Conheça a história da leitora que sofreu na mão de fã obcecado
Nem só celebridades são vítimas de histórias como a tragédia que aconteceu com a apresentadora recentemente. Veja o depoimento
de uma leitora* de AnaMaria, que já foi vítima de um maníaco!
“Há 13 anos, a palavra erotomania não fazia parte do meu vocabulário. Naquela época, eu tinha 20 anos e já existia rede social, o Orkut. Anônimos já podiam ostentar seu séquito de seguidores. E eu também tinha um blog. Um rapaz visitou meu perfil, passou a comentar os textos e começou a me perseguir. Enviava mensagens privadas e públicas se comportando como se me conhecesse, ou melhor, como se fosse meu namorado. Dizia que eu era “a escolhida”. Ele achava que eu era uma mulher espiritualmente superior, vinda de um mundo místico, etéreo e por isso tão especial. Enfim, era uma espécie de Ana Hickmann na ilusão dele! Ele passou a monitorar minhas redes em busca de homens (amigos e paqueras, pois eu era solteira) que me escreviam, para responder-lhes
agressivamente, com xingamentos e exigindo que se afastassem. No blog, preenchia os dez comentários que a conta oferecia ao usuário para que nenhum outro homem pudesse comentar. Acreditava que fotos minhas eram feitas para ele (como aconteceu com o homem que perseguia Ana Hickmann).
Descrevia minha rotina
Pessoas assim começam a construir na cabeça sinais que consideram ser a comunicação secreta com o alvo. As semanas se passaram. Recebi um e-mail: era meu perseguidor descrevendo detalhes da minha rotina na rua e, pior, pela universidade! No Orkut, ele usava fotos borradas no perfil e não revelava informações de identidade como a garotada em geral. Tinha poucos amigos e comunicação quase nula com um ou dois deles sobre música. Ele começou a roubar fotos minhas na rede e fazer montagens
amorosas – como essas vistas agora no caso de Ana – com corações, declarações, com o rosto dele borrado junto ao meu emoldurado por corações… Eu não sabia o seu nome (o usado nas redes sociais era incomum, portanto não sabia se era real), nem como era seu rosto. E não imaginava que os surtos poderiam terminar em perigo.
Ele foi até o meu trabalho
Uma vez, o rapaz ficou de tocaia na porta do meu trabalho para me entregar um bilhete na saída. Obcecado. Palavras desconexas.
Depois de algum tempo, por circunstâncias da vida, mudei de cidade. Ele encontrou meu telefone residencial! Gelei da espinha ao dedão do pé quando fui entendendo quem estava por trás da esquisita ligação. Foi aí, depois desses meses de terror, que, ao telefone, exigi que se afastasse e ameacei. Sei lá por que cargas d’água, aquilo deu certo. Não sei como saí viva dessa obsessão e,
pensando bem, não sei se essa história chegou mesmo ao fim. Não dá para ter essa certeza. Mas quero acreditar que essa ilusão dele se dissipou nesse período (mais de uma década) em que ele sumiu.
Não tinha maturidade
É triste ser uma menina imatura. Aos 20 anos, não tinha ferramentas psicológicas para buscar auxílio externo. Deveria ter denunciado. Pedido ajuda. Lidei sozinha com uma situação muito perigosa. Por isso, sugiro: se alguém estiver passando por isso, busque ajuda. E eu aconselho não só a polícia, mas também a família do paranoico, que pode ser muito útil nesses casos. Eles podem nem saber… Tentei ter raiva do rapaz. Não consegui. Sobrou dó. Isso, claro, depois de ter passado muitíssimo medo, insegurança, fragilidade e até mesmo culpa. Será que eu era culpada? Na gravação, Ana Hickmann grita: ‘Moço, o que eu posso fazer para consertar isso?’ E ela nem sabe o que é “isso”. Descobri o que era o distúrbio no Google, pois as pessoas se limitam
a diagnosticá-lo como ‘louco’. São pessoas literalmente doentes de amor. Que sofrimento são essas fixações delirantes em que não se consegue mais separar ilusão de realidade!”
*Ela não quis se identificar por medo de que o agressor volte a reconhecê-la.
O que houve com a apresentadora?
No sábado, 21 de maio, a apresentadora Ana Hickmann foi surpreendida no quarto do hotel em que estava, em Belo Horizonte
(MG), pelo fã Rodrigo Augusto de Pádua, armado. O rapaz, de Juiz de Fora, mantinha perfis nas redes sociais dizendo que a amava, com diversas fotos e montagens da apresentadora. No hotel, ele atirou contra uma assessora de Ana, Giovana Oliveira, que estava no quarto. Segundo relatos dos envolvidos, o marido de Giovana, Gustavo Correa, irmão do marido de Ana, Alexandre Correa, entrou em luta com o fã após o tiro, e acabou atirando nele em legítima defesa. Giovana se recupera bem do tiro, que perfurou seu intestino grosso, mas permanece no hospital. Ana não teve lesão no ocorrido, mas ficou muito abalada. Que barra!
Que distúrbio é esse?
A erotomania é um delírio de ser amado, que pode ter base em diversas doenças mentais. “Mas o que fica evidente é seu
distanciamento da realidade, por isso dizemos que é um quadro psicótico. Existe uma confusão entre mundo interno e mundo externo, entre fantasia e realidade. É impossível responder por que o objeto foi a Ana Hickmann, mas ela se encaixa no padrão de escolhas do erotomaníaco, por se tratar de uma pessoa famosa, linda e inacessível”, afirma Ana Luisa Testa, psicóloga clínica.
Essa doença é dividida em três fases: a primeira é o período otimista, apaixonado, convicto do amor do outro e cheio de orgulho
e esperança. Os dois últimos são marcados por sentimentos de raiva pela não correspondência daquilo que era esperado (frustração e orgulho ferido) e por desejos de vingança. Um perigo…
O que fazer se estou sendo perseguida?
. Comunique aos mais próximos sobre o que está acontecendo imediatamente.
. Cuide para não ser perseguida, vigiada, não ficar sozinha ou vulnerável.
. Informe a polícia.
. Se resguarde também nas redes sociais.
. Procure não expor informações tais como telefones, endereço, locais que frequenta.
. Evite situações em que ficará vulnerável, desprotegida.
. Ferir o orgulho do erotomaníaco pode não ser uma boa ideia, pois acabará por despertar sua agressividade e desejo de vingança.
. Não sinta culpa: a pessoa não é responsável por tornar-se objeto do erotomaníaco, pois não é o que ela faz, e sim o que ele interpreta de seus atos. “Existe a certeza por parte dele de que este amor é correspondido, de que mensagens ou gestos são enviados pela vítima”, diz Ana Luisa.
“É improvável que alguém procure o tratamento para a erotomania, pois a pessoa não entende que está fora da realidade. Mas a família pode identificar e buscar ajuda. Podemos também identificar essa situação em pacientes que buscam o tratamento por
outras questões e abordá-la”
Ana Luisa Testa, psicóloga clínica