogênio, como o de endométrio e alguns tipos de câncer de mama;
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Inflamação crônica: o tecido adiposo também pode desencadear vias inflamatórias inadequadas, levando à inflamação crônica, que está associada à oncogênese. A resistência à insulina, comumente observada em indivíduos com obesidade, resulta em níveis elevados de insulina e IGF-1, ambos agentes mutagênicos que podem contribuir para o desenvolvimento de câncer de cólon e câncer de mama;
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Produção de adipocinas: as células adiposas produzem adipocinas, substâncias que desempenham um papel crucial na proliferação celular, incluindo células tumorais. Esses mecanismos fornecem insights importantes sobre como a obesidade pode influenciar o desenvolvimento e a progressão do câncer.
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TIPOS DE CÂNCER ASSOCIADOS À OBESIDADE E DIFERENÇAS DE RISCO ENTRE HOMENS E MULHERES
Segundo o endocrinologista, a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) identifica que o excesso de peso corporal está relacionado a um risco aumentado de câncer em pelo menos 13 tipos diferentes. Esses incluem câncer de endométrio (útero), mama, ovário, esôfago, rim, pâncreas, fígado, estômago, meninges (meningioma), intestino grosso (cólon), reto, vesícula biliar e tireoide na menopausa.
Globalmente, a carga de câncer atribuível à obesidade é de 11,9% em homens e 13,1% em mulheres para todos os tipos de câncer relacionados à obesidade. Entre os homens, o risco é maior para adenocarcinoma de esôfago (aproximadamente 33,3%), enquanto entre as mulheres, o risco é mais significativo para câncer de endométrio (aproximadamente 34%).
Essas diferenças destacam a complexidade das interações entre obesidade e câncer, exigindo uma abordagem personalizada na prevenção e no tratamento dessas doenças. É importante mencionar também que, de acordo com a Sociedade Americana de Oncologia Clínica, a obesidade é um dos principais determinantes de mortalidade por câncer.
Indivíduos obesos têm uma tendência a responder de maneira menos favorável ao tratamento oncológico e estão mais propensos a desenvolver complicações associadas ao tratamento. Além disso, eles enfrentam um risco aumentado de complicações cardiovasculares. Essas descobertas destacam a importância de abordar a obesidade não apenas na prevenção do câncer, mas também no manejo e tratamento da doença após o diagnóstico.
“Do ponto de vista da saúde pública, combater a obesidade oferece a oportunidade de prevenir um número importante de casos de câncer. Consulta médica regular com o médico endocrinologista é importante para o tratamento, o qual pode requerer o uso de medicamentos e, até mesmo, a cirurgia bariátrica nos casos mais severos”, explica Ricardo Oliveira.
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ESTRATÉGIAS PARA PREVENIR OBESIDADE E CÂNCER
Além da perda de peso, adotar hábitos alimentares saudáveis e praticar exercícios físicos regularmente são fundamentais na prevenção da obesidade e, consequentemente, do câncer. De acordo com a nutricionista e profissional de educação física Sylvia Pozzobon, algumas mudanças no estilo de vida podem ajudar nesse sentido. Confira:
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Avaliação e orientação nutricional: buscar orientação de um nutricionista pode auxiliar na adoção de uma dieta equilibrada, contribuindo para manter o peso dentro de um índice de massa corporal (IMC) saudável;
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Prática regular de atividade física: o exercício físico regular não apenas ajuda na prevenção da obesidade, mas também melhora a resposta ao tratamento oncológico. Durante o tratamento, é importante que a prática de atividade física seja acompanhada por um educador físico e por um nutricionista, garantindo a segurança e a eficácia do treinamento.
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No contexto dos hábitos alimentares saudáveis, algumas recomendações podem ajudar na prevenção do câncer:
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Redução do consumo de álcool e carnes processadas: evitar o consumo de bebidas alcoólicas e carnes processadas, que estão associados a um maior risco de desenvolvimento de câncer;
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Aumento do consumo de frutas, vegetais e fibras: incluir uma variedade de frutas, vegetais e grãos integrais na dieta, fornecendo nutrientes essenciais e fibras que auxiliam na prevenção de várias formas de câncer;
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Limitação do consumo de carnes vermelhas: reduzir o consumo de carnes vermelhas e buscar alternativas proteicas, como leguminosas e ovos.
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“Além disso, o rastreamento de doenças oncológicas, de acordo com as diretrizes recomendadas, possibilita o diagnóstico precoce e, consequentemente, uma maior chance de cura no tratamento do câncer”, informa Sylvia. Essas estratégias de estilo de vida, quando combinadas, podem desempenhar um papel significativo na redução do risco de câncer e na promoção da saúde geral.