Nos últimos anos, o Brasil tem dado passos importantes no reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiência, especialmente no que diz respeito ao acesso à educação. De acordo com o Censo Escolar, o número de matrículas de estudantes autistas na educação básica aumentou 44,4% entre 2023 e 2024, passando de 636 mil para mais de 918 mil alunos.
Esse crescimento expressivo, embora positivo, exige atenção. Para o psicólogo Fábio Coelho, especialista em Transtorno do Espectro Autista (TEA), não se pode confundir a ampliação de matrículas com uma verdadeira inclusão. “A inclusão precisa sair do papel e chegar à sala de aula. Não basta aceitar a matrícula, é preciso garantir o suporte necessário para o desenvolvimento dessas crianças”, afirma.
Dados do Censo Escolar revelam cenário desafiador
Além do aumento de estudantes com TEA, o levantamento mostra que a educação especial cresceu 17,2% em número total de matrículas. Ainda segundo o Censo Escolar, 95,7% dos alunos de 4 a 17 anos com deficiência estão inseridos em turmas regulares. Isso demonstra um esforço para incluir esses estudantes no ambiente comum, porém, como reforça Fábio, isso só será efetivo com a preparação adequada de toda a equipe pedagógica.
Nesse sentido, ele destaca a importância da formação continuada: “O primeiro passo é compreender que o autismo é um espectro amplo, e cada aluno tem necessidades e habilidades únicas. Essa compreensão é o ponto de partida para um acolhimento real e efetivo.”
Formação dos profissionais é fundamental
Garantir a presença do aluno autista em sala de aula é importante, mas o verdadeiro desafio está em acolhê-lo de forma adequada. E isso exige mais do que boa vontade. É preciso que professores, gestores e demais funcionários da escola saibam reconhecer sinais de desconforto, ansiedade ou sobrecarga sensorial, comuns em muitos casos de TEA.
Com isso em mente, Fábio defende o investimento em capacitação: “A capacitação da equipe escolar é essencial. Professores, gestores e funcionários precisam ser treinados para aplicar estratégias que estimulem a participação ativa do aluno autista.”
Além disso, ele ressalta que estratégias pedagógicas adaptadas, uso de materiais específicos e presença de profissionais como mediadores e professores de apoio fazem toda a diferença na rotina desses estudantes.
Escolas ainda enfrentam dificuldades para promover inclusão real
Embora o Ministério da Educação já tenha sinalizado o fortalecimento da Política Nacional de Educação Especial e a ampliação das salas de recursos multifuncionais, a realidade dentro das escolas ainda está distante do ideal. Muitas unidades de ensino não contam com estrutura adequada, o currículo continua inflexível e faltam profissionais capacitados para lidar com as especificidades dos estudantes com TEA.
Não por acaso, muitos estudantes acabam tendo dificuldades de socialização, comunicação e aprendizado, o que pode impactar diretamente seu desenvolvimento e autoestima.
Famílias pressionam por direitos e impulsionam matrículas de autistas
Outro fator que ajuda a explicar o crescimento das matrículas, segundo Fábio, é a maior conscientização das famílias. Cada vez mais pais e mães estão informados sobre os direitos assegurados por lei — como o Estatuto da Pessoa com Deficiência — e não aceitam que seus filhos fiquem de fora da escola.
Além disso, a busca por um diagnóstico precoce e o maior acesso a serviços de saúde têm contribuído para o aumento nos números. Entretanto, como o psicólogo ressalta, isso também demanda uma resposta eficiente das escolas: “Inclusão real exige preparo, compromisso e formação contínua.”
Investir em políticas públicas é essencial, aponta o Censo Escolar
O próprio Censo Escolar reforça a importância de políticas públicas que vão além das estatísticas. Afinal, não adianta ampliar as vagas se os estudantes não têm suporte. Por isso, especialistas defendem que o caminho para uma escola mais inclusiva passa por ações concretas, como:
- Capacitação constante dos profissionais;
- Criação e aplicação de Planos Educacionais Individualizados (PEIs);
- Apoio de mediadores em sala;
- Participação ativa da família no processo de ensino-aprendizagem.
Inclusão de alunos com autismo precisa ser mais que simbólica
Por fim, é preciso lembrar que inclusão não é apenas um número no sistema de matrículas. Incluir de verdade significa garantir que o aluno com autismo se sinta acolhido, estimulado e respeitado. E para isso acontecer, cada escola precisa assumir a responsabilidade de oferecer um ambiente adaptado, sensível às diferenças e aberto ao diálogo com a família.
O caminho ainda é longo, mas, com políticas públicas bem aplicadas, formação constante e o envolvimento de todos, é possível transformar os dados do Censo Escolar em histórias reais de inclusão e desenvolvimento.
Resumo: As matrículas de autistas cresceram 44,4% em um ano, segundo o Censo Escolar, mas inclusão vai além dos números. Para especialistas, é essencial investir na formação de professores e em estrutura adequada. Cada aluno no espectro tem necessidades únicas que precisam ser respeitadas.
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