Uma em cada quatro gestações termina em aborto espontâneo - Freepik
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Aborto espontâneo: entenda por que acontece e o que podemos fazer para evitá-lo

Estatísticas revelam que 1 em cada 4 gestações termina em aborto espontâneo; especialista tira dúvidas e explica quando é necessário investigar

Marina Borges Publicado em 19/07/2024, às 16h00

A perda gestacional, também conhecida como aborto espontâneo, é uma realidade enfrentada por muitas mulheres. Estatísticas revelam que 1 em cada 4 gestações termina em aborto espontâneo, levantando questões sobre suas causas e a possibilidade de prevenção. Entender por que essas perdas ocorrem e quando é necessário investigar mais a fundo é fundamental para oferecer o apoio necessário às mulheres que passam por essa experiência.

Pensando nisso, AnaMaria conversou com a ginecologista Priscila Pyrrho, pós-graduada em Medicina Fetal pela Cetrus. Confira a seguir se o aborto espontâneo é evitável, por que ele acontece e quando é necessário investigar. Além das respostas da especialista, esta matéria também traz o relato pessoal da jornalista Lígia Menezes, que compartilha suas experiências com duas perdas gestacionais.

Por que o aborto espontâneo acontece?

Entenda por que o aborto espontâneo pode ocorrer - Foto: Freepik

 

O aborto espontâneo ocorre por diversas razões, sendo a mais comum a anomalia cromossômica, responsável por cerca de 50% dos casos, geralmente nos primeiros meses de gestação. "Problemas hormonais, como a insuficiência do corpo lúteo, podem levar à deficiência de progesterona, o hormônio essencial para a manutenção da gravidez inicial. Sem progesterona adequada, a gravidez não se fixa até que a placenta assuma essa função", explica Pyrrho.

"Problemas de saúde materna, como diabetes e alterações na tireoide, também podem aumentar o risco de aborto espontâneo. Doenças autoimunes podem fazer o corpo atacar o embrião como se fosse um invasor. Trombofilias, que causam microcoágulos, e condições autoimunes como a síndrome do anticorpo fosfolipídio, podem obstruir o fluxo sanguíneo para o embrião, levando à perda gestacional", continua a médica.

Além disso, ela explica que fatores anatômicos, como a incompetência do colo do útero ou anomalias uterinas, também podem impedir a implantação adequada do embrião. Miomas uterinos podem obstruir e dificultar a gravidez. Estilo de vida e fatores ambientais, como exposição a toxinas, radiação, álcool e tabaco, também contribuem para o risco de abortamento. "Vivemos em um mundo com muitos poluentes, e a exposição diária a substâncias estranhas à vida pode impactar negativamente a gestação", aponta.

O aborto espontâneo é evitável?

O aborto espontâneo, na maioria das vezes, não é evitável - Foto: Freepik

 

Infelizmente, na grande maioria dos casos, o aborto espontâneo não é evitável. Priscila explica que a maioria das perdas gestacionais ocorre devido a malformações congênitas e anomalias cromossômicas, que impedem o desenvolvimento adequado do embrião. Essas anomalias são geralmente aleatórias e não resultam de algo que a mãe tenha feito ou deixado de fazer.

"Mais de 50% dos abortos espontâneos estão associados a condições cromossômicas e ao mau desenvolvimento do embrião, fatores que não podem ser prevenidos ou controlados. No entanto, existem algumas medidas que podem ajudar a reduzir o risco de anomalias cromossômicas e, consequentemente, diminuir a chance de aborto. Entre essas medidas estão evitar o consumo de álcool, tabaco e drogas, manter uma alimentação equilibrada, controlar doenças crônicas como diabetes e evitar o estresse excessivo. Além disso, é importante ser cauteloso com o uso de certas medicações", aponta a médica.

Embora essas precauções possam diminuir os riscos, a especialista indica que a maioria dos casos de aborto espontâneo permanece inevitável devido à sua natureza aleatória e imprevisível. Em algumas situações específicas, dependendo da causa subjacente, é possível adotar intervenções para reduzir o risco de abortamento, mas isso é mais a exceção do que a regra.

Quando é necessário investigar um aborto espontâneo?

A investigação médica após um aborto espontâneo pode ser necessária - Foto: Freepik

 

De acordo com Priscila, a investigação de um aborto espontâneo é geralmente recomendada após duas ou mais perdas gestacionais consecutivas, conhecidas como aborto de repetição. No entanto, em alguns casos, é importante investigar após uma única perda, especialmente se ocorrer em um estágio avançado da gravidez ou se houver outros fatores conhecidos.

"Mulheres com histórico de infertilidade, idade materna avançada (acima de 35 anos), saúde materna comprometida por doenças pré-existentes como diabetes ou doenças autoimunes, ou história familiar de problemas genéticos, podem necessitar de investigação mesmo após uma única perda gestacional", explica a ginecologista.

A investigação inclui exames genéticos, hormonais, avaliação da anatomia do útero, exames infecciosos, doenças autoimunes, deficiências vitamínicas e avaliação de toxicidade por exposições ambientais. Esse processo ajuda a entender as causas da perda gestacional e a planejar o tratamento adequado para futuras gestações.

Relato pessoal sobre duas perdas gestacionais

A jornalista Lígia Menezes compartilha sua experiência pessoal com duas perdas gestacionais, oferecendo um relato íntimo e corajoso sobre os desafios emocionais e físicos enfrentados por ela. Ao dividir suas vivências, ela busca quebrar o silêncio que ainda cerca o tema do aborto espontâneo e oferecer apoio a outras mulheres que passam por essa difícil experiência. Confira o seu relato na íntegra a seguir:

"Tive dois abortos espontâneos. O primeiro ocorreu antes de eu ter meu filho. Engravidei e, com 7 semanas, perdi. O segundo foi após o nascimento dele, quando ele tinha 1 ano e 11 meses. Perdi com 8 semanas.

Apesar de ser tão comum isso acontecer (25% das gestações acabam em aborto espontâneo), pouco se fala sobre o assunto. Isso tudo faz com que a gente se sinta perdida, cheia de dúvidas e muito mal. Após eu relatar sobre meu aborto para algumas pessoas, elas me respondiam que também tinham tido um... aconteceu com umas 4 ou 5 amigas, que só contaram após eu contar. É algo muito difícil de se passar, ainda mais diante de tanto "tabu".

No meu primeiro aborto, fiquei bem chateada. Eu tinha criado muitas expectativas com a nova (e primeira) gravidez. Contei para amigos mais próximos, familiares... E, de uma hora para outra, vi tudo desabar. Simplesmente comecei a ter cólicas e um pequeno sangramento. Após dois dias, o sangramento aumentou muito, como uma menstruação mesmo. Repeti o Beta HCG e a taxa hormonal tinha caído absurdamente: era a confirmação de que a gravidez não tinha vingado e o corpo iria expelir. Não cheguei a fazer nenhum ultrassom antes disso.

Demorou 7 dias para o corpo expelir. Fiquei na espera, pois não quis fazer curetagem (a curetagem faria com que eu tivesse que esperar uns 3 meses para engravidar novamente. E, se o corpo expelisse de maneira natural, no próximo ciclo eu já poderia engravidar). Durante esses sete dias, vivi meu luto, fiquei muito triste, chorei muito, me perguntei "por que comigo". Eu era professora de yoga, vegetariana, vivia de forma saudável, corria... Não entendi como meu corpo não tinha conseguido manter a gestação. Depois, fui aceitando, pensando que eu simplesmente tinha caído na estatística...

No dia que o corpo expeliu, senti fortes dores. Minha médica disse que eram contrações. Foi muito, muito forte, como um parto (só que mais leves). Passei a madrugada inteira com essas contrações. Depois fiz um ultrassom e confirmamos que meu corpo já havia expelido tudo (algumas vezes, é preciso fazer curetagem depois, pois ficam partes ainda do feto, saco gestacional, placenta. Graças a Deus, não precisei). Nos dias que se seguiram, eu já estava melhor, mas ainda sentia um vazio dentro de mim.

E, no mês seguinte, eu estava grávida novamente. Passei a gestação toda muito feliz, mas com muito medo de perder. Apenas após o quarto mês, me senti um pouco mais segura. Mas, sempre que ia ao banheiro, olhava com frio na barriga com medo de ver sangue... duro isso, né? Foi realmente um trauma!

Meu filho nasceu de parto natural, tive uma gestação muito saudável, sem nenhuma intercorrência. Ou seja, meu corpo conseguia gerar uma criança, sim. Eu não precisava mais duvidar de mim nem me culpar.

Quando ele ia fazer 2 anos, engravidei novamente. Dessa vez, não tinha sido tão planejado, mas fiquei em êxtase com a ideia de ser mãe pela segunda vez. Não fiz Beta HCG, queria esperar mais, não criar muitas esperanças, pois tinha medo de perder. Também não contei a ninguém sobre a gestação, apenas para meu marido, claro. E aconteceu o que eu temia... de novo comigo...

O processo de aborto foi o mesmo: começou com um sangramento mais leve, depois intensificou, depois o corpo expeliu com contrações fortíssimas. Dessa vez, foi bem mais rápido, não fiquei a noite toda com dor, foram algumas horas apenas (já era meu terceiro "parto", né?). Fiquei arrasada, bem pior do que da primeira vez. Acho que porque eu já sabia como era ser mãe, já conhecia essa aventura e esse amor arrebatador, e assim, a perda me "bateu" bem mais. Passei quase 2 meses bem mal, em luto, chorando.

Por sugestão da minha terapeuta, escrevi uma carta para meu filho que se foi com apenas 8 semanas de existência. (Essa carta está publicada em meu livro, "Mãe de Primeira Viagem"). E isso me fez melhorar, olhar para trás com carinho, falar do assunto sem ressentimentos.

Contei para algumas pessoas sobre a experiência e até já fui procurada por algumas que passaram por isso após eu ter passado, pedindo conselhos, palavras amigas. É muito bom se abrir, contar os relatos, para ajudar as pessoas. Eu não tive esse apoio e hoje, faço questão de dar esse apoio a pessoas queridas. Quando ninguém fala sobre o assunto, fica muito mais difícil passar por isso. Não deveria ser um tabu, não deveríamos passar por isso em silêncio, caladas, ou ter vergonha."

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