A carioca Ana Paula Villar virou manicure acidentalmente. Para complementar a renda da família, além de trabalhar num escritório de contabilidade, ela fazia massa de coxinhas para vender com uma amiga e, ao pintar as unhas dessa colega, ganhou muitos elogios e clientes. Quando se deu conta, sua popularidade foi se espalhando tanto pelo bairro, em Rocha Miranda, zona norte do Rio, que sentiu a necessidade de chamar outras manicures para trabalhar com ela na garagem de casa.
À medida que a demanda ia crescendo e sua equipe também, ela passou a sonhar com um salão maior. Foi aí que seu filho mais velho, Douglas (ela também é mãe de Gustavo e Davi), que é designer gráfico, teve a ideia de mostrar na internet os desenhos artísticos incríveis que saíam daquele ambiente simples e improvisado, aumentando, assim, a procura pela profissional.
Como o atendimento era feito por ordem de chegada, as pessoas vinham de todo o lugar para madrugar na porta de sua casa. O que o público queria mesmo era aquela unha perfeita que viam na internet. Mesmo o salão abrindo às 9h, lá pelas 5h da manhã já existiam pessoas em pé, brigando por uma vaga.
Só que Ana Paula acabou dando um passo maior que a perna. Decidiu sair da garagem e fez vários empréstimos para construir um salão com cerca de 20 funcionários. Resultado: acabou quebrando. Mas, como sempre, deu a volta por cima e virou influenciadora digital com a ajuda da família, que ficou ainda mais unida.
Seu canal Cola na Villar ultrapassou a marca de 1 milhão de seguidores. Com vídeos bem sacados e divertidos, a manicure conquistou admiradores no YouTube. Desde 2015, além de entreter, Villar dá dicas, cursos e palestras pelo Brasil. Seu objetivo maior é valorizar a profissão de manicure, mostrar que a categoria existe e não é apenas um bico, e sim um emprego que gera renda para muitas famílias. Com a palavra, a querida, alegre e talentosa Villar!
MUITOS SONHOS E POUCAS ESPERANÇAS…
“Minha infância foi muito triste e pobre. Sou filha de empregada doméstica e não tive pai presente. Eu vivia pela rua e a casa dos outros. Mas não porque a minha mãe era desleixada, simplesmente ela tinha que trabalhar muito para sustentar a casa. Essa era sua prioridade, além de conseguir me alfabetizar”.
PRECONCEITO
“Sofri muito desde o início. A profissão de manicure sempre foi muito desvalorizada e algumas pessoas ainda acham que essa é a última opção de alguém que não serviu para nada. Uma vez ouvi uma dona de salão dizer que a manicure era um mal necessário e que, nós, não passávamos de donas de casa frustradas. Embora essas palavras tenha me ferido, não desisti. Vi que o mercado estava crescendo e, a cada dia, me apaixonava ainda mais pela profissão. O que eu fiz? Usei essas palavras duras como um combustível para seguir em frente e fiz questão de mostrar ao mundo que não era nada disso, quis calar a boca dessas pessoas, mostrando que cresceria (e muito) como profissional. E assim foi. Estou aqui!”.
CONSELHO
“Um conselho que deixo para inspirar pessoas dentro dessa profissão é que, apesar de o caminho não ser fácil, de não ter o apoio de muita gente, vá em frente, você consegue crescer. Mas isso se você acreditar em si mesma. Só entre nessa profissão se você realmente ama servir e cuidar de pessoas. Levante a cabeça, melhore sua autoestima e nunca deixe ninguém falar que você é algo que não é. Entre para vencer, estude, se qualifique, invista em você, se ame e, assim, não tem como dar errado”.
DIFICULDADES
“Reprovavam o meu jeito espontâneo de ser, de falar, vestir, e isso foi muito triste. Sofri com a exploração de marcas e pessoas que se aproveitaram do simples fato de ser pobre, talentosa e sonhadora. Mas, em contrapartida, foi incrível receber a aceitação do público, que, às vezes, nem é da área. Quebrei tabus, literalmente, e provei que não precisava fazer a ‘bonitinha’ para mostrar a grande profissional que sou. Fui, dia a dia, derrubando essas barreiras e conquistando meu espaço”.
AMOR-PRÓPRIO
“Me orgulho muito de carregar a bandeira da representatividade. Negra, manicure, de origem humilde, filha de empregada doméstica, mãe solteira e gorda. São anos de muito trabalho, muito choro, cansaço e dificuldades. A sensação, hoje, é de realização, com a certeza de que minha missão ainda não chegou ao fim. É uma mistura de alegria, orgulho e vitória. É uma vitória minha e de toda a ‘manicurada’, que sofre junto comigo diariamente com a desvalorização do mercado. Estamos crescendo cada vez mais e sei que alcançaremos o que desejamos e merecemos”.
INSPIRAÇÃO
“Muitas meninas pobres se tornam mães cedo e acabam tendo que trabalhar e abrir mão dos estudos. Quando veem toda a minha trajetória, elas têm a certeza de que também podem mudar de vida, crescer profissionalmente e como pessoa, mesmo sendo de origem humilde. O que mais recebo nas redes sociais ou escuto quando tenho a oportunidade de estar com elas é que, de alguma forma, mudei a vida e a visão delas, seja com um post, um vídeo, um story. Isso é sensacional, incrível, me emociono demais”.
SUCESSO E REALIZAÇÃO
Em cinco meses de canal, Ana Paula foi chamada para dar entrevista no programa ‘Encontro com Fátima Bernardes‘, da Globo. As marcas passaram a oferecer parcerias em troca de anúncios no canal. “Algumas acham que a gente só quer ganhar produto. Mas, aos poucos, conquistei meu espaço e comecei a ser respeitada pelo crescimento”. Um exemplo: uma marca de máquinas para unha que vendia 500 peças por ano mais que dobrou o lucro após anunciar em seu canal. “Eles venderam 1.200 unidades depois que apareceram”.
Com o sucesso, ela ainda criou cursos on-line em que ensina estratégias de vendas e negócios, além de técnicas de manicure. Contabiliza ter formado mais de três mil pessoas. Ana também está com sua própria linha de esmalte, com venda em pelo menos oito lojas especializadas e na internet. A meta é atrelar seu nome a diferentes produtos utilizados neste ramo. Hoje, pode-se dizer que ela é muito mais empresária que manicure. Dá palestras, participa de feiras… “Passei o que tinha que passar para ter essa história de sucesso. Não posso reclamar do que conquistei”, finaliza.