Giselle Tigre é uma mulher de várias competências, como ela mesma gosta de dizer. Sobrinha-neta do poeta Manoel Bastos Tigre, herdou do tio-avô o gosto e a sensibilidade pelas artes. Estreou aos 14 anos no musical Zuzu, com o tradicional Grupo TAP (Teatro de Amadores de Pernambuco).
Aos 17 anos, mudou-se para São Paulo, onde passou a atuar como modelo fotográfico, estampando diversas capas de revistas famosas e atuando em comerciais de TV. De volta a Recife, estrelou as peças Paixão de Cristo e Jacque e Seu Amo. Estudou canto e, em 2000, lançou o CD Mais Além. No mesmo ano, participou de um teste para novos talentos da Globo e, em uma semana, já estava morando no Rio de Janeiro para atuar em três temporadas de Malhação, como a professora Linda, papel que a tornou conhecida do grande público.
O currículo é extenso, incluindo aí ainda vários outros musicais, participações nas novelas Amor & Revolução, do SBT, Gaby Estrella, exibida pela Globosat, Jesus, Gênesis e Reis, da RecordTV, e composição de músicas. Não termina aí! Sempre em busca de algo mais, acaba de lançar um livro em comemoração aos seus 50 anos. De uma forma simbólica, visando acolher e dar voz à mulher madura, a obra O Melhor da História É Agora traz fotos de sua carreira, bem como reflexões sobre beleza, maternidade, vida e morte. Giselle é mesmo incansável, inspiradora e linda!
Confira a entrevista completa:
Fale um pouco sobre sua afinidade com a arte.
Desde muito cedo, gostava de cantar. Ouvia Elis Regina no rádio e adorava. Pequeninha, já cantava Estrada do Sol, de Tom Jobim, uma música complexa. Minha mãe dava o exemplo, cantando e corrigindo a minha afinação. Sou sobrinha-neta de um poeta, Manoel Bastos Tigre. Declamava os poemas dele na escola, e Educação Artística era minha disciplina favorita. Aos 14 anos, estreei no musical Zuzu, em Recife, onde nasci.
Com 35 anos de uma carreira multifacetada na TV, teatro e música, qual seu veículo preferido?
Não separo a atividade artística. Sinto-me integrada quando estou atuando ou cantando, mas gosto muito da experiência contínua e efêmera do palco. Cada experiência é única, assim como na vida. A TV é um recorte de emoções mais fragmentado.
Você veio de um tempo dedicado ao teatro. Andava sentindo saudade da televisão?
Sim, fazia tempo que estava querendo viver novas experiências no audiovisual, com processos completamente diferentes dos trabalhos teatrais.
E como foi sua expectativa na pele de uma personagem marcante em Gênesis e, agora, nova atuação em Reis?
Emocionar o público é a meta. O trabalho ficou primoroso. Quando tanta gente se junta num propósito comum, só pode dar certo. O mesmo acontece com Reis atualmente.
Para celebrar os 50 anos, você preparou um projeto especial intitulado O Melhor da História É Agora. Fale mais a respeito.
Já tem um tempo que escrevo textos sobre meu processo de amadurecimento. Gosto de escrever. É um exercício terapêutico. Então, a proposta do livro é mesclar esses textos com os registros fotográficos de todo esse tempo de caminhada. Tenho tantas fotos maravilhosas que nunca foram publicadas, que merecem ser compartilhadas com o público. O título é uma de minhas reflexões, que alude ao momento presente, minha prática diária.
Tem outras perspectivas?
Voltar aos palcos cantando e viajar. Ou melhor dizendo: viajar cantando por muitos palcos. Pé na estrada: é a melho coisa do mundo.
A pandemia colocou um freio em todos nós. Como enfrentou esse período?
Eu diria que, de um modo geral, a pandemia trouxe reflexões importantíssimas, sinalizando mudanças necessárias na forma como o mundo tem lidado com problemas antigos, como a desigualdade social, a preservação do meio ambiente e os diversos tipos de preconceito, discriminação e intolerância. Não dá mais pra viver assim. Numa situação que nos coloca no limite de nós mesmos, a única coisa a fazer é reestruturar os sistemas. O ser humano tem sido testado sobre sua própria humanidade, capacidade de amar e esperançar. Somos um coletivo e, se não estiver bom pra todo mundo, não viveremos num mundo melhor. Venho tentado desde o início da pandemia aguentar firme e manter minha sanidade mental. A meditação foi fundamental nesse processo. Sabe aquela frase que é dita no avião antes de decolar? Aquela que diz: ‘coloque a máscara primeiro em si e depois ajude quem está ao seu lado’? Então, é literalmente o que estamos vivendo.
Sua beleza sempre foi algo marcante, motivo até de comparação com a também atriz Ana Paula Arósio. De que maneira encara isso?
Beleza nunca me trouxe felicidade. É uma cilada enorme se agarrar à aparência. Por isso, sempre busquei a espiritualidade e edificar valores mais profundos. Quando se fala em envelhecer, o mundo é cruel, especialmente com as mulheres. Mas isso é outra coisa que precisa ser ressignificada e vista com mais empatia. Há muita beleza na maturidade.
Falando nisso, o avançar da idade assusta você?
Não me assusta. O avançar da idade me instiga. Sinto-me preparada para as transformações da vida. Da mesma forma que o corpo entra numa curva descendente, o espírito/emocional segue para uma curva ascendente mental. São perdas e ganhos. É a vida. É lindo e ninguém está livre de passar por isso. Você que lê essa matéria, comece a pensar a respeito. Você vai envelhecer um dia…
Divida com as leitoras um segredinho para manter o corpo em dia.
Faça atividade física, aquela que você mais se identifique, adote uma alimentação menos industrializada possível e medite, pois é a mente que sustenta o corpo.
Como mãe, que valores procura transmitir na educação da sua filha sobre o respeito à diversidade?
Primeiro de tudo, liberdade de ser! Viva e deixe viver. Todos têm o direito e o dever de encontrar sua forma de ser e estar no mundo, e não existe uma só maneira para isso. Cada ser humano é único, singular. A geração da minha filha já nasceu com esse ‘chip’, nem fiz muito esforço, embora o exemplo dentro de casa seja fundamental para a construção dos valores humanos. Sou de uma geração que já criou os filhos com essa perspectiva. A geração de minha mãe ainda reproduziu os antigos valores de mulher dentro de casa, casada e tendo 1 milhão de filhos, submissa ao marido. Mas a minha mãe nunca quis esse destino para mim e costurou-me asas. Fui emancipada aos 17 anos. Casei só depois dos 30 e tive a sorte de fazer o que gosto na vida como ofício, sem deixar que ninguém ou o sistema me manipulasse. Isso é muito revolucionário. Como diz minha primeira canção autoral, Arvorada, em parceria com os amigos Zeh Rocha e Allyson Alves, ‘arvorecer é desapego da raiz, sem perder prumo e chão…, alvorada cresço’.
Você tem alguma religião? Como exerce a sua religiosidade?
Sou budista há 20 anos e também cristã. Respeito todas as religiões, inclusive quem é ateu. Sou a favor da liberdade de crença ou a opção por nenhuma. Religião é algo pessoal e intransferível. Fazer o bem e não fazer o mal é questão de ética, e não de religião. A melhor religião é aquela que te faz um ser humano melhor.
Aos 50 anos, como você vê a mulher madura no mercado de trabalho? E com relação às cobranças quanto à beleza e ao peso?
Vivemos uma época de uma nova consciência. O mundo está mudando. A mulher madura de hoje é mais engajada em suas questões. Mas, mesmo assim, é preciso se posicionar, levantar a voz, levantar bandeiras. Mostrar os reais valores, o que desejamos. Queremos ser respeitadas e envelhecer em paz. Canso de ver nas redes sociais matérias sensacionalistas mostrando mulheres envelhecidas em uma foto que as desfavorece. Cruel isso. São seres humanos e todos iremos envelhecer. É óbvio que quero estar cada vez melhor, principalmente minha cabeça. Afinal, quem não quer envelhecer saudável e feliz? E, para isso, há um investimento. Eu invisto no autoconhecimento e na meditação para ter uma cuca legal. Isso reflete no meu exterior. A beleza é o que você tem dentro de você. Não vou ficar me esticando com intervenção estética. Quero minhas rugas, pois elas são minha marca de passagem nesse mundo.
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