Mesmo com avanços na escolaridade em relação às gerações anteriores, o Brasil ainda enfrenta um índice preocupante de analfabetismo funcional: 29% da população com mais de 15 anos não consegue interpretar informações mais complexas em textos e números. Os dados são do Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF), que também revela uma lenta evolução desses números nos últimos anos.
Apenas um terço da população nessa faixa etária possui alfabetização consolidada, ou seja, consegue interpretar textos longos, identificar informações implícitas e lidar com operações matemáticas complexas. Outros 36% têm nível elementar e conseguem compreender textos médios e realizar contas simples.
Segundo a coordenadora do estudo, Ana Lima, é no ambiente de trabalho que muitos jovens conseguem desenvolver essas habilidades. “É no trabalho que você convive com pessoas que sabem mais, que têm processos e métodos, e há uma troca constante de ajuda e aprendizado. Isso contribui para o desenvolvimento de leitura, escrita e matemática”, afirma.
Trabalho e estudo: combinação que faz diferença
O levantamento mostra que 65% dos jovens de 15 a 29 anos que estudam e trabalham atingem níveis adequados de alfabetismo. Entre os que apenas estudam, o índice cai para 43%, e para 45% entre os que só trabalham. Já entre os que não estudam nem trabalham, apenas 36% apresentam bom desempenho.
Embora a pesquisa não estabeleça uma relação direta de causa e efeito, Ana Lima ressalta que a experiência profissional ajuda, especialmente quando aliada à educação formal. “Os jovens de hoje chegam ao mercado mais qualificados do que no passado, mas ainda enfrentam limitações para atuar em um mercado que valoriza tecnologia e exige menos trabalho braçal”, explica.
A pesquisadora também defende mudanças na Educação de Jovens e Adultos (EJA), que passou por alterações no perfil dos alunos ao longo das últimas décadas. Se antes o foco estava em trabalhadores mais velhos, hoje muitos jovens interrompem os estudos e tentam conciliá-los com a vida profissional. Para ela, incluir formação profissionalizante e parcerias com empresas e sindicatos pode ampliar a inserção e reduzir o abandono escolar.
Desigualdades de gênero e raça
O estudo também revela desigualdades persistentes. Entre mulheres jovens com analfabetismo funcional, 42% não estudam nem trabalham, no caso dos homens, o percentual é de 17%. Já entre jovens negros, 17% estão no grupo do analfabetismo funcional, e apenas 40% têm alfabetização consolidada. Entre brancos, os números são melhores: 13% e 53%, respectivamente.
Para a coordenadora do estudo, combater essas diferenças exige políticas públicas direcionadas às populações mais vulneráveis. “É preciso valorizar empregadores e redes educativas que ofereçam horários flexíveis e oportunidades reais de formação continuada”, afirma.
Resumo:
Analfabetismo funcional segue em alta no Brasil. Enquanto isso, a inserção no mercado de trabalho pode ajudar no desenvolvimento da leitura, mas desigualdades sociais e raciais seguem como barreiras
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