Jovens que sofrem bullying têm maior propensão a buscar cirurgias para alterar a aparência. Pelo menos é o que afirma a pesquisa da Universidade de Warwick, no Reino Unido, conduzida pelo professor de psicologia Dieter Wolke, que analisou 2.800 meninos e meninas entre 11 e 16 anos.
Segundo o estudo, 31% dos adolescentes vítimas de bullying demonstram forte desejo de realizar cirurgia plástica. Para os pesquisadores, há ligação entre as agressões constantes e a vontade de modificar a aparência, em busca de aceitação e elevação da autoestima
No Brasil, dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica reforçam a crescente: 6,6% das plásticas no país são feitas por jovens de até 18 anos. Nos últimos 10 anos, o número de procedimentos subiu 141% entre adolescentes de 13 a 18 anos.
O impacto do bullying nas cirurgias plásticas
A psiquiatra Danielle H. Admoni, pesquisadora da UNIFESP e especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), aponta que a busca por cirurgia plástica entre jovens que sofrem bullying muitas vezes resulta de problemas psicológicos e da baixa autoestima.
“Quem sofre bullying acredita que mudar a aparência física vai melhorar sua autoestima e suas relações sociais. No entanto, esses procedimentos não vão tratar as feridas emocionais”, alerta Admoni, ao explicar que, embora as mudanças físicas possam trazer alívio, não solucionam os traumas associados ao bullying.
Segundo o cirurgião plástico Luís Maatz, especialista em Cirurgia Geral e Plástica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC/FMUSP), o interesse nos procedimentos entre jovens está diretamente ligado a características físicas específicas que são alvo de provocações.
Maatz também destaca que o interesse por cirurgia plástica aumenta à medida que os adolescentes se aproximam da vida adulta: “O interesse cresce conforme eles amadurecem”, completa o cirurgião, que também é membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e atua no Hospital Sírio-Libanês.
Quais os procedimentos mais procurados?
Entre os procedimentos mais buscados, a rinoplastia (cirurgia no nariz) se destaca. segundo dados da American Society of Plastic Surgeons (ASPS), a intervenção representa cerca de 45% das cirurgias plásticas realizadas entre adolescentes de 15 a 19 anos.
Segundo Maatz, a partir dos 16 anos, as estruturas ósseas e cartilaginosas do nariz e da face, por exemplo, já estão totalmente desenvolvidas. “Mesmo assim, o ideal é que a rinoplastia seja feita somente em casos justificáveis. Para meninas, o indicado é realizar a plástica entre 15 e 17 anos. Para os meninos, entre 17 e 19 anos”.
Outro procedimento comum é a otoplastia. Ceca de 5 a 10% que passam pela cirurgia corretiva para orelhas tem o bullying por terem orelhas proeminentes como motivação principal. “As orelhas param de crescer entre cinco e seis anos. Portanto, se o jovem estiver sofrendo bullying, o que pode atrapalhar seu desenvolvimento social e emocional, a cirurgia pode ser feita nessa faixa etária”, explica Maatz.
Embora o procedimento seja indicado apenas a partir dos 18 anos, a lipoaspiração também figura na lista. É menos comum que a otoplastia e rinoplastia, mas representa cerca de 4 a 5% das cirurgias plásticas realizadas em adolescentes, segundo a ASPS.
Por fim, há a mamoplastia, que é comum entre os jovens, mas também deve ser realizada após os 18 anos. A exceção ocorre em jovens que apresentam dores nas costas ou dificuldade respiratória devido ao volume dos seios, quando a redução de mama é uma intervenção necessária.
O que deve ser levado em conta?
Claudia Petry, especialista em Educação para a Sexualidade e Educação Sexual Infantil pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC/SC), explica que a construção da autoestima na adolescência é influenciada pelo que o jovem ouve dos colegas e vê nas redes sociais.
“Quando essa construção é abalada por agressões verbais e físicas, como ocorre no bullying, há uma tendência de querer adequar-se a um padrão estético irreal, levando jovens a tomarem decisões precipitadas sobre mudanças no próprio corpo, submetendo-se a riscos físicos e psicológicos desnecessários”.
A especialista também ressalta que a adolescência é um período marcado por grandes transformações hormonais e físicas, o que torna essa fase da vida delicada para decisões sobre intervenções estéticas.
Por isso, antes de se submeter a uma cirurgia plástica, é fundamental que o adolescente tenha apoio psicológico e acompanhamento médico: “Compreenda totalmente os impactos da cirurgia, como possíveis cicatrizes ou riscos de complicações, garantindo expectativas realistas ao optar por qualquer procedimento”, esclarece Claudia Petry.
Para Danielle Admoni, nem todos os jovens podem ser submetdos aos procedimentos estéticos, que não são recomendados paraalguns em específico. Como os diagnosticados com:
- Transtorno dismórfico corporal;
- Transtornos de humor;
- Transtorno de personalidade;
- Transtorno dissociativos;
- Entre outros.
“Ou mesmo para aqueles com expectativas não realistas, ideais que fogem do padrão estético normal. Daí a importância de pais e responsáveis estarem atentos e buscarem compreender o que tanto incomoda o adolescente a ponto de querer se submeter ao procedimento”, reforça Admoni.
Por isso, Maatz defende que as cirurgias plásticas na adolescência sejam discutidas entre o clínico geral, o cirurgião plástico e um especialista em saúde mental: “O objetivo é obter um julgamento cirúrgico adequado, devendo ser valorizados aspectos como a idade ideal para o procedimento, o estado de saúde, a inserção social, a vulnerabilidade emocional associada ao bullying, a autoestima e a autoimagem do jovem”, finaliza.
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