A separação de um casal é sempre delicada, mas quando envolve conflitos frequentes, brigas e disputas, o impacto se estendepara além dos adultos. Crianças, mesmo sem compreender toda a complexidade da situação, percebem a tensão e a hostilidade, internalizando emoções de medo, insegurança e confusão.
Segundo Mara Braile, psicóloga e pedagoga, um divórcio de alto conflito cria um ambiente crônico de estresse. “As crianças expostas a hostilidade contínua, agressão verbal ou física e desconfiança entre os pais estão em risco significativamente maior de desenvolver problemas de saúde mental”, detalha.
Entre os efeitos mais comuns estão ansiedade persistente, medo de ficar sozinho, baixa autoestima e sentimentos de culpa, como acreditar que são responsáveis pelas brigas dos pais.
Laços em conflito
Um dos efeitos mais prejudiciais do divórcio ruim é o chamado conflito de lealdade. “Quando um pai fala mal do outro, a criança se vê forçada a ‘escolher um lado’. Rejeitar um dos genitores é, na prática, rejeitar uma parte de si mesma, o que gera grande angústia emocional”, alerta Mara.
Essa dinâmica pode afetar relacionamentos futuros. Crianças que testemunham desrespeito e comunicação agressiva tendem a reproduzir padrões de relacionamento disfuncionais ou desenvolver dificuldades em confiar e se vincular emocionalmente na vida adulta.
Por outro lado, quando os pais conseguem manter respeito e cooperação, mesmo separados, a criança aprende que é possível resolver conflitos de forma saudável, fortalecendo sua resiliência.
Efeitos no comportamento e desempenho escolar
O estresse contínuo também interfere diretamente no aprendizado. Silvia Kelly Bosi, neuropsicopedagoga, explica que o cérebro infantil não distingue estresse emocional de ameaça física. “Conflitos constantes ativam a resposta de ‘luta ou fuga’. A energia mental que deveria ser usada para aprender é desviada para monitorar o humor dos pais ou se preocupar com a próxima briga”, afirma a especialista.
As reações variam de acordo com a idade. Crianças pequenas podem apresentar regressões, como voltar a fazer xixi na cama, chupar o dedo ou ter crises de choro.
Adolescentes tendem a internalizar o estresse, manifestando tristeza, raiva, queda no rendimento escolar e comportamentos de oposição.
Entre os sinais de alerta estão isolamento social, alterações drásticas de humor, sintomas físicos frequentes, como dores de estômago ou de cabeça sem causa médica, e expressões de desesperança, como “eu queria que tudo isso acabasse”.

Como minimizar os impactos?
Embora o cenário seja desafiador, é possível reduzir os efeitos negativos do divórcio conturbado. Mara destaca estratégias essenciais para proteger o bem-estar das crianças:
- Blindar a criança do conflito: evitar brigas na frente dela, não discutir detalhes financeiros e nunca usá-la como mensageira entre os pais.
- Jamais falar mal do outro genitor: críticas afetam a autoestima da criança e reforçam o conflito interno.
- Manter rotina e consistência: horários regulares de sono, alimentação e atividades extracurriculares criam sensação de segurança.
- Validar os sentimentos da criança: incentivar a expressão emocional, ouvir sem julgar e reforçar que “não é sua culpa”.
- Buscar apoio profissional: terapia individual ou mediação familiar ajuda a criança a processar emoções complexas e fortalece a coparentalidade. ntervenções psicopedagógicas e psicológicas são fundamentais: atividades que envolvem identificação e nomeação de sentimentos, jogos cooperativos e narrativas simbólicas ajudam a criança a elaborar os conflitos. O trabalho com os pais, orientando comunicação respeitosa e corresponsabilidade, protege e promove resiliência emocional.
A importância da escuta
O objetivo não é salvar o casamento, mas criar um ambiente seguro, estável e afetuoso, mesmo após a separação. Crianças precisam sentir-se amadas e protegidas, com o direito de ser apenas crianças, mesmo diante de mudanças na família.
Presença, atenção e escuta ativa valem mais do que estar fisicamente junto. Mais do que tempo, o que importa é oferecer segurança emocional, previsibilidade e amor. O divórcio não precisa deixar marcas profundas: crianças podem crescer confiantes, resilientes e capazes de construir relações saudáveis no futuro, aprendendo a lidar com conflitos de forma segura e equilibrada.
A matéria acima foi produzida para a revista AnaMaria Digital (31 de outubro). Se interessou? Baixe agora mesmo seu exemplar da Revista AnaMaria nas bancas digitais: Bancah, Bebanca, Bookplay, Claro Banca, Clube de Revistas, GoRead, Hube, Oi Revistas, Revistarias, Ubook, UOL Leia+, além da Loja Kindle, da Amazon. Estamos também em bancas internacionais, como Magzter e PressReader.
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