Quando estamos na fase da amamentação, não é raro ouvir frases desmotivadoras sobre esse processo tão desafiador, mas extremamente compensador que vivemos com nossos filhos. Por isso, conversamos com diferentes especialistas no assunto para mostrar porque essas “opiniões” de terceiros, além de falsas, não devem ser levadas em conta na hora de amamentar seu bebê.
A seguir, compartilho 10 mitos que desencorajam a amamentação e por que deveriam parar de ser repetidos pelo bem das mães e dos bebês.
1 – “Você precisa desmamar rápido pra não criar um bebê apegado”
A pediatra e neonatologista Ana Luiza V. da Paz Matos, do Departamento de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria, conta que a ideia do “estar apegado” como prejudicial, parte do desconhecimento da necessidade do apego para o desenvolvimento psicossocial da criança. “O apego é fundamental para a estruturação da criança no mundo. As crianças que viveram um “bom apego” na dependência materna, terão mais condições de desenvolver-se de forma saudável do ponto de vista emocional. A amamentação contribui muito para a formação deste apego, uma vez que não pode ser terceirizada”.
ORIENTAÇÃO: Amamentar promove e aumenta o apego e vínculo, fundamentais na construção do alicerce da infância.
2 – “Seu leite está fraco, o bebê precisa de suplemento”
Graziela Abdalla, Gerente de Enfermagem da Perinatal/ Rede D’Or e especialista em amamentação, faz um alerta: imagina uma mulher que, em algum momento, está em dúvida sobre a capacidade de alimentar seu filho. Ouvir isso destruiria qualquer esperança dela amamentar exclusivamente no seio. A confiança em sua capacidade é um dos principais fatores na ejeção do leite. Para uma quantidade adequada de ocitocina (hormônio responsável pela ejeção do leite) a mulher precisa estar emocionalmente estável, precisa estar bem. A ideia que o leite pode ser fraco surge por causa de alguns momentos em que o bebê aumenta a necessidade de sugar. Assim que o bebê nasce, depois da primeira hora de vida, fica mais tranquilo, descansa do parto, tem reserva de energia e líquido amniótico no estômago.
Isso faz com que, algumas crianças, nas primeiras 24 horas, não tenham tanta avidez para a mamada. Ao final das primeiras 24h horas de vida, o bebê desperta, absorve o líquido amniótico e passa a sentir fome. A puérpera está na fase do colostro (que não possui muita gordura) e que, apesar de imunizar e nutrir, não oferece a sensação de saciedade por muito tempo. Então, o bebê passa a solicitar a mama em intervalos muito curtos, mas que aumentam assim que há a apojadura (descida do leite). “Essa demanda de mamada irregular (toda hora) faz com que se pense que o leite está fraco e que se precisa de complemento. Mas não é verdade. Além disso, cada bebê tem um ritmo de mamada, intervalos diferentes, pois cada mulher produz uma quantidade, então, as mamadas são realizadas de acordo com a demanda do bebê e a capacidade de produção de cada mulher. Pode ser que haja um bebê que de sacie em 5 minutos e outro que precise mamar 40”, diz.
ORIENTAÇÃO: O importante, independentemente do ritmo ou intervalo das mamadas, é avaliar o ganho de peso e o crescimento. Outra forma de avaliar a ingesta de leite adequada é através da avaliação do número de fraldas de xixi. Depois que há a descida do leite, o ideal é bebê fazer pelo menos 6 fraldas de xixi em 24 horas.
3 – “Se você tem prótese de silicone não pode amamentar”
Glaucia Exposito, coordenadora do LeME Comunica (Leite Materno na Escola), explica que no caso das próteses de silicone, cada caso deve ser avaliado individualmente. Dependendo da cirurgia, alguns ductos lactíferos podem ter sido rompidos, impedindo que parte do leite produzido saia da mama. Em alguns casos, será necessária uma complementação ao bebê e quem amamenta pode fazer estímulos para aumentar sua produção de leite. Mas a resposta definitiva vai depender de cada pessoa, do tipo de cirurgia e de quanto tempo atrás ela foi feita. Em casos como esse, é muito bom o acompanhamento de um especialista em amamentação para fazer uma avaliação individualizada.
“A ideia de que a prótese é um impeditivo ocorre pois, antigamente, muitas cirurgias (prótese de silicone e mamoplastia redutora) eram realizadas sem ter essa atenção a possível amamentação depois e, com isso, difundiu-se que uma pessoa com cirurgia mamária não poderia amamentar, o que não é verdade. Essa afirmação desencoraja mulheres pois ela passa a duvidar da amamentação desde a gravidez, quando essa avaliação só pode ser feita de forma individual, após o nascimento do bebê. Com um acompanhamento adequado, histórias como essas poderão passar a ser exemplo de que a amamentação (exclusiva ou mista) pode ser possível sim. O ideal é procurar acompanhamento especializado desde a gestação, se possível”.
ORIENTAÇÃO: Se você tem prótese de silicone ou fez redução mamária, procure um acompanhamento especializado em aleitamento desde a gestação e no início da lactação para avaliação e orientação individual.
4 – “Fórmula é quase igual ao leite materno”
Cinthia Calsinski, enfermeira obstetra pela UNIFESP e consultora de amamentação, garante que nunca, nenhuma fórmula vai conseguir os benefícios que o leite materno traz a saúde do bebê e de sua mãe. “Os bebês crescem e se desenvolvem com ambos os leites, mas eles não são parecidos. Frases como essas acabam desencorajando as mães a amamentarem, porque na vigência de alguma dificuldade, ela pode achar que tanto faz um leite ou outro e acabar desistindo.
ORIENTAÇÃO: A fórmula não se parece com o leite materno. Porém, nas situações em que a amamentação não é possível, ela é a opção.
5 – “Se o seio tem fissuras ou rachou, esqueça a amamentação”
“As fissuras (rachaduras) na amamentação ocorrem por algumas razões: freio lingual curto, peito muito cheio e ingurgitado (bebê fica com dificuldade de se acoplar ao seio), e, principalmente, pela pega errada do bebê. Neste caso, a primeira coisa a se fazer é ajustar a pega e o posicionamento. Fazendo isso, geralmente a amamentação vai continuar sem dor para a mãe e não causará novas fissuras”, responde Glaucia Exposito, do LeME. Ela lembra ainda que a maioria das pessoas não compreende o manejo da amamentação e acredita-se que a dor faz parte do processo. A dor é hoje uma das principais causas de desmame, mas muita gente não sabe que isso pode mudar.
A amamentação não dói. Se está doendo e fissurado é porque tem algum problema e ele precisa (e pode) ser resolvido. “Como muita gente não sabe que é possível reverter quadros difíceis e dolorosos de amamentação, difundiu-se a noção de que quem tem fissuras não conseguirá amamentar. O que não é verdade. Mas sentir dor também não é certo. Então, em casos como esses, é preciso ter um acompanhamento de um especialista em amamentação para passar as orientações corretas. Apoio dos familiares e profissionais de saúde é fundamental. Proteger a amamentação é uma responsabilidade de todos”, pontua.
ORIENTAÇÃO: Caso tenha dor, rachaduras na mama ou dificuldades para amamentar, procure apoio de um profissional para desvendar o motivo dos problemas, solucioná-los e seguir com a amamentação.
6 – “Bebês precisam de chá pra dormir melhor e água pra se hidratar”
A pediatra e neonatologista da SBP explica que o leite materno tem mais de 85% de água, mesmo no clima mais quente. “A amamentação exclusiva até o 6° mês é suficiente para suprir necessidades de água do bebê e mantê- lo devidamente hidratado. No início da vida os bebês irão manter o padrão de sono que tinham na vida intrauterina, diferenciando-se pela necessidade do despertar para alimentar-se. Com o desenvolvimento, cada bebê, de modo individual, irá adaptar-se à vida fora do útero, necessitando de tempo e acolhimento dos seus cuidadores para compreender a necessária adaptação. A “ideia do uso de chás” para induzir o sono, parte do desconhecimento da fisiologia dos bebês”, esclarece.
ORIENTAÇÃO: Bebês em uso de leite materno exclusivo não necessitam de água adicional. O uso de chás, além de não ser indicado, podem ser prejudiciais.
7 – “Amamentação deixa os seios caídos e flácidos”
Ana Luiza V. da Paz Matos, da SBP, destaca que a flacidez das mamas está mais relacionada a aspectos genéticos/hereditários e a idade da mulher. Com o passar dos anos, independentemente da amamentação, as mamas, na maioria das vezes, irão evoluir para a flacidez.
ORIENTAÇÃO: A amamentação protege contra o câncer de mama e não é responsável diretamente pela flacidez das mesmas.
8 – “Seu peito é pequeno, não vai produzir leite suficiente”
Glaucia Exposito, do LeME ressalta que o tamanho da mama não interfere na produção de leite, mamas pequenas e grandes produzem leite da mesma forma. Geralmente, o que muda mais o aspecto das mamas é a quantidade de gordura de cada uma, e não a quantidade de glândulas mamárias. Podem haver, sim, casos de mamas com poucas glândulas mamárias, mas são exceções e não regra. “Essa crença existe pois as pessoas duvidam da quantidade de leite que podem produzir e têm receio de não ser o suficiente para nutrir o bebê, principalmente por não conseguir medir essa quantidade. É importante ressaltar que casos de baixa produção de leite por causa de pouco tecido mamário são raros, mas, ainda assim, a amamentação é possível. No geral, a maioria das pessoas não terá problemas com a produção de leite, independente das mamas serem pequenas ou grandes”, explica. Esse tipo de afirmação desencoraja mulheres por fazerem elas duvidarem de si mesmas e da capacidade natural que mamíferos têm de amamentar seus filhos.
ORIENTAÇÃO: O tamanho das mamas não interfere na amamentação. Mamas de todos os tamanhos e formatos podem produzir leite, amamentar e nutrir o bebê com tudo o que ele precisa.
9 – “Leite materno vira água depois de ano”
Graziela Abdalla, da Perinatal, explica que isso não existe. “Depois de um ano, leite materno continua sendo leite materno. A “matéria prima” do leite materno é o sangue, como pode virar água?”, afirma.
ORIENTAÇÃO: Isso não acontece nem em um, dois, três ou mais anos.
10- “O seu bebê não quer pegar o peito, porque prefere dormir”
Graziela Abdalla explica que, geralmente, quando o bebê assume esse comportamento, devemos atentar para vários fatores. O primeiro é o tempo de vida. Porque é comum que o bebê, após a primeira hora de vida, fique mais sonolento e descanse do parto até que, após as primeiras 24 horas de vida, ele retorne com a atividade e fique mais alerta. Depois que se passam essas primeiras 24 horas, a tendência é que o bebê fique mais alerta para a mamada. ‘Se isso não acontecer e o bebê ainda permanecer sonolento, temos que avaliar a ingestão de leite. A baixa ingestão de leite é o motivo mais comum. Então, como saber se o bebê realmente está fazendo baixa ingestão de leite? Avaliando as fraldas de xixi”, diz.
ORIENTAÇÃO: O bebê precisa fazer, no mínimo, 6 fraldas de xixi em 24 horas. É importante sempre checar as fraldas de xixi antes de cada mamada. Se for identificada a baixa ingestão, o processo de amamentação precisa ser observado. Agora, se as eliminações do bebê estiverem com uma grande quantidade e o bebê, ainda sim, estiver sonolento nas mamadas, temos que acordá-lo. Uma boa alternativa é retirar um pouco da roupinha.
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*PRISCILA CORREIA é jornalista, especializada no segmento materno-infantil. Entusiasta do empreendedorismo materno e da parentalidade positiva, é criadora do Aventuras Maternas, com conteúdo sobre educação infantil, responsabilidade social, saúde na infância, entre outros temas. Instagram:@aventurasmaternas