Parto cesárea, às 11h24, 47 cm, 3.300 kg e sete dedos no pé direito: foi assim que Ricardo veio ao mundo. Isso mesmo, sete dedos em só pé. O filho de Camila e Rodrigo, nascido em 8 de julho de 2014, nasceu com polidactilia, condição genética que gera o desenvolvimento de dedos extras.
Normalmente, o fenômeno leva ao nascimento do sexto dedo. Porém, o caso da família paulistana chama ainda mais atenção. Você pode não ter reparado, mas a data de nascimento é a mesma do 7×1, a famosa eliminação brasileira contra a Alemanha na Copa do Mundo.
Para a radialista, a história com a polidactilia começou muito antes. No sexto mês de gestação, Camila Patucci da Silva se dirigiu ao consultório para a ultrassonografia de 2º trimestre. No exame, o médico avaliou os membros superiores e inferiores (braços e pernas), além das mãos, pés e dedos.
Mãos? Ok! Pé direito? Tudo certo! Pé esquerdo? “Opa! Vejam isso”, disse a médica, assustada. “Deixa eu ver de novo pra ver se está certo e vou contar: um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete. Sete dedos só no pé direito?”, continuou a profissional, que repetiu a checagem dezenas de vezes.
Afinal, o que causa a polidactilia? É possível evitá-la? Esses dedos extras podem ser funcionais? É obrigatório retirá-los? Podem causar problemas durante a vida? São muitas dúvidas. Além do relato de Camila, AnaMaria conversou com o médico Rafael Yoshida, ortopedista pediátrico do Hospital Ortopédico AACD, para entender.
Causa e os tipos de polidactilia
Inicialmente, o especialista explica que a causa da polidactilia é genética, e sem a possibilidade de prevenção. Até por isso, Camila conta que a médica passou a avaliar o filho com mais atenção após o marido relatar que nasceu com “uma verruguinha” em cada mão.
Ainda segundo Rodrigo, os médicos teriam “cortado essas imperfeições” ainda no centro cirúrgico. No entanto, no caso de Ricardo, a médica tranquilizou a família e reforçou que o bebê era completamente saudável. Além disso, recomendou que falassem com especialistas no tema.
E assim eles fizeram, até que veio o diagnóstico da polidactilia, no terceiro dia de vida. No caso do Ricardo, os dois dedos extras se formaram com ossos, unhas e articulações, entre o dedão e o primeiro dedo comum. A estrutura do pé também apresentou alterações: o direito era mais largo que o esquerdo, já que, foi formado para comportar sete dedos e não cinco, como seria o normal.
Porém, há diferentes tipos. Segundo Yoshida, as polidactilias das mãos e pés podem ser divididas em três grupos:
- Pré-axial: duplicação do polegar ou do hálux (dedo maior do pé);
- Pós-axial: duplicação do dedo mínimo da mão ou do pé;
- Central: duplicações dos dedos centrais.
Ainda há a possibilidade dos dedos extras serem funcionais, no caso daqueles têm uma formação completa (ossos, tendões, vasos e nervos). Por outro lado, em alguns casos não há essa formação, com a ausência de um ou mais das partes citadas. Assim, não são funcionais.
Tratamento para a polidactilia
Em ambos os casos, é necessária uma consulta com um médico especialista para avaliar o paciente de maneira individual. O ortopedista explica que, desde a primeira consulta, as orientações também são direcionadas aos pais e familiares.
De maneira geral, a cirurgia para a retirada dos dedos extras são indicadas para a faixa de um ano, sem a necessidade de fisioterapia complementar. Do contrário, a permanência dos dedos extras pode atrapalhar a função manual: “Principalmente quando o dedo extra tem sua formação incompleta”.
No pé, o aumento de volume pode prejudicar a utilização de calçados e, nos casos mais graves, pode atrapalhar o andar. Além disso, o aspecto estético também deve ser levado em consideração na polidactilia. Na infância, crianças que têm o problema, são vítimas de bullying e podem desenvolver problemas psicológicos.
Yoshida finaliza: “Muitos casos de polidactilia, principalmente as pré-axiais, podem estar associadas a outros problemas como cardíacos, respiratórios ou neurológicos”. Nestes casos, o acompanhamento é multidisciplinar.
De volta ao caso de Ricardo
A questão genética veio à tona, e o pai se lamentava: “‘A culpa é minha, ele herdou isso de mim'”. Abaixava na altura da minha barriga e dizia: ‘Perdão, filho, perdoa o papai'”, relembrou a mãe. Por outro lado, a família encarou a notícia dos sete dedos como algo positivo: “Esse bebê já era especial desde o positivo, agora então, é único no mundo”.
Até por isso, a alegria foi enorme no dia de conhecer o novo integrante da família. A mamãe conta que todos queriam ver justamente o pé direito e os sete dedos — isso no dia do 7×1, lembra? “E, como as notícias se espalham rapidamente, vários curiosos tentavam ver o ‘bebê do pé de sete dedos nascido no dia do 7 a 1′”, lembra Camila.
Aos dois meses de vida do filho, ela recebeu a notícia de que o caso da polidactilia de Ricardo seria cirúrgico. Sem a intervenção, ele teria dificuldade em se locomover com dois pés tão diferentes. A boa notícia é que poderia ser realizada quando estivesse mais velho.
O ortopedista também recomendou que procurassem o especialista pediátrico da AACD para averiguar a polidactilia do pequeno. Quando ele completou cinco meses, ela foi até a associação, onde foi atendida por Rafael Yoshida — sim, o mesmo desta matéria. “Um amor de ser humano”, definiu a mãe.
Avaliações, consultas, ressonâncias e exames: quatro meses após a confirmação da necessidade da cirurgia, o procedimento aconteceu. No dia 8 de abril de 2015, Ricardo foi submetido à cirurgia. Não demorou para que ele aprendesse a engatinhar com o gesso: “Retirou a botinha e aprendeu a andar, como se nada tivesse acontecido, como se nunca tivessem dois dedinhos a mais no pé dele”.
Com 4 anos e meio, voltou ao centro cirúrgico. Dessa vez, para reparar o osso do peito do pé, que calcificou e gerou incômodo ao usar de tênis. E, mais uma vez, se adaptou bem. Hoje, com dez anos, corre, faz judô, joga futebol, usa tênis.
“Tudo como qualquer outra criança […] O Ricardo sabe de toda essa trajetória que ele percorreu e sente muito orgulho”, finaliza Camila, orgulhosa da trajetória da família.
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