No ambiente profissional, muitas mulheres ainda se sentem pressionadas a parecer sempre simpáticas, acessíveis e prestativas. Embora atitudes como essas pareçam inofensivas à primeira vista, especialistas alertam que esse comportamento constante tem nome e pode impedir o crescimento profissional: trata-se do trabalho de agradar.
O termo foi cunhado por Amy Kean, da consultoria Good Shout, para descrever o esforço constante e muitas vezes exaustivo de mulheres que tentam ser vistas como agradáveis no ambiente corporativo. Em seu estudo realizado no Reino Unido, intitulado Shapeshifters: What We Do to Be Liked at Work, ela identificou que 56% das mulheres se sentem pressionadas a agradar todos no trabalho, contra apenas 36% dos homens.
De acordo com Kean, isso envolve desde o uso excessivo de linguagem minimizadora — como “desculpa, só para entender rapidinho” ou “não sei se faz sentido” — até o cuidado exagerado com o tom de voz e a postura. Muitas vezes, essas estratégias não são conscientes, mas surgem como defesa diante do medo de serem vistas como agressivas ou difíceis de lidar.
Como o trabalho de agradar afeta a autoestima e a liderança feminina
A pressão para agradar não está ligada apenas à simpatia. Ela tem raízes sociais profundas, como explica a socióloga Gladys Nyachieo, da Universidade Multimídia do Quênia. “As mulheres são socializadas para servir e cuidar desde cedo, e essa mentalidade é transferida para o ambiente de trabalho”, afirma à BBC.
O estudo Women in the Workplace 2025, da consultoria McKinsey, mostra que esse padrão se repete em diferentes partes do mundo. No Quênia, por exemplo, mulheres ocupam 50% dos cargos de entrada em setores como saúde e serviços financeiros, mas apenas 26% dos cargos de liderança. Esse fenômeno é conhecido como “degrau quebrado”, uma barreira invisível que impede a ascensão profissional feminina.
Segundo Nyachieo, a figura da “mãe do escritório” — expressão popular que representa a funcionária que sempre ajuda, faz café e resolve os problemas do dia a dia — é um exemplo do trabalho de agradar. “Não há problema em ajudar, mas o reconhecimento raramente vem. A cobrança para entregar resultados continua igual ou até maior”, alerta.
A importância de questionar e negociar o próprio espaço
Para mudar esse cenário, é preciso mais do que força de vontade individual. É fundamental que empresas criem políticas que favoreçam a equidade, como mentorias, liderança empática e horários flexíveis. Ainda assim, cada mulher pode começar essa transformação se autorizando a dizer o que pensa.
“Ser agradável o tempo todo não leva ninguém longe. É necessário aprender a negociar e defender suas ideias”, aconselha Nyachieo, que atua como mentora de jovens profissionais no Quênia.
Um dos maiores aprendizados que ela transmite é que não há problema em não corresponder às expectativas de simpatia o tempo inteiro. Afinal, mais do que ser querida, é importante ser respeitada e levada a sério.
A pressão para agradar é um desafio global
Estudos realizados em outros países confirmam que o trabalho de agradar é um fardo enfrentado por mulheres no mundo inteiro. Uma pesquisa da empresa americana Textio, por exemplo, analisou dados de 25 mil funcionários em 253 organizações e revelou que 56% das mulheres receberam críticas por “não serem agradáveis”, enquanto apenas 16% dos homens ouviram esse tipo de comentário.
Além disso, homens foram quatro vezes mais elogiados por serem agradáveis, mesmo sem demonstrar esforços adicionais para isso. Isso mostra que o julgamento de comportamento no ambiente de trabalho ainda é desigual e penaliza quem ousa se posicionar.
Portanto, é essencial discutir o tema com profundidade. O “trabalho de agradar” pode parecer algo pequeno, mas quando acumulado ao longo dos anos, pesa — e muito — sobre as escolhas, a saúde mental e as oportunidades profissionais das mulheres.
Resumo: O chamado trabalho de agradar representa a pressão constante que muitas mulheres sentem para parecer simpáticas e acessíveis no trabalho. Esse comportamento, muitas vezes invisível, impacta diretamente o crescimento profissional e é reforçado por padrões sociais desiguais. Para avançar, é preciso reconhecer o problema, buscar apoio e aprender a se posicionar sem culpa.
Leia também:
Beleza digital? Modelo criada por IA estampa anúncio da Vogue