Algumas famílias atendidas perderam até quatro parentes para o vírus; principais quadros são de ansiedade e depressão, além problemas de relacionamento
As vidas perdidas para o Covid-19 somam – até o momento da conclusão dessa matéria – mais de 160 mil vítimas apenas aqui no Brasil. Apesar de números serem contáveis, as pessoas que deixaram suas famílias e amigos tristes após sua morte são inumeráveis. Foram médicos, enfermeiros e outros profissionais da saúde que não pensaram duas vezes em lutar pela vida do outro; pais e mães que não vão ver os seus filhos crescerem; jovens que ainda tinham muito para experienciar; idosos admirados por toda a família.
O coronavírus fez do velório, que antes era um momento de despedida, uma lacuna na vivência do luto. Apesar de ninguém gostar de passar pela experiência, viver o luto é necessário quando se perde alguém. Negar a morte ou não vivencia-la pode gerar uma dor ainda maior e dificuldade de aceitação da realidade, algo que pode afetar o emocional com o tempo. Lembrar dos momentos com a pessoa querida, chorar quando dá vontade e, principalmente, quando é chegada a hora da despedida final.
COMO LIDAR COM O LUTO EM MOMENTOS DE PANDEMIA?
Quatro meses se passaram desde a divulgação deste projeto incrível! Em junho passado, fiz uma matéria explicando como conseguir atendimento psicológico gratuito durante a pandemia, na qual falei sobre um grupo de psicólogos que oferecem acolhimento para pessoas que perderam amigos e/ou familiares para a Covid-19.
O grupo, naquela época, contava com sete profissionais voluntários, que atendiam apenas seis pacientes. O propósito sempre foi ajudar o máximo de gente possível, mas o projeto precisava de divulgação. Desde a publicação da matéria até hoje, 64 pessoas receberam ajuda para lidar com a morte.
Segundo a organizadora, a neuropsicóloga Márcia Stella Palmeira, atualmente o grupo conta com 18 voluntários e mais de vinte pacientes, mas a intenção é não parar por aí. A cada três semanas a equipe faz reuniões remotas para a definição de prioridades, alinhamentos, sugestões, com o objetivo de atender a todos com “muita dedicação e afeto, mantendo um olhar cuidadoso e solidário”, comenta Márcia.
ANSIEDADE E DEPRESSÃO
O luto é difícil para qualquer pessoa, mas quando ele ocorre de repente e de forma avassaladora, a aceitação se torna ainda mais complicada. Para piorar a situação, muitas famílias, segundo a Márcia me contou, perderam em média entre dois a quatro parentes para a Covid-19.
Esse estresse constante, além do medo de contrair a doença ou perder outra pessoa querida, acaba gerando alguns transtornos mentais, como a ansiedade e a depressão, que são as maiores ocorrências nos atendimentos. Os psicólogos se depararam com relatos de automutilação, ideação suicida e outros casos bem graves, em que o paciente precisou da ajuda de medicamentos, receitados por psiquiatras.
A maioria dos atendidos têm apresentado sintomas como angústia excessiva, insônia, perda de apetite, agitação, desânimo, dor de cabeça frequente, em que as principais causas são a falta de habilidade com tecnologia (no caso de pessoas de mais idade), angústia por ter pedido o emprego, tristeza por estar isolado, medo de lidar com possíveis sequelas do Covid.
GRATIDÃO
Apesar da dor que sentem, muito pacientes só têm a agradecer o trabalho desses voluntários. Compartilho esse recadinho que a Márcia recebeu: "Quero parabenizar vocês pelo maravilhoso projeto. Muito obrigada mesmo. A psicóloga que vocês me indicaram está fazendo um belíssimo trabalho comigo. Estou conseguindo me encontrar, sinto muita gratidão por vocês. A psicóloga é muito competente, responsável, amável, carismática... realmente um ser humano incrível. Estendo a todos vocês, seres humanos incríveis. A todos que participam do projeto a minha eterna gratidão."
Os profissionais voluntários também estão muito gratos em poder ajudar essas pessoas. Veja esse agradecimento: "Sinto privilégio, é recompensador poder ajudar pessoas necessitadas e fragilizadas emocionalmente e percebendo como retorno a gratidão deles por esse trabalho voluntário.
Esse grupo de apoio demonstra o cuidado para com aqueles que precisam da psicoterapia de qualidade; beneficia a reestruturação do contexto biopsicossocial, o que seria inviável vencer por si próprio. Deixo o meu muito obrigada por participar desse grupo!"
COMO RECEBER ATENDIMENTO OU SER VOLUNTÁRIO?
A Márcia e o grupo de voluntários vão adorar ajudar você nesse momento difícil. Para isso, basta ligar ou mandar uma mensagem no Whatsapp (11) 99215-2644. Também é possível procurar o perfil @ressignificando_o_psicologico no Instagram.
Para você que quer se candidatar ao voluntariado, entre em contato nos canais acima e marque o processo seletivo. Lembre-se, porém que é necessário ter registro ativo no Conselho Regional de Psicologia.
*JOICE VIANA é jornalista e fundadora do FLUIRDAMENTE, site que aborda temas como a depressão, ansiedade e outras doenças mentais de forma leve, contando a sua própria experiência com a doença. Site: www.fluirdamente.com.br