A opção por recorrer ao suicídio assistido feita pelo escritor
Antonio Cícero, integrante da Academia Brasileira de Letras,
suscitou uma série de discussões acerca do tema e, mais uma vez,
surgem as dúvidas no campo da moral religiosa; no nosso caso, a
moral espírita.
O argumento utilizado pelo “imortal” e por todos os que lançam
mão do mesmo expediente, reforçado pelo apelo da própria
organização que promove essa ideia, tem um viés eminentemente
materialista, ou seja: a vida perde o sentido quando uma doença
irreversível impede a realização de atividades corriqueiras, como
comer, andar, viajar, ou mesmo viver sem algum tipo de
desconforto ou até mesmo, dor.
Essa postura, muito próxima do que o psicólogo dinamarquês
Svend Brinkman denominou como “positividade tóxica”, acaba
colocando na cultura da sociedade a ideia de que tudo tem que dar
certo sempre; tudo tem que estar perfeito sempre. Só que a vida
não é assim!
Mormente na visão espírita, as experiências difíceis são
fundamentais para o processo evolutivo e não acontecem por
acaso, de modo que o suicídio é mais ou menos como rasgar as
últimas folhas de um carnê e jogá-las fora, acreditando que a
dívida se esvai junto.
Sob o ponto de vista do materialismo, até faz sentido. Se só
temos uma vida, não há nada após a morte, e ela não tem mais
perspectivas dentro dos padrões de felicidade que nos impomos,
por que arrastá-la à custa de sacrifício próprio e de terceiros?
Esse é o diferencial da visão espírita e, por decorrência,
reencarnacionista.
Colhemos hoje os frutos do plantio passado, seja nesta ou em
vidas pretéritas, de modo que tudo tem uma razão de ser,
incluindo o que se passa com aqueles que indiretamente sofrem as
consequências das restrições e dores alheias.
“Tudo está em tudo”, como dizia Anaxágoras de Clasômenas. O
imbricamento das relações criam vínculos positivos, mas também
de resgate e reconstrução que precisam ser administrados para o
progresso espiritual de todos os envolvidos.
A vida é a única oportunidade de evolução da criatura humana e
o processo evolutivo, como todas conquistas, possui momentos
bons e ruins, de esforço e recompensa, de modo que é ilusório
evitar compromissos aniquilando a matéria, porém importante que
se frise que, por outro lado, nem tudo está perdido.
“Nenhuma ovelha se perderá do meu rebanho”, asseverou o
Cristo, de modo que os suicidas não vão para o inferno, nem serão
alvo da fúria de Deus, ao contrário: o amor incondicional do Pai
lhes dará todas as oportunidades necessárias à recuperação,
possivelmente com o agravamento decorrente do gesto
equivocado, mas nada que transcenda o único objetivo da vida,
que é aprender, evoluir e crescer.
Deus ama, e como disse Içami Tiba, “quem ama educa”.
Pode doer, mas passa, cura e ensina.
Edson de Jesus Sardano