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Como blindar seus filhos adolescentes com autoconfiança?

Especialistas dão dicas de como fortalecer a relação com os filhos na adolescência para que eles sejam autônomos e se sintam seguros

Priscila Correia, colunista de AnaMaria Digital Publicado em 31/08/2024, às 09h01

Blindar nossos adolescentes pode parecer uma missão quase impossível, considerando o turbilhão de influências que eles enfrentam diariamente. Mesmo com uma educação sólida e uma criação cuidadosa desde a infância, ao entrarem na adolescência, nossos filhos começam a viver sob a forte influência do círculo social. 

A busca por aceitação, a pressão dos amigos, e a necessidade de se encaixar podem torná-los mais vulneráveis a comportamentos de risco, ao bullying e a situações complicadas. E em um momento de vida onde o social se torna o centro das atenções, é preciso mais do que nunca encontrar maneiras de protegê-los, sem sufocar sua autonomia, mas garantindo que saibam lidar com os desafios e perigos dessa fase.

A fragilidade desse momento não é sentida apenas pelo adolescente. Os pais, ao presenciarem seus filhos passando por situações de rejeição e/ou rebeldia, muitas vezes ficam receosos sobre como agir. Foi o que aconteceu na casa de Luana*, mãe de Pedro*, de 13 anos. Com um filho que tinha uma maturidade acima da média para a idade, ela viu o menino passar por situações de extremo desconforto na escola. “Ele tinha poucos, mas bons amigos quando era menor. Porém, quando estava com quase 10 anos, esses meninos começaram a atacá-lo, não apenas emocionalmente, mas fisicamente. Na época, a escola nada fez e pensei em tirá-lo de lá, mas ele quis continuar. Hoje, quase 4 anos depois, ele fez algumas amizades, mas segue recebendo um tratamento intolerante da maioria da turma. Como mãe, sinto uma vontade enorme de ir até os pais dessas crianças e perguntar qual é o problema com o meu filho, mas sei que isso acabaria isolando ele ainda mais”, conta. “Hoje, apesar de ficar chateado, ele entende que a culpa não é dele. Mas meu receio é que esse tipo de rejeição afeite sua autoestima e capacidade de confiar nos amigos no futuro”, complementa.

E para falar um pouco mais sobre o assunto e como podemos elevar a autoestima dos nossos filhos, conversamos com especialistas para a matperia de hoje.

Presente pode afetar o futuro

Cada pessoa tem uma história, nós sabemos. E a forma como cada um vai lidar com traumas é bastante individual e não temos como adivinhar o futuro. Entretanto, quando se trata dos nossos filhos, é impossível não querer blinda-los.

Mas como o bullying e outras violências verbais e físicas podem afetar um adolescente? Mariana Saloio, psicóloga infantil do Instituto Suassuna, explica que as consequências da exposição do adolescente ao bullying são graves e podem levar a quadros de adoecimento maior. “Comumente ocasionam desmotivação, insegurança, ansiedade e baixa autoestima”, diz. Já o psicólogo Alexander Bez pontua, ainda, que, psicologicamente falando, o bullying afeta integralmente a pessoa, rasgando o trato emocional e destruindo a esfera sentimental. “Muitos autores americanos já consideram o bullying como uma prática assassina, pelo risco iminente de suicídio. A partir das violências praticadas, a vítima estando com o psicológico vulnerável, terá sua vida afetada, e assim ela começa a exibir sintomas severos, como transtornos de ansiedade e transtornos depressivos. Também pode acontecer transtornos alimentares, insônia, e mais futuramente transtornos sexuais, se estendendo ao longo da vida. Além da abstenção escolar, piorando o quadro depressivo, pelo fato da criança ou adolescente recorrer ao isolamento social”, comenta.

Outra situação bastante “comum” nas escolas é quando adolescentes sofrem influências negativas de colegas que têm atitudes não positivas. Sobre isso, especificamente, Alexandre alerta: as influências negativas funcionam na mente como uma praga; como se fosse uma espécie de ‘vício’, mas comportamental. “Essas situações se dão pela necessidade de proteção e de se sentir acolhido, psicanaliticamente explicando. Elas tem a função de preencher lacunas e fraquezas individuais, mas que mesmo sendo inconvenientes, têm uma funcionalidade absurda, fazendo até mesmo a pessoa agir, pelo aspecto de proteção, antagonicamente à sua própria natureza, criando uma plataforma de conduta não condizente com a sua personalidade. A vida dessa pessoa também será afetada, porque ela vai vivendo uma ilusão e quando se der conta, poderá ter sintomas desagradáveis e uma carga emocional muito negativa”, esclarece. Mariana lembra um porto importante. Isso acontece porque a própria condição da adolescência já faz com que os jovens necessitem pertencer a um grupo. “O problema se dá quando o grupo pelo qual o sujeito deseja pertencer é um grupo disfuncional. Ao ser influenciado pelos colegas a praticar atitudes não positivas pode indicar que este jovem não tenha uma base familiar bem definida e esteja apostando suas necessidades de inserção e com isso ocasionar consequências prejudiciais a vida deste sujeito, como uso de álcool e outras substâncias para amenizar o problema.

Mas embora seja, de alguma forma, tentador para o adolescente participar desses grupinhos disfuncionais, os pais podem ajudar os filhos a não participar dessas “rodinhas”. Luana, por exemplo, sempre fez questão de mostrar para o filho que ele não precisava agir de forma contrária ao que quer so para participar de grupos. “Sempre fiz questão de falar sobre suas qualidades, pois sei como algo que acontece na infância pode nunca ser esquecido. Então, elevo sua autoestima para que saiba que ele não está errado. E digo também que embora pareça uma eternidade quando os colegas ficam no pé dele, esse período escolar vai passar rápido e logo ele estará na faculdade, onde as pessoas normalmente são mais maduras e os grupos se formam mais naturalmente. Isso aconteceu comigo, inclusive. Eu sempre fui a CDF da turma. E embora não sofresse o que meu filho sofre, nunca fiz muitas amizades. Quando entrei na faculdade, foi libertador. Me aproximei de fato da minha ‘tribo’ e nunca mais encontrei aquelas pessoas da escola”, lembra.

Além dos pais incentivando e elevando a autoestima dos filhos, a escola também tem papel fundamental nesse processo. Para o adolescente que não quer entrar nesses grupinhos disfuncionais, mas que sofrem o assédio dos colegas para tal, vale procurar um professor ou funcionário da escola com o qual ele tenha confiança. “As crianças sabem identificar o grupo nocivo em sala, mas as vezes, por medo ou vergonha, preferem fazer de conta que não veem ou não sabem para não correr o risco de sofrer a violência também. Uma ideia bastante discutida hoje em dia é de alunos mais novos terem professores ou alunos mais velhos como mentores dos grupos, como forma de inibir a prática desse tipo de abuso em sala ou até mesmo no mundo virtual”, analisa Mariana. Para Bez, em primeiro lugar, tem que ter muita personalidade para não adentrar nessas rodas incongruentes. “A questão é que ao não entrar, a pessoa fica desolada e não enturmada, sendo a maior problemática. Manter o equilíbrio emocional é importante para não se enquadrar nessas rodas, como também em casos mais graves, mudar de turma, para que a pessoa que não entrou não se torne a nova vítima”, avalia.

Enfrentamento pode estar na autoconfiança 

Como diz Mariana abaixo, “uma criança que se sente amada, segura, com certeza irá desenvolver uma boa autoestima e possivelmente irá conseguir lidar com essas situações”. 

E para ajudar os pais nesse “processo” de elevar a segurança dos filhos (ainda que não estejam passando por problemas com os colegas), pedimos aos especialistas que falassem um pouco mais sobre ações que podem ajudar nessa tarefa.

Fortaleça a autoestima:

Alexander Bez – A autoestima é essencial para se manter íntegro e mentalmente saudável, pode ajudar a pessoa a não aderir a ser aquilo que não é, e caso se sinta excluída, ainda assim fique confortável.

Mariana Saloio - Sim, uma criança que se sente amada, segura com certeza irá desenvolver uma boa autoestima e possivelmente irá conseguir lidar com essas situações.

Estabeleça uma comunicação aberta:

Alexander Bez – Fundamental. Um adolescente que fala abertamente e tem apoio dos pais tende a ter o psicológico muito mais fortificado. Falar abertamente indica caráter, principalmente quando envolve se abster de bullyings.  

Mariana Saloio - O dialogo tem que ser constante na rotina da família, não aquelas perguntas formais de ida ou volta da escola… mas um canal aberto para que ela possa se expressar sem medo de punição ou julgamento sempre que tiver uma oportunidade.

Eduque sobre o uso consciente das redes sociais:

Alexander Bez – As redes sociais, quando usadas negativamente, têm um papel crucial no impulso a atitudes negativas, como o próprio bullying e a depressão. Colocar essas questões em pauta com os filhos, preservando a própria vida deles e a vida alheia, é fundamental.

Mariana Saloio - Com certeza esse é o maior problema da nossa sociedade, estamos vivendo em uma realidade que os adolescentes passam 16h por dia em rede social, se os pais não controlarem e não acompanharem de perto o que está acontecendo perderemos os filhos debaixo do nariz. Hoje em dia existem muitos aplicativos que rastreiam o uso dos smartphones. 

Encoraje o pensamento crítico:

Alexander Bez – O pensamento crítico é uma capacidade cognitiva que envolve analisar, interpretar e avaliar as informações de forma reflexiva e cuidadosa, e com certeza é um hábito muito importante.

Mariana Saloio - Além de encorajar o pensamento crítico, devemos dar condições de debate para estes jovens, expor situações que acontecem com pessoas próximas para que eles possam desenvolver sua própria linha de raciocínio a partir do certo e errado.

Promova a empatia:

Alexander Bez – A empatia é outro hábito crucial, ela também incentiva a diversidade e é fundamental, principalmente no Séc. XXI. 

Mariana Saloio - Sem empatia não somos nada, mostre para seus filhos como eles são privilegiados, ensine-os a praticar o bem, o desapego, solidariedade. É isso só se ensina fazendo, tenha o hábito de fazer sempre para que seu filho veja e incorpore como uma filosofia de vida, praticar a empatia sempre. 

Desenvolva habilidades de resolução de conflitos:

Alexander Bez – Tais como, ser solícito, praticar a humanidade, pontuar com confiança e conhecimento, justamente para dissolver intrigas e preconceitos banais.

Mariana Saloio - Deixe que seu filho resolva os problemas dele, dê autonomia, ajude-o a pensar, ter estratégias mas não faça por ele… as crianças não podem ser poupadas de fazer o que já tem capacidade para ser feito. Brigou com colega- vá e resolva- não fez a tarefa por motivo torpe- assuma para sua professora que foi orientado a fazer e mesmo assim não o fez. Precisamos parar de poupar as crianças de crescer. 

Envolva-se na vida escolar:

Alexander Bez – Além de se envolver, deixe sempre claro que a vida escolar é heterogênea, tendo várias culturas diferentes convivendo juntas, e é justamente desse convívio que precisamos, para se ter um ambiente saudável. Entendendo que ninguém é melhor do que ninguém e o respeito ao outro é primordial.

Mariana Saloio - Precisamos estar atentos a vida escolar dos nossos filhos, assim como controlamos o cartão de vacina e as contas do mês, os pais precisam estar presentes na vida escolar pois escola não educa, escola ensina. A escola é um suporte na educação social dos nossos jovens, porém a base vem de casa. 

Encoraje a busca por ajuda:

Alexander Bez – Dar apoio e conselhos, e incentivar a buscar por auxílio pedagógico, psicológico e familiar. 

Mariana Saloio - Que seu filho possa confiar em você ao ponto de pedir ajuda, para ele ou para um colega. Que o ambiente familiar seja um lugar de acolhimento para as mais diversas situações que possam acontecer no desenvolvimento dos nossos filhos. 

Ensine sobre limites pessoais:

Alexander Bez – Importantíssimo, assim como o limite pessoal pode começar com o respeito ao próximo, gerando assim respeito mútuo. Esse é o espaço a ser seguido e considerado.

Mariana Saloio - Desde pequeninos, as crianças precisam saber sobre limites pessoais, tanto corporais como sociais. Não podemos deixar para ensinar quando a situação desfavorável acontecer, precisamos agir preventivamente. 

Crie um ambiente familiar de apoio e respeito:

Alexander Bez – Isso é o princípio de uma sociedade saudável. Inclusão e respeito a quaisquer adversidades, casa sem violência, boa comunicação, mente saudável e bom convívio.

Mariana Saloio - Sabemos hoje que o maior tesouro das nossas vidas chama-se saúde mental, se buscarmos criar um ambiente familiar seguro e de respeito nossas crianças saberão que podem recorrer ao seu lar de apoio sempre que precisarem.

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