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TOD: o que os pais e a sociedade precisam saber sobre o assunto?

Entenda o que é o Transtorno Opositor Desafiador e como dar suporte às crianças e adolescentes que recebem este diagnóstico

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“Os maiores desafios que enfrentei foram a desinformação e uma perspectiva completamente moralista de uma sociedade que também não entendia muito bem esse transtorno, condenando e determinando um fracasso e uma incompetência. Isso me fragilizou demais e me deixou com muito medo do futuro, que aos olhos da sociedade e do desconhecido não eram nada promissores para o desenvolvimento normal. O desafio que enfrentei foi sair daquele sentimento de medo e passar para a responsabilidade”.

É com a fala de Andreia Rossi, mãe da Maria Fernanda, de 17 anos, que começamos a matéria dessa semana, sobre Transtorno Opositor Desafiador (TOD), uma condição de saúde mental que afeta muitas crianças e adolescentes em todo o mundo, caracterizada por um padrão persistente de comportamentos irritáveis, argumentativos e desafiadores em relação a figuras de autoridade. Embora todas as crianças possam exibir comportamentos desafiadores ocasionalmente, aqueles com TOD apresentam de maneira mais intensa e frequente, afetando significativamente sua vida cotidiana e suas relações.

Os desafios do TOD vão além do comportamento "teimoso" comum, exigindo estratégias específicas e coordenadas para manejo eficaz. Pais, educadores e a sociedade em geral desempenham papéis fundamentais no apoio a essas crianças, ajudando-as a desenvolver habilidades sociais e emocionais necessárias para um futuro mais harmonioso. “Já é desafiador o suficiente lidar com filhos neurodivergentes, e lidar com a sociedade é ainda mais difícil, pois não podemos fazer com que as pessoas mudem seu comportamento; muitas vezes, elas estão presas em suas próprias dificuldades e crenças. O que podemos fazer é aumentar sua conscientização, oferecendo informações, estudos e recursos. No entanto, o que elas farão com essa informação é uma questão diferente. Frequentemente, precisamos de paciência e persistência. Meu papel é orientar, oferecer informações sobre transtornos, neurodiversidade, relações e respeito, e encorajar minimamente as pessoas a não criticarem, acusarem ou julgarem as escolhas de outras famílias que enfrentam desafios com crianças neurodivergentes. Apenas quem vive diariamente com uma criança neurodivergente sabe o quanto é difícil. Meu papel vai além da conscientização; é trabalhar pela questão do respeito. Embora a conscientização seja necessária, muitas vezes as pessoas não se sentem motivadas a se conscientizar se não virem a necessidade em sua própria família. É uma questão que abordo em todos os lugares, pois é responsabilidade de toda a sociedade, não apenas daqueles que vivem essa realidade. Estamos caminhando em passos lentos e ainda há muito trabalho pela frente”, enfatiza a mãe da Maria Fernanda.

Sim, é um assunto necessário e extremamente importante. E para falar sobre como os pais podem adaptar suas abordagens parentais, como as escolas podem implementar estratégias inclusivas e como a sociedade pode contribuir para um ambiente mais compreensivo, de apoio e com empatia, na coluna dessa semana discutiremos vamos conversar com mães e especialistas sobre esse tema.

Convivendo com o TOD

Muitas vezes, os pais convivem com o comportamento desafiador de seus filhos sem imaginar que algum transtorno possa estar por trás disso. No caso de Andreia, o que chamou a atenção foi que ainda que sua filha apresentasse comportamentos esperados para o desenvolvimento na fase e na idade em que estava, quando comparada com as outras crianças da mesma idade, ela tinha um comportamento hostil, de frustração, desorganizado e com emoções muito exacerbadas, muito diferente das outras crianças - ela perseverava muito em certas situações que a colocavam em grandes prejuízos. “Mesmo que a gente manejasse, mesmo que a gente orientasse, ela tinha uma dificuldade muito grande em se regular emocionalmente, em compreender, em modificar o pensamento e em modificar a situação. A gente percebia uma rigidez que, na época, eu não conseguia denominar como rigidez; era teimosia, era enfrentamento”, conta Andreia.

Em um primeiro momento, a mãe achou que por ela ter um comportamento tão desafiador, teria que ser muito rígida. Então, assumiu práticas parentais nada saudáveis, muitas vezes coercivas, o que intensificou o problema e trouxe ainda mais desorganização para a relação. “Eu acreditava que, devido ao comportamento desafiador e à dificuldade de regulação emocional dela, ser acolhedora poderia potencializar esses comportamentos. Assim, adotei uma parentalidade autoritária e coerciva muitas vezes”, conta.

Para enfrentar esses comportamentos desafiadores, ela conta que, quando entendeu que era fruto de desorganização e falta de controle emocional, adotou estratégias mais flexíveis e organizadas, com regras e limites claros, fundamentais para o desenvolvimento. “Além disso, trouxe um novo olhar para nossa relação, baseado em escuta, compreensão e na tentativa de entender, primeiramente, a função do comportamento para então oferecer novas estratégias de resolução da situação”, explica. Mas essas estratégias mudam na medida em que ela vai se apropriando de mais conhecimento e conforme observa o comportamento da criança se tornando mais apto e funcional. “Quando ela tem respostas mais organizadas e seu comportamento mais estável diante das diversas situações, aí vou intensificando e aprimorando as práticas parentais mais organizadas. Ao estabelecer essas estratégias, sempre tinha como foco os prejuízos do comportamento da minha filha e buscava agir de forma mais assertiva para que ela pudesse entrar em um ciclo mais virtuoso e com menos prejuízos”, complementa.

Outro desafio que muitas famílias normalmente encontram é em relação aos amigos e familiares, sobre como vão reagir ao diagnóstico. Andreia pontua que a questão da saúde mental é algo que traz muitas dificuldades para as famílias e amigos, principalmente porque culturalmente há uma negação da importância de entender que crianças e adolescentes também têm necessidades especiais quando se trata de saúde mental. “Muitas vezes, há uma distorção sobre o que é saúde mental na infância e adolescência, suas particularidades e necessidades. Familiares, amigos e pessoas próximas frequentemente são julgados nesse contexto. Pais que lidam com a neurodiversidade assumem o papel de educadores e capacitadores, ajudando os familiares e amigos a entenderem esse tema complexo, que não envolve deliberadamente comportamentos desafiadores, mas sim dificuldades reais que precisam de informação”, fala. E continua: “Inicialmente, há uma tendência de questionar se realmente há um problema, se não é superproteção ou se não é esperado um comportamento diferente. Isso ocorre devido à falta de informação. Num segundo momento, há uma compreensão mais profunda sobre o transtorno, mas ainda assim o apoio às famílias é prejudicado e as pessoas que desejam ajudar enfrentam dificuldades para saber como agir. Muitas vezes, as ajudas oferecidas são baseadas em suposições sobre comportamentos padrão que se espera que a criança tenha, o que não reflete a realidade das dificuldades enfrentadas”.

Mas, afinal, como apoiar crianças com TOD e suas famílias? Para Thamiris Camargo, psicóloga infanto juvenil da Clínica Revitalis, a sociedade pode apoiar fornecendo educação pública sobre o tema para aumentar a compreensão e reduzir o estigma. Além disso, políticas públicas que promovam a inclusão escolar e comunitária, acesso a serviços de saúde mental e suporte familiar são essenciais. Iniciativas locais, como grupos de apoio para famílias, também podem ser benéficas. “A conscientização pode ser aumentada através de campanhas educativas nas escolas, mídia e comunidades. Narrativas positivas e precisas podem ajudar a combater estereótipos prejudiciais. Incluir famílias e indivíduos com TOD em discussões públicas e eventos comunitários também é importante”, determina. Outro ponto importante a ser levantado é sobre como os pais dos colegas de indivíduos com o transtorno devem agir. “Devem ser encorajados a educar-se sobre o TOD para melhor compreender as necessidades do colega de seus filhos. Incentivar empatia, aceitação e inclusão é fundamental. Comunicações abertas entre os pais e a escola podem ajudar a coordenar estratégias de apoio”, completa.

O dia a dia escolar

Talvez seja nas escolas que esses comportamentos se tornem mais evidentes. E, por isso, a ajuda de professores e pedagogos é tão importante. Além disso, a instituição de ensino desempenha um papel crucial ao criar um ambiente que apoie as necessidades da criança com TOD. “Isso inclui implementar estratégias de manejo comportamental, como reforço positivo, estruturas claras de rotina e expectativas, e oferecer suporte emocional e educacional individualizado. Programas de educação especial, professores treinados em necessidades especiais e parceria próxima com os pais são fundamentais para o sucesso acadêmico e social da criança”, enfatiza Thamiris.

Na escola de Rafael, de 8 anos, que é filho de Priscilla Silvestre, a rotina dentro de sala de aula já foi muito diferente do que é hoje. Com um dos alunos diagnosticado com TOD, o menino conta que esse colega brigava demais na sala de aula, conversava muito, corria pela sala e, muitas vezes, não respeita a professora. Entretanto, depois que começou o tratamento, as coisas mudaram. “Antes, esse coleguinha do meu filho era uma criança violenta, que batia em todo mundo, inclusive no Rafael. Mas hoje, embora algumas crianças ainda tenham dificuldades para lidar com ele, principalmente na aula de Ed. Física, em que ele revida se alguém bater a bola nele, por exemplo, por estar sendo tratado com medicamentos e terapia, já melhorou um pouco”, conta. Mas não foi fácil lidar com tudo isso até o diagnóstico aparecer. Priscilla lembra que, para evitar apanhar, o filho acabou se juntando ao menino e ela começou a ser chamada na escola com frequência. “É uma situação bastante difícil não apenas para os pais de quem tem o filho com esse diagnóstico, como também para quem convive. Por vezes, eu não sabia como lidar com a situação direito, porque, por um lado, queria proteger meu filho, mas por outro imaginava como estava sendo para esse menino”, complementa.

Para Andreia, mãe da Maria Fernanda, a escola desempenha um papel muito importante e muitas vezes, por falta de informação, adota práticas que não são saudáveis e que levam ao comprometimento dos comportamentos. “Como mãe, estabeleci uma relação próxima e de parceria com a escola, explicando que entendia o desafio enfrentado pelos professores, muitas vezes sem formação técnica sobre transtornos. Mostrei que tinha um grande interesse em promover um ambiente escolar mais organizado para minha filha. Assumi que era meu papel desenvolver essa parceria com a escola, sabendo que, sem isso, ela não poderia colher frutos positivos nesse ambiente”, esclarece.

Priscila de Moraes, Psicopedagoga e Coordenadora Pedagógica da EDF - Escola do Futuro Brasil, explica que entre os principais desafios ao trabalhar com alunos com TOD está manter a calma e pensar em processos que ajudem a criança. “Mesmo quando estamos em um momento de estresse, é um desafio enorme. É muito fácil ficarmos irritados quando precisamos lidar com uma criança opositora. Contudo, se observamos pelo ponto de vista da criança, que precisa de ajuda constante, que não é controlável o comportamento dela sem ajuda, podemos fazer boas orientações”, pontua. 

Por serem alunos que habitualmente trazem desafios para dentro da escola, a psicopedagoga encontrou algumas “técnicas” para ser mais eficaz com esses alunos. “Lembrar de reconhecer os pequenos comportamentos positivos vai criando conexão e cada vez mais colaboração com esses alunos”, diz. Ela alerta, ainda, sobre um ponto bastante importante: evitar apenas indicar quando apresentam um comportamento inapropriado, o que é frequente, alimentando um ciclo negativo e sem possibilidades de mudança. É preciso valorizar os bons momentos também. “Outros pontos importantes são desenvolver empatia com exercícios de se colocar no lugar do outro, aprender o que pode fazer nos momentos de frustração e trabalhar muito com esse aluno resolução de problemas, orientar e observar a socialização, que normalmente é bem difícil para esses alunos terem amigos”, complementa.

Mas, afinal, como promover um ambiente inclusivo para alunos com TOD? “Conversas com o grupo sobre empatia, combinados, entendimentos sobre como ajudamos quando alguém está bravo, como nos defendemos sem agredir, são necessários para que os alunos possam entender os desafios como grupo. E essas conversas precisam ser relembradas antes de um jogo, antes do parque, antes de alguma atividade que sabe que pode gerar conflito. O educador tem o poder de prever e organizar isso com os alunos, faz parte do processo educativo”, diz a psicopedagoga

Acompanhamento é fundamental

Crianças e adolescentes habitualmente têm comportamentos desafiadores. Entretanto, há alguns sinais que pais e educadores devem observar e que merecem maior atenção.

O psicólogo Alexander Bez, que é especialista em saúde mental, explica que há alguns sinais precoces de TOD que pais e educadores devem observar, como comportamento desafiador, quando a criança frequentemente desafia e desobedece figuras de autoridade; agressividade e irritabilidade frequentes; participação em discussões e bate-bocas, quando se engajam regularmente em discussões e insistem em ter a última palavra; tendência a culpar os outros por seus erros ou mau comportamento; recusa persistente em seguir regras e instruções; demonstração de comportamento vingativo ou ressentido; baixa tolerância à frustração, com reações desproporcionais a pequenos contratempos; e tentativas frequentes de manipular situações e pessoas. “Reconhecer esses sinais precocemente é essencial para buscar ajuda profissional e implementar estratégias de intervenção”, enfatiza. “Um diagnóstico precoce e correto de Transtorno Opositivo-Desafiador é crucial porque permite intervenções imediatas, prevenindo a escalada de comportamentos desafiadores. Isso facilita o desenvolvimento de estratégias educacionais e comportamentais adequadas, melhora as habilidades sociais e emocionais da criança, e previne problemas secundários, como dificuldades acadêmicas e baixa autoestima. Além disso, proporciona apoio essencial para as famílias, reduz o estigma associado ao transtorno e melhora significativamente o prognóstico a longo prazo”, complementa.

Uma vez que perceba que o filho apresenta alguns desses sinais, é necessário fazer um acompanhamento psicológico e neurológico pediátrico para detectar comportamentos ou emoções desreguladas. “A criança ou o adolescente necessita desse acompanhamento para entender e compreender melhor seu papel em sociedade e em suas interações diárias. Para compreender suas reações e necessidades, e não partir para uma fase adulta cheia de problemas de enfrentamento. Crianças que não lidam bem com frustrações são adultos insatisfeitos com a própria vida e possuem dificuldade de se relacionar com quem quer que seja. Tudo precisará ser voltado as suas necessidades, assim como sempre foi em sua infância. Então, para que isso seja naturalmente evitado, será preciso entrar com mediações psicológicas e se necessário medicamentosa”, comenta Deise Moraes Saluti, que é psicóloga e neuropsicopedagoga.

Entre os tratamentos, Deise sugere psicoterapia infantil com atividades de arteterapia e trabalhos psicoterapêuticos como, por exemplo, o controle de suas atividades e as recompensas em suas boas atitudes. “Um bom trabalho a fazer é um quadro com tarefas e recompensas. E, claro, se existe recompensa, existe punição. É necessário os pais aprenderem a punir de forma segura e com o amparo da psicologia. Vale dizer que, em alguns casos mais graves de agressividade ou automutilação, acaba sendo necessário um psiquiatra infantil para a administração de medicamentos. Porém, com o passar do tempo e do período de adaptação do medicamento ou da terapia, se faz necessário um acompanhamento terapêutico e o ajuste medicamentoso uma vez por mês”, complementa.   

Alexandre diz, ainda, que um plano de tratamento individualizado, envolvendo profissionais de saúde mental, pais e educadores, é essencial. “As opções mais eficazes incluem Terapia Comportamental Cognitiva (TCC), para modificar pensamentos e comportamentos negativos; treinamento para os pais, para aprenderem estratégias de manejo comportamental e comunicação eficaz; intervenções escolares, com planos de manejo comportamental e apoio educacional personalizado; terapia familiar para melhorar a dinâmica familiar e a comunicação; medicamentos para comorbidades como TDAH ou ansiedade, se necessário; e treinamento de habilidades sociais para melhor resolução de problemas e interações sociais.

E um alerta importante: o TOD é um desafio não apenas para as crianças e adolescentes que enfrentam o transtorno, mas também para os pais, que muitas vezes não impõem limites por medo, por não achar justo o filho passar vontade, por não regular o impulso de aceitar tudo que o filho pede para não o frustrar. E aí, quando a criança ou o adolescente percebe essa brecha ou facilidade para conseguir o objeto de desejo, tudo fica mais complicado. “Vale relembrarmos o caso de uma menina de 20 anos, exigindo que a mãe comprasse o iphone 15 em um shopping, e a mãe, por se recusar a aderir as vontades da filha, presenciou uma cena de transtorno opositor desafiador, vendo sua filha se debater no chão, como uma criança de 5 anos fazendo birra por um brinquedo. Nessas características de comportamentos, fica claro a necessidade dos pais de impor limites e regras em todo tempo necessário. Se reagir com agressividade ou descontrole emocional, os pais precisam agir imediatamente. Sentar com essa criança, apresentar-lhes os motivos nos quais não é possível atender o pedido, dizer o quanto isso pode prejudicar e, enquanto houver resistência, não atender aos pedidos”, determina Deise.

Direto ao Ponto

Quando falamos sobre transtornos como o TOD, nossa mente se inunda de questões. E para elucidar essas dúvidas, conversamos com Danielle H. Admoni, psiquiatra geral e da Infância e Adolescência, pesquisadora e supervisora na residência de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM) e especialista pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria); e Beatriz Fonseca, psiquiatra da Clínica Revitalis, Pós graduada em Psiquiatria da Infância e Adolescência pela UFRJ e IFF .

Aventuras Maternas - Quais são as características do TOD?

Beatriz Fonseca – O Transtorno Opositor Desafiador (TOD) pode ser definido como um padrão persistente de comportamentos negativistas, hostis, desafiadores e desobedientes observados nas interações sociais da criança com adultos e figuras de autoridade de uma forma geral (pais, tios, avós, professores etc). Como características principais temos a frequente perda de paciência, discussões com adultos, recusa a obedecer solicitações e regras, desafio, implicância e perturbação gratuita a outras pessoas, responsabilização de outrem por seus erros ou mau comportamento. A criança se aborrece com facilidade e comumente se apresenta enraivecida, irritada, ressentida, rancorosa, externa ideias de vingança. Tudo isso sem que haja motivo aparente ou suficiente para tais comportamentos. Esse comportamento em geral ocorre em ambientes diversos e deve causar claro prejuízo a vida social, ocupacional e acadêmica da criança. É importante observar que no TOD ainda não há sérias violações de normas sociais ou direitos alheios, como ocorre no Transtorno de Conduta. O TOD ocorre entre 2 a 16% das crianças em idade escolar e tem seu início por volta dos 6 anos de idade. Antes da adolescência parece incidir mais sobre crianças do sexo masculino (1,4:1). A causa não é claramente estabelecida, mas há mais chance de ocorrer em crianças que vem de lares disfuncionais, com pais que são excessivamente rígidos, violentos e/ou agressivos ou ao contrário, filhos de pais que não estabelecem limites claros sendo permissivos e inseguros ao estabelecerem regras.

Aventuras Maternas- Como os pais devem lidar com uma criança diagnosticada com TOD?

DanielleH.Admoni - Isso é muito individual. Cada criança é de um jeito. Cada família é de um jeito. Mas, no geral, uma questão muito importante que aparece é uma dificuldade de lidar com limites, aceitar um não. E os pais vão ficando cada vez mais fragilizados em relação a isso, cada vez mais rigorosos. E nem sempre funciona. Por exemplo: eles deixam de castigo, sem celular, e mesmo assim a criança continua com esse comportamento opositivo desafiador. Então, na verdade, a família, os pais precisam aprender a lidar com os limites da criança. Aprender a dar limites para a criança, mas, ao mesmo tempo ser acolhedor. O que é muito difícil para a família. Por isso, um dos tratamentos mais indicados é a terapia de família. Essa família poder pensar sobre suas relações e onde cada um entra. Como eles irão dar limites para essas crianças.

Aventuras Maternas - Quais são as principais estratégias que os pais podem adotar para manejar comportamentos desafiadores em casa?

Danielle H. Admoni - Então, isso depende de novo de cada família. Tem algumas questão importantes quando a gente fala de comportamento desafiador, não especificamente do TOD. Então, às vezes a gente tem que avaliar, aquela criança pode estar cansada, estar com fome, o linear da criança é diferente do adulto. Uma criança com fome, por exemplo, ela vai gritar, vai chorar, ela vai se irritar facilmente. Então, a gente tem que avaliar aquele contexto. Agora sim, se a gente está falando de um TOD, de uma coisa que é repetida, essa questão da frustração precisa ser trabalhada através do limite. Na verdade, acaba sendo ao contrário, os pais não dão limites, e a criança não aceita se frustrar. E quando ela é frustrada, acaba tendo um comportamento excessivo. Então, é muito importante que esses pais consigam dar limites sempre para essa criança. Mas, também ter uma postura acolhedora. Então, por exemplo, elogiar quando alguma está certa, quando ela faz alguma coisa legal. Às vezes, essas famílias acabam vivendo de extremos. Ou zero limite. Ou limite demais. Acaba ficando muito difícil essa relação. Por isso, que em geral, tem muito a ver com a relação com os pais, e a terapia de família está bastante indicada. Mas, basicamente é isso. Primeiro avaliar aquela situação. Se é o momento mesmo de brigar ou colocar de castigo. Ou é melhor esperar a criança comer, descansar e depois ir conversar com ela. Avaliar se vale à pena aquela briga. E trabalhando os limites no dia a dia. É o que eu sempre falo, se a gente não dá limites para a criança com 5, 6 anos, não adianta a gente querer com 15 anos colocar os limites que nunca foram colocados. A aceitação não vai existir.

Aventuras Maternas - Como os pais podem estabelecer limites claros?

Danielle H. Admoni - Com combinados. E é muito importante que os pais mantenham esses combinados. O que não acontece na prática. Então, vamos dar um exemplo bobo: o seu horário de desligar a televisão é 21 horas. Se eu deixo a criança até 21h 30, 22h, essa criança vai entender que essa regra é mais ou menos válida. Então, é importante que os combinados sejam seguidos, principalmente, pelos pais. A criança ela é desafiadora, mas na verdade ela pede limite. Ela pede regra. A criança ela não tem condição de mandar na casa, muito menos de mandar nela mesma. Então, essa questão que estamos falando não precisa ter uma punição severa, mas precisa se manter os combinados. E os combinados podem ser recombinados. Eu sempre falo isso para os pais, por exemplo, se o horário de dormir era às 21h e isso passa para 21h 30, se isso foi combinado entre a família, entre os pais da criança, ok! Agora o que não dá é um lado romper isso, e o outro lado fingir que nada aconteceu. Porque daí você estará ensinando que não existe limite. Que se eu fizer as coisas do jeito que eu quero nada vai acontecer comigo. E eu posso ir testando esse limite dentro e fora de casa. Então, a questão dos combinados é fundamental.

Aventuras Maternas - Qual é o papel da escola no apoio a uma criança com TOD?

Danielle H. Admoni - Os combinados também precisam acontecer. Se todas as crianças precisam lanchar até 10h, aquela criança com TOD também tem que lanchar até 10h. Ela ficando brava ou não. Porque se a gente vai abrindo exceções e flexibilizando os combinados, a criança entende que ela dá conta, que ela pode. Ela vai pegando essas brechinhas, ela vai aproveitando para “mandar”, achar que manda nos adultos, e isso gera uma baita de uma ansiedade nela. Então, de novo, é muito importante que os combinados sejam mantidos, sejam respeitados, tanto dentro de casa, como na escola. A conduta na escola acaba sendo mais ou menos a mesma que dentro de casa, de respeitar a questão dos limites e respeitar a questão dos combinados.

Aventuras Maternas - Que tipo de treinamento os professores devem receber para lidar eficazmente com alunos com TOD?

Beatriz Fonseca - As escolas devem promover capacitação dos professores para que possam reconhecer e conhecer melhor os sintomas traçando as melhores estratégias pedagógicas / educativas para a criança. Essas capacitações em geral são feitas por psicólogos e/ou psiquiatras especialistas. Estar em contato com os profissionais de saúde para que as orientações e possibilidades da escola sejam conhecidas por todos para que as estratégias traçadas sejam possíveis e não fantasiosas.

Aventuras Maternas- Quais são algumas adaptações práticas que podem ser feitas na sala de aula para apoiar essas crianças? 

Beatriz Fonseca - Sentar a criança na frente da sala; estabelecer tarefas e horários, se necessário, por escrito; colocá-la como “auxiliar” sempre que possível; estabelecer regras e punições com clareza; elogiar sempre que apresentar um comportamento positivo; não fazer críticas ou “dar broncas” na frente dos outros alunos; auxiliar na socialização do aluno; estimular o autocontrole, a autopercepção, a auto organização e a autonomia da criança.

Aventuras Maternas - Quais recursos comunitários são importantes para apoiar essas famílias?

Danielle H. Admoni - Apoiar os pais. E, na verdade, o que ajuda muito também são as famílias, o que a gente chama de famílias estendidas, os avós, os tios, poderem ajudar esses pais que estão com essa dificuldade de limite. Muitas vezes o que a gente vê é que acaba-se condenando esses pais: “ah, não sabe criar”, “não sabe educar”, “essa criança e insuportável”. E, aí, a coisa não anda, é preciso ter um comportamento de suporte, mas de ajuda mesmo.

Aventuras Maternas - Quais são as melhores práticas para abordar os pais da criança com TOD

Beatriz Fonseca - Os pais devem ser sempre orientados pelos profissionais envolvidos no tratamento da criança afetada. Muitas vezes a Terapia Familiar é necessária quando o ambiente doméstico está comprometido. O objetivo é melhorar a comunicação e interação entre os membros da família, ajudar na resolução de conflitos conjugais/parentais que comumente estão presentes. Uma família consonante é fundamental no manejo do comportamento da criança com TOD.

Aventuras Maternas - Como podem ser organizadas brincadeiras ou atividades sociais de forma inclusiva e segura?

Danielle H. Admoni - Do mesmo jeito que precisa ser feito em casa e na escola. Com regras e combinados claros. Então, por exemplo: se aquela criança perdeu e tem que sair da brincadeira, precisa ser bancado isso, independente se ela vai fazer um escândalo ou não. A gente não pode facilitar para essas crianças, porque justamente a questão é trabalhar com os limites. Então, não adianta a gente querer dar limites para todas as crianças, e relaxar com as que possuem TOD. Então, acaba sendo o mesmo comportamento de todas as crianças. Talvez com um pouquinho mais de compreensão. Mas a questão dos limites continua valendo.

Aventuras Maternas - Qual é a melhor maneira de explicar o TOD para uma criança

Beatriz Fonseca - Que a explicação seja dada por alguém que realmente conheça o assunto e consiga falar sobre ele de forma clara, respondendo as dúvidas apresentadas e sem julgamentos.

Aventuras Maternas - O que esperar para os comportamentos futuros?

Danielle H.Admoni - Uma criança com TOD pode evoluir para um transtorno de conduta e alguns transtornos de personalidade. Por isso, é muito importante que eles sejam tratados por um profissional de saúde mental, psiquiatras, psicólogos e outros que precisar. Porque se não essa questão com regras acaba persistindo. Desafiar regras, não aceitar limites, e isso é muito ruim na vida adulta, incluindo tendo problemas legais. Então se eu não respeito o meu professor, amanhã, por exemplo, eu não respeito o policial, eu não respeito meu chefe, não respeito minha esposa. Então, a questão de limites é fundamental na infância para que a gente consiga ter uma vida social, conviver em sociedade na vida adulta.

Aventuras Maternas - Há cura para o TOD? Se sim, quais tratamentos e terapias devem ser feitas?

Beatriz Fonseca - Cerca de ¼ de todas as crianças que recebem o diagnóstico de TOD não continua a satisfazer os critérios diagnósticos no decorrer dos anos seguintes. Pacientes nos quais o diagnóstico persiste podem permanecer estáveis ou evoluir para violações dos direitos de outros e, portanto, desenvolver Transtorno de Conduta. O tratamento primário do TOD é a intervenção familiar por meio do treinamento direto dos pais em habilidades de manejo e avaliação cuidadosa das interações familiares. Crianças com TOD também podem se beneficiar de Terapia Cognitivo Comportamental individual uma vez que podem “aprender” na relação terapêutica novas estratégias para desenvolver senso de domínio e sucesso em situações socias com outras crianças e sua família. Isso também melhoraria a autoestima que geralmente está bem prejudicada nas crianças com TOD. Não há medicação específica que ajude a melhorar o TOD. Porém esse transtorno frequentemente é acompanhado de outros transtornos, especialmente Transtorno de Déficit de Atenção e Transtorno de Ansiedade, que se beneficiam com o uso de medicações, melhorando assim o quadro de TOD.

 Conversar com os filhos sobre um colega que tem TOD (Transtorno Opositivo-Desafiador) pode ser delicado, mas importante. A seguir, a psicóloga Thamiris Camargo dá algumas dicas.
-Escolha o momento certo: Espere por um momento tranquilo e privado para iniciar a conversa;
-Seja honesto e direto: Use linguagem simples e direta para explicar o que é o TOD. Por exemplo, você pode dizer que é um problema que faz com que algumas pessoas tenham dificuldade em controlar suas emoções e comportamentos;
-Evite estereótipos: Lembre-se de que cada pessoa é única, e ter TOD não define toda a personalidade ou comportamento de alguém;
-Promova empatia: Incentive seus filhos a serem compreensivos e empáticos em relação ao colega. Explique que algumas ações do colega podem ser resultado do TOD e não intencionais;
-Encoraje a comunicação: Deixe claro que seus filhos podem sempre conversar com você se tiverem dúvidas ou se algo os incomodar em relação ao colega;
-Enfatize a inclusão: Incentive seus filhos a incluir o colega em atividades e a serem amigáveis, enquanto definem limites saudáveis para interações;
-Trabalhe com a escola: Se necessário, converse com os professores ou conselheiros da escola para entender melhor como lidar com a situação e apoiar tanto seu filho quanto o colega;
Essas conversas não apenas ajudam os filhos a entenderem melhor o comportamento de outras pessoas, mas também promovem a empatia e o respeito pela diversidade de habilidades e personalidades.
Além disso, é preciso estimular alguns comportamentos em relação ao colega com TOD. “Incentivar comportamentos de respeito, compreensão e apoio. Isso pode incluir ser paciente com dificuldades comportamentais, ser inclusivo nas atividades de grupo, e ajudar a criança com TOD a se sentir aceita e valorizada. A promoção de amizades positivas e saudáveis também é benéfica para o desenvolvimento social da criança com TOD”, conclui Thamiris.
Em tempo: “Se você é pai ou mãe de uma criança neurodivergente, que possui um diagnóstico dentro da neurodiversidade, seja comportamental, neurológico ou qualquer característica que gere prejuízos reais, meu conselho é focar sua energia em compreender verdadeiramente o que seu filho precisa. Entender como estabelecer uma relação afetiva e desafiadora ao mesmo tempo, e como você pode contribuir para o desenvolvimento saudável dele. Invista em investigação e não tenha medo; não há determinismo, apenas moralismos e relatos de pessoas desinformadas sobre algo que não vivenciam. Não se deixe influenciar por esse tipo de opinião. Ao invés disso, estabeleça uma relação de curiosidade em relação ao transtorno para acessar informações relevantes que farão diferença na vida de seus filhos. O termômetro para saber como está indo é o prejuízo social e emocional: se seu filho está sofrendo nesses aspectos, ele precisa de atenção. Ele não escolhe agir assim deliberadamente. Apropriar-se dessa informação pode fazer uma diferença gigantesca na vida da criança”, diz Andreia Rossi, mãe da Maria Fernanda.