A CPI das Bets continua rendendo mais do que depoimentos. Desde o início da semana, quando Virginia Fonseca prestou esclarecimentos à comissão, seu nome passou a circular com ainda mais força nas redes — desta vez, por causa de um desentendimento entre seu marido, Zé Felipe, e a atriz Luana Piovani, de 48 anos. O conflito começou quando Luana fez críticas à participação da influenciadora na CPI, questionando desde as roupas escolhidas até seu comportamento durante a sessão.
Em resposta, Zé Felipe recorreu ao Instagram para defender a esposa. Mas, em vez de argumentar sobre o mérito das críticas, preferiu o ataque pessoal. “Hoje é mesversário do José [filho caçula do casal] e já acordei com esse Matusalém querendo biscoitar. Luana Piovani, vai tomar no seu c*, meu amor de Jesus Cristo”, disparou o cantor.
Ignorando o tom agressivo e os palavrões, um ponto específico da fala merece atenção: a escolha do termo “Matusalém” para se referir à atriz. A palavra, associada à longevidade (e muitas vezes usada com deboche), revela algo mais profundo e preocupante do que um simples insulto. Trata-se de etarismo, o preconceito baseado na idade.
Matusalém: o ataque disfarçado de piada
Além do desentendimento entre duas figuras públicas, o episódio escancara o quanto ainda é comum atacar mulheres por estarem envelhecendo — como se isso, por si só, fosse motivo de vergonha. “Olhando de um modo mais amplo, a questão toda vai além da discussão sobre quem está certo ou errado e cai na questão do etarismo”, explica Luciana Lancerotti, Designer de Impacto e ex-CMO da Microsoft.
O preconceito etário atinge principalmente mulheres, que costumam ser cobradas por sua aparência desde muito cedo e, quando passam dos 40 ou 50 anos, começam a ser tratadas como “fora de época”. Não é coincidência que Piovani tenha sido chamada de “Matusalém”. A palavra carrega um julgamento cruel: o de que ela já deveria se calar por não estar mais no auge da juventude — uma lógica que raramente se aplica aos homens.
Envelhecer é inevitável — e ainda é tabu
O fato é que o Brasil está envelhecendo. Uma pesquisa de 2023, feita pela Ernst & Young em parceria com a Maturi e baseada em dados da Pnad (IBGE), mostrou que a população com mais de 50 anos passou de 23% para 28% em menos de uma década. E a tendência é que esse número siga aumentando nos próximos anos.
“Estamos falando de quase um terço da população. Mesmo assim, o etarismo começa justamente aos 50. A pessoa ainda tem décadas de vida ativa pela frente, mas já começa a ser tratada como alguém ‘fora de jogo’”, reflete Luciana.
De mãos dadas com aumento da população 50+, está o etarismo. Segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), quase 17% das pessoas com mais de 50 anos já sofreram algum tipo de discriminação por causa da idade.
O problema não está apenas nas piadas. O preconceito baseado na idade tem impactos reais na autoestima, na saúde mental e até nas oportunidades de trabalho e visibilidade de quem já passou da juventude — especialmente as mulheres. É comum que atrizes, jornalistas e apresentadoras desapareçam da mídia conforme envelhecem, enquanto homens da mesma faixa etária seguem sendo vistos como “experientes” ou “respeitáveis”.
O custo do preconceito e o valor da experiência
“Essa mudança demográfica impacta tudo: economia, mercado de trabalho, relações sociais. Mas se a gente continuar tratando o envelhecimento como algo negativo, como motivo de deboche ou desprezo, só vamos reforçar uma lógica que exclui justamente quem mais tem a contribuir com experiência”, aponta Luciana.
A contradição é evidente: enquanto a sociedade envelhece, o discurso ainda valoriza apenas a juventude — e cobra das mulheres que sejam eternamente jovens, belas e discretas. Quando elas ousam permanecer visíveis, opinativas e politizadas depois dos 40, são chamadas de “amargas”, “velhas” ou “chatas” (ou Matusalém).
O futuro nos inclui — ou nos descarta?
Em vez de gastar energia tentando silenciar mulheres que envelhecem com coragem, talvez seja hora de rever nossos próprios preconceitos. “O convite aqui é para usarmos melhor a nossa energia. Menos julgamento, menos crítica vazia. Mais construção, mais diálogo, mais inclusão”, propõe Luciana.
Porque, no fim das contas, todos vamos envelhecer. E a pergunta que fica é: estamos construindo um futuro onde seremos todos bem-vindos — ou um onde seremos descartados por algo que acontece com todo mundo, sem exceção?
Resumo: O ataque de Zé Felipe à atriz Luana Piovani, com ofensas etaristas, expõe como mulheres são julgadas por envelhecer. O episódio revela o preconceito ainda presente na sociedade, que desvaloriza a experiência e exclui quem passa dos 50. Especialistas alertam: o Brasil está envelhecendo, e é urgente repensar essa lógica.
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