Neste mês de agosto, a Lei Maria da Penha completa 19 anos e continua sendo um símbolo da luta por justiça e proteção das mulheres brasileiras. Muito mais do que um marco legal, ela representa um divisor de águas no combate à violência doméstica no país.
Para além de tipificar condutas e endurecer penas, a legislação fortaleceu a rede de apoio às vítimas e trouxe visibilidade a um problema que, por muito tempo, foi tratado como assunto privado.
O que mudou com a Lei Maria da Penha
Antes da sanção da Lei Maria da Penha, as agressões cometidas dentro de casa raramente resultavam em punições severas. Segundo explica a advogada e terapeuta Mayra Cardozo, um dos maiores desafios era mostrar à própria vítima que aquele comportamento violento era, sim, crime e precisava ser denunciado.
A aprovação da lei em 2006 não criou um novo tipo penal, mas foi decisiva ao incluir a qualificadora de “violência doméstica” nos crimes de lesão corporal. Assim, casos desse tipo passaram a ter penas mais duras e específicas.
Além disso, o texto legal proibiu a aplicação de penas pecuniárias — como o pagamento de cestas básicas — nesses casos, algo comum até então. Também instituiu as medidas protetivas de urgência, que permitem o afastamento imediato do agressor, e viabilizou a criação de juizados especializados para o julgamento de crimes contra a mulher.
A violência doméstica nos dias de hoje
Embora a sociedade tenha avançado em vários aspectos, os números ainda assustam. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os casos de violência contra a mulher cresceram 8,7% em 2024, com mais de 440 mil novos processos registrados até agora em 2025.
Esses dados evidenciam que a violência doméstica segue como uma chaga social, exigindo atenção constante do poder público, da sociedade e da mídia. A boa notícia é que, graças à lei e à mobilização coletiva, os casos têm sido mais denunciados e discutidos abertamente.
A evolução da lei e a inclusão da violência psicológica
Outro ponto de destaque nos 19 anos da Lei Maria da Penha foi o reconhecimento da violência psicológica como crime. “Muitas mulheres achavam que abusos emocionais e tentativas de controle faziam parte do relacionamento. Com a criminalização, em 2021 passou-se a entender que isso também é violência”, explica Mayra.
A partir dessa mudança, a violência psicológica passou a ser punida com pena de 6 meses a 2 anos de reclusão, além de multa. Mais do que um avanço legislativo, essa alteração consolidou a importância da escuta, do acolhimento e do respeito à saúde mental das vítimas.
O papel da punição na luta contra a violência doméstica
Apesar dos avanços, o debate sobre o uso do poder coercitivo do Estado ainda levanta discussões. Para a especialista, existe um paradoxo: por um lado, é essencial agir com firmeza para interromper ciclos de agressão; por outro, a forma como a punição é aplicada pode reforçar estereótipos de gênero, mantendo a lógica de dominação que se busca combater.
Ainda assim, o uso das medidas protetivas e a punição adequada são ferramentas fundamentais para conter o avanço da violência doméstica e evitar que mais mulheres sejam silenciadas pela dor ou pelo medo.
O impacto social da Lei Maria da Penha
Além do efeito jurídico, a Lei Maria da Penha também cumpriu (e continua cumprindo) um papel pedagógico na sociedade. Ela ajudou a mudar a percepção sobre o que é — e o que não é — aceitável dentro de um relacionamento.
Com o passar dos anos, ficou claro que a lei não trata apenas da punição ao agressor, mas da proteção à mulher em todas as esferas: física, emocional, psicológica e patrimonial. Isso inclui desde a criação de delegacias da mulher até políticas públicas de assistência e prevenção.
Precisamos continuar falando sobre violência doméstica
Mesmo com 19 anos de existência, a Lei Maria da Penha ainda encontra resistências. Muitas mulheres continuam sem acesso à informação, à rede de apoio ou têm medo de denunciar. Por isso, é fundamental que a sociedade siga discutindo, educando e promovendo espaços seguros para que as vítimas se sintam acolhidas.
A conscientização e o conhecimento salvam vidas. “A legislação só é efetiva quando as pessoas compreendem seu significado e quando o Estado garante as estruturas para sua aplicação”, lembra Mayra.
O que você pode fazer
Se você está em uma situação de risco ou conhece alguém que esteja, procure ajuda. O número 180 funciona 24 horas por dia, inclusive nos finais de semana e feriados. Sua denúncia pode ser anônima e pode salvar uma vida.
Resumo: Aos 19 anos, a Lei Maria da Penha continua sendo uma ferramenta essencial na proteção da mulher e no enfrentamento à violência doméstica. Seus avanços legais, como a criminalização da violência psicológica, representam conquistas importantes, mas ainda é necessário promover mais conscientização para transformar essa realidade.
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