“Meu Deus, o que fiz da minha vida?” A pergunta, feita em tom de desabafo, foi o que levou a oftalmologista Renata Corrêa, de Uberlândia (MG), a perceber que alguma coisa estava errada.
“Eu já estava trabalhando em um ritmo bastante acelerado há três anos. Tinha dificuldades em dizer não e acabava aceitando todas as imposições da empresa, tais como: começar a atender mais cedo e estender o horário até mais tarde, além de atender no horário de almoço e aos sábados”, conta.
Acostumada com uma rotina exaustiva, Renata foi diagnosticada com Síndrome de Burnout após passar por episódios de estresse intensos no ambiente de trabalho. Também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional, ela é resultado de um estresse excessivo em situações de trabalho que demandam uma grande carga emocional.
ESGOTAMENTO EXTREMO
As características da Síndrome de Burnout podem surgir em forma de cansaço excessivo, dores frequentes na cabeça e falta de vontade para sair de casa e ir trabalhar. Ao sinal de algum destes sintomas, é importante procurar ajuda médica.
O problema ganhou destaque no Brasil quando a jornalista Izabella Camargo foi demitida da TV Globo após uma crise de Burnout no ano passado. Na ocasião, ela precisou tirar uma licença médica por conta da síndrome. Ao retornar, foi dispensada de seu cargo pela emissora.
Nesta terça-feira (28), Izabella comemorou nas redes sociais a decisão da Organização Mundial da Saúde (OMS) de classificar a síndrome como doença. O Burnout estará na próxima versão da Classificação Internacional de Doenças (CID), que começa a valer em 2022.
LEGITIMA O PROBLEMA
O Burnout foi incluído na sessão de problemas associados ao emprego e ao desemprego. A síndrome foi descrita pela OMS como “resultante de um estresse crônico no trabalho que não foi administrado com êxito”.
O psicólogo Vitor Friary, diretor do Centro de Mindfulness do Rio de Janeiro, acredita que essa inclusão ajudará a legitimar um problema que acontece com frequência, fazendo com que os especialistas apliquem tecnologias que já existem para a redução do estresse, como é o caso da terapia cognitiva comportamental.
No Brasil, uma pesquisa da Isma-BR (representante da International Stress Management Association) estima que 32% dos brasileiros sofrem com a síndrome.
TRABALHO É DIFERENTE DE ESTRESSE
Segundo o psicólogo, a síndrome pode surgir de forma silenciosa, com os sintomas iniciais passando despercebidos pelo doente. “No mundo atual, existe uma normalização de que trabalhar é sinônimo de estresse. Na verdade, trabalhar precisa ser sinônimo de bem-estar”, explica.
A mudança na rotina também é algo essencial para evitar novos episódios.
O Ministério da Saúde, por exemplo, indica algumas estratégias para diminuir o estresse e a pressão durante o trabalho, como evitar o contato com pessoas “negativas”, especialmente aquelas que reclamam demais.
O psicólogo clínico Moisés Luz indica a pausa na rotina de trabalho como algo importante para evitar problemas com a síndrome. “O descanso é importante até mesmo para contemplar o trabalho que está sendo feito”.
Ter uma vida afetiva e social mais ativa também são fatores importantes para não entrar em um ciclo de estresse intenso. De acordo com Friary, manter uma rotina focada apenas no trabalho não é saudável.
ANO SABÁTICO
Por recomendação de uma terapeuta, a oftamologista Renata retomou um velho hábito: escrever. Hoje, ela fez do hobby sua segunda profissão e conta com seis romances publicados, inclusive um deles é inspirado na Síndrome de Burnout, chamado Um Ano Sabático.
“A escrita me ajuda até hoje a manter meu equilíbrio, pois me dá muito prazer e relaxa minha mente, afastando-a dos problemas do dia a dia”, finalizou.
Para Vitor, o formato que algumas empresas funcionam hoje em dia também colabora para um ambiente de trabalho estressante. “Vivemos uma obsessão por metas e resultados. As pessoas saem do trabalho, mas continuam trabalhando nas redes sociais. Este é um fator determinante para desenvolver o Burnout”, disse.
Segundo ele, é necessário estabelecer uma jornada de trabalho com começo e fim, evitando trabalhar após o fim do expediente. “A gente precisa desligar as telas”, sentencia o psicólogo.