Valentina Bulc, conhecida por interpretar a ginasta Bia de ‘Salve-se Quem Puder’, costuma debater assuntos relevantes em suas redes sociais, e uma das pautas foi o assédio. Em um bate-papo com AnaMaria Digital, a jovem recordou-se de quando foi assediada verbalmente várias vezes, no mesmo dia, enquanto passeava com o cachorro na rua.
“Numa distância de 500 m, fui verbalmente assediada três vezes. Isso é assustador e dá uma sensação de impotência. Recebi várias mensagens de mulheres falando que sempre passam pela mesma coisa. Não é um comportamento isolado e é por isso que eu acho tão importante usar as redes para levar certos questionamentos às pessoas”, lamenta.
Certa vez, a artista declarou que “não se é mulher sem sofrer assédio”. Esse reflexo, conforme aponta Valentina, não tem a ver com a questão de identidade de gênero, e sim no lugar de que, uma vez mulher, é bem possível que você seja assediada.
“Viver numa sociedade machista e patriarcal, em que o homem, por uma questão estrutural, é empoderado e se sente no direito de julgar física e moralmente toda e qualquer mulher, o faz sentir-se no direito de nos assediar, seja verbal, física ou psicologicamente. Então, sim, eu já sofri assédio. E, infelizmente, é algo que permeia muitas, senão todas as mulheres, em algum ponto de sua vida”, explica ela.
Questionada sobre a senso “inquietante” da nova geração, Bulc conta que busca estudar cada vez mais os diversos movimentos, como por exemplo o feminismo, para ter propriedade de fala e saber lidar com situações.
“Acho importante a nossa geração questionar a forma como a sociedade funciona para, a partir daí, ter atitudes diferentes. Eu conheci o feminismo, por exemplo, aos 14/15 anos, e sigo estudando até hoje porque sempre tenho novas coisas para aprender, novas perspectivas e opiniões para desconstruir. O vegetarianismo é algo que conheço há alguns anos e foi só no fim de 2020 que me senti pronta para falar sobre isso. Eu realmente vejo as redes como um lugar em que podemos nos questionar e evoluir”, declara.
Confira a entrevista completa:
Você tem uma fala cheia de maturidade e segurança. A carreira precoce foi a responsável por isso?
Acredito que foram vários os fatores. Meus pais se separaram quando eu tinha 6 anos e eu me mudei de Brasília para São Paulo. Isso já me fez amadurecer. Eu entendi cedo que as coisas não acontecem só porque queremos que elas aconteçam. Quando comecei minha carreira, aos 16 anos, isso me trouxe responsabilidade e noção financeira. Tudo o que passei me fez ser quem eu sou.
Você acredita que beleza pode se confundir com talento?
Acho esse assunto delicado. Vou opinar com bases históricas [risos]. No século XX, quando Hollywood estava começando a operar com base no star system − sistema que escolhia figuras icônicas vangloriadas, surgindo, assim, a ideia de celebridade −, instaurou-se a necessidade de protagonistas que tivessem uma aparência “satisfatória”, o que por isso só já é uma frase muito subjetiva. O que aconteceu, creio, foi que nós passamos a: ou relacionar a beleza com o talento nato ou a questionar o talento de alguém por causa da sua beleza. Os dois casos me parecem muito simplórios, e uma coisa não tem nada a ver com a outra. Como disse, beleza é algo relativo − e o que nós, como sociedade, consideramos bonito é o que se encaixa no padrão. Talento é algo que você estimula, treina e desenvolve. Precisamos entender essas diferenças.
Você revelou que parou de usar filtro no Instagram porque estava fazendo mal a você…
Parei de usar aqueles filtros que modificam o rosto, seja afinando nariz, tirando olheira e espinha… Eu cheguei a um ponto em que eu usava tanto esses filtros que, quando me olhava no espelho, não me reconhecia. E eu estava começando a querer ser como os filtros me deixavam. Ao perceber que isso estava mexendo com minha autoestima, decidi parar de usar. Foi difícil, mas, depois, voltei a amar meu rosto do jeito que ele é. Incrível como isso mudou a forma que eu me olho agora…
Como é sua rotina de cuidados com o corpo e a alimentação?
Tem um pouco mais de um ano que venho dando muita importância para a alimentação e o corpo − e não em uma leitura estética, mas de saúde. Eu virei vegetariana em janeiro de 2020 e, desde então, comecei a entender e me preocupar com o que eu comia. Paralelamente, eu peguei gosto por mexer o corpo desde que comecei a viver a Bia, em Salve-se Quem Puder. Hoje em dia, me sinto ativa, saudável e com a mente tranquila.
Como tem lidado com a ansiedade na pandemia?
Eu tenho fases. Há momentos em que fico extremamente produtiva para não ter que lidar com a realidade que estamos vivendo, mas tem outros que transbordo tanta angústia e medo, que nem sei o que fazer. O que a gente está vivendo é muito sério, e tenho medo de a gente ter normalizado isso tudo. De forma geral, o que me ajuda muito são os exercícios físicos, a ioga, estudar interpretação e conversar com as pessoas que eu amo.
Você é a embaixadora da Sociedade Vegetariana Brasileira. Como se sente?
Muito feliz! Acho muito necessário falar sobre a importância de parar de comer carne. Minha melhor amiga é vegana e há anos ela vem tentando abrir minha mente para isso, e foi só em janeiro de 2020, depois das queimadas na Austrália, Ao lado de colegas de elenco e da família, a atriz mostra todo seu talento, desenvoltura e maturidade. Aos 21 anos, ela é a embaixadora da Sociedade Vegetariana Brasileira. que percebi que o prazer que eu tinha em comer carne não era mais importante do que a vida de outro ser vivo. Está cada vez mais claro para mim que esse hábito não é sustentável, e que não preciso dela para ser saudável.
Como você vê o movimento vegetariano no Brasil?
Sinto que ele vem crescendo e fico feliz também. Os restaurantes estão entendendo que é uma demanda significativa, lojas veganas vêm ganhando espaço e, mesmo que muitas pessoas não tenham virado vegetarianas, elas estão mais conscientes e diminuindo o consumo de carne − o que já faz diferença.
Você enxerga o vegetarianismo como uma opção alimentar ética e socialmente justa?
O vegetarianismo e o veganismo ganharam uma fama elitista que acaba enfraquecendo o movimento, quando, na verdade, não é. O que encarece o movimento são os alimentos industrializados, como o queijo e o leite veganos. Mas a base da nossa alimentação é a comida in natura (arroz, feijão, folhas, frutas, abóbora, lentilha…), e o que não acaba sendo caro. E, sim, acredito que o vegetarianismo (mais o veganismo, mas eu ainda não cheguei lá) seja uma forma mais ética de ver o mundo. É sobre reconhecer que não é só a espécie humana que é senciente, ou seja, capaz de sentir emoções e sensações. Eu sei que comer carne é uma questão cultural, mas o machismo também é, e nem por isso ele está certo.
Aonde Valentina quer chegar?
Quero ser cada vez mais fiel a quem eu sou, àquilo em que acredito. Um dos meus desejos para 2021 é mergulhar mais pra dentro de mim, me conhecer e me respeitar mais.