Nas Olimpíadas de 2024, a boxeadora argelina Imane Khelif se viu no centro de uma polêmica após sua luta contra a italiana Angela Carini, que abandonou o ringue com apenas 46 segundos no ringue. A situação, tida como excesso de testosterona em mulheres, gerou rumores e falsas acusações de que ela seria uma mulher transsexual, algo que se espalhou rapidamente nas redes sociais. A polêmica foi agravada pelo histórico de Khelif, que foi reprovada em um teste de gênero realizado realizado pela Associação Internacional de Boxe (IBA) durante o Mundial de Boxe de 2023.
No entanto, o Comitê Olímpico Internacional (COI) assegurou a legalidade de sua participação, enfatizando que todas as atletas na competição atendem aos critérios de elegibilidade. A questão levantou discussões sobre os níveis elevados de testosterona em mulheres, uma condição que pode ocorrer naturalmente em pessoas intergênero, e a forma como isso influencia o desempenho esportivo.
Para abordar o excesso de testosterona em mulheres e entender o caso da boxeadora argelina Imane Khelif, AnaMaria conversou com o endocrinologista Ricardo Oliveira, Mestre e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e com o urologista Luiz Luna Barbosa, Doutor pela Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (UNIFESP-EPM). Confira a seguir.
Afinal, a boxeadora argelina é trans?
O caso da boxeadora argelina Imane Khelif nas Olimpíadas de Paris 2024 gerou intensa discussão após a lutadora ser acusada de ser uma mulher trans, especialmente após sua adversária, Angela Carini, abandonar o combate. No entanto, a informação é falsa. Khelif não é trans, mas possui um distúrbio de diferenciação sexual (DDS). Esses distúrbios são condições genéticas e hormonais que podem causar discrepâncias entre o sexo cromossômico e as características físicas da pessoa, bem como o excesso de testosterona em mulheres, como é o caso da atleta da Argélia.
Entendendo a diferença entre transexualidade e distúrbios de diferenciação sexual
A transexualidade refere-se a uma pessoa cuja identidade de gênero difere do sexo atribuído ao nascimento. No caso de mulheres trans, essas são pessoas designadas como homens ao nascimento que se identificam como mulheres. A definição de transexualidade baseia-se exclusivamente na identidade de gênero, não nas características físicas ou genéticas.
Por outro lado, os distúrbios de diferenciação sexual, como o caso de Imane Khelif, são condições que podem resultar em características físicas que não correspondem ao sexo cromossômico da pessoa. Isso pode incluir um excesso de testosterona em mulheres/pessoa com fenótipo feminino, como mencionado por Luiz Luna Barbosa. Essas condições são distintas da transexualidade, sendo resultado de variações biológicas naturais e não de uma identidade de gênero específica.
Portanto, é essencial distinguir entre essas duas condições para evitar mal-entendidos e discriminação. No caso de Khelif, a sua participação foi legalmente permitida pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), uma vez que suas características biológicas foram devidamente avaliadas e consideradas dentro das normas de elegibilidade.
Excesso de testosterona em mulheres: é normal? Entenda as causas
Segundo Ricardo Oliveira, é incomum mulheres apresentarem níveis elevados de testosterona, pois naturalmente, esses níveis são baixos em comparação aos homens. A detecção de excesso de testosterona em mulheres deve ser cuidadosamente investigada, especialmente em contextos esportivos, para descartar o uso de substâncias anabólicas como forma de doping. Além disso, existem condições médicas que podem causar hiperandrogenismo, ou seja, um excesso de hormônios masculinos em mulheres.
“A Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) é uma das condições mais comuns que pode levar ao aumento de testosterona em mulheres. Outras causas mais raras incluem tumores das glândulas adrenais ou ovários, hiperplasia adrenal congênita e hipertecose ovariana. Também é possível que distúrbios de diferenciação sexual, como a presença de cromossomo Y em indivíduos com características femininas, contribuam para a produção aumentada de testosterona”, aponta o endocrinologista.
O caso da boxeadora argelina Imane Khelif, que gerou controvérsia nas Olimpíadas de Paris 2024, é um exemplo dessa complexidade. Em 2023, a Associação Internacional de Boxe (IBA) desclassificou Imane após um “teste de gênero” revelar níveis elevados de testosterona. No entanto, o Comitê Olímpico Internacional (COI), que adota critérios diferentes para definir a elegibilidade dos atletas, permitiu sua participação nas Olimpíadas, onde Khelif chegou às semifinais, garantindo pelo menos uma medalha de bronze.
A divergência de critérios entre as organizações destaca a necessidade de um entendimento mais claro e uniforme sobre a questão do hiperandrogenismo (excesso de testosterona em mulheres) em competições esportivas femininas .
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