Aqui, entre nós, quantas vezes você já viu uma mulher sucumbir à exaustão? Quantas vezes, em conversas íntimas com nossas amigas, mães, familiares, compartilhamos nossas listas de tarefas infinitas do dia a dia — e nos sentimos cansadas só de pensar que amanhã teremos que dar conta de tudo (de novo).
“Mas meu marido me ajuda com as coisas em casa”, dizem muitas. Mas ajudar não é dividir. Quando temos que delegar uma tarefa não estamos dividindo a responsabilidade sobre ela. Educar um homem sobre a administração da casa não deveria ser mais um trabalho para nós, mulheres. Pedir cansa. Planejar refeições, fazer lista de compras, explicar tintim por tintim como deve ser feito o café, lembrar da escola das crianças… tudo isso exaure.
Quem divide o lar com um companheiro, marido, irmão, tio ou pai, já deve ter ouvido como resposta ao colapso: “Era só ter me pedido que eu faria”. Ah! Esse é o ponto-chave do início da nossa conversa. Mas para chegarmos à raiz dessa discussão, precisamos voltar algumas décadas no tempo.
Um pouco de história…
A divisão de tarefas domésticas tem raízes profundas e complexas. Durante o século XIX, com o avanço da industrialização e o crescimento das cidades, o Brasil passou por transformações sociais importantes — e uma delas foi a chegada do chamado movimento higienista. Essa corrente, influenciada por ideias médicas e científicas da época, defendia práticas de higiene pessoal, construção de sistemas de esgoto e coleta de lixo como forma de conter doenças e melhorar a saúde da população.
O higienismo também teve reflexos na educação: buscava disciplinar crianças e jovens, promovendo hábitos de limpeza, organização e comportamento. E, dentro dessa lógica, a casa passou a ser vista como um espaço central de controle da moral e da saúde da família. Coube às mulheres, então, a responsabilidade de manter o lar limpo, acolhedor e “em ordem” — enquanto os homens ficavam com o trabalho fora de casa, nas fábricas e escritórios.
Essa divisão não nasceu ali, mas foi reforçada com ainda mais força nesse período. Consolidou-se a ideia de que o cuidado com o lar era uma missão naturalmente feminina — e ela segue nos assombrando até hoje.
Vocês não queriam conquistar o trabalho formal? Agradeçam!
Essa divisão tem um grande problema: as mulheres queriam mais. Queriam autonomia financeira, poder de escolha, liberdade. E o feminismo teve — e ainda tem — papel fundamental nessa luta. Com muitos obstáculos e avanços lentos, conquistamos o direito de acessar o trabalho formal, estudar, votar, ocupar cargos públicos e ter nossos próprios rendimentos.
Até aqui parece tudo certo, não é? Mas a verdade é que, mesmo antes de termos carteira assinada ou diploma, as mulheres sempre trabalharam — em casa, no campo, como parteiras, lavadeiras, cuidadoras, cozinheiras. O que faltava (e muitas vezes ainda falta) é o reconhecimento e a remuneração justa por esse trabalho.
Com a chamada emancipação feminina, entramos com tudo no mercado de trabalho. Mas dentro de casa… nada mudou. A sobrecarga permaneceu. Agora somos responsáveis pelas contas e pelas crianças. Pelos boletos e pelas lancheiras. Acumulamos funções, tarefas, expectativas — e estamos cansadas. Exaustas.
Para onde caminhamos?
Durante um café da tarde com minha avó e minhas irmãs, conversávamos sobre o tema, e minha avó, do alto dos seus lúcidos 82 anos, disparou uma frase que ecoou na minha memória por muito tempo: “Ah, na minha época era aceitável um homem não dividir as tarefas domésticas, hoje em dia não tem mais desculpas”. É, dona Rosita. Tem razão.
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