As primeiras horas após o incêndio em Hong Kong revelaram um cenário de desespero e impotência. Moradores tentavam entender como as chamas tomaram, tão rapidamente, sete dos oito blocos do conjunto Wang Fuk Court, no distrito de Tai Po. Embora as autoridades tenham mobilizado mais de 800 bombeiros, o fogo avançou de forma inesperada, deixando ao menos 55 mortos e mais de 270 desaparecidos.
Logo nos primeiros relatos, moradores afirmaram que, há meses, viam irregularidades nas reformas externas. As janelas permaneciam lacradas, e alguns alarmes de incêndio estavam desligados — um risco que, segundo eles, nunca deveria ter sido ignorado. Além disso, bitucas de cigarro apareciam perto das janelas, levantando suspeitas sobre o descuido de operários.
Andaimes de bambu e segurança do complexo
O professor Jiang Liming, especialista em segurança contra incêndio, explicou à BBC que a presença de andaimes de bambu conectando os prédios funcionou como um corredor de chamas. Esse tipo de estrutura, ainda icônica em Hong Kong, sofre críticas há anos. Apesar disso, seu uso permanece comum, especialmente em reformas de grande porte.
Ainda em 2024, autoridades anunciaram planos para substituir o bambu por aço — um material mais resistente ao calor e ao tempo. Contudo, a mudança avança lentamente, e o conjunto habitacional atingido, construído na década de 1980, permanecia com materiais ultrapassados. Segundo Jiang, janelas com vidro simples facilitaram a entrada das chamas, permitindo que o fogo se espalhasse agressivamente.
Além disso, as equipes de resgate encontraram placas de isopor nas janelas, conhecidas pela alta inflamabilidade. Em entrevista à Initium Media, um engenheiro afirmou que redes de proteção usadas nas obras raramente são retardantes de chamas — um alerta ignorado no Wang Fuk Court.

Moradores idosos e vulneráveis enfrentam os maiores riscos
Quase 40% dos mais de 4,6 mil moradores têm 65 anos ou mais, segundo o censo de 2021. Muitas dessas pessoas vivem no conjunto desde sua construção e dependem de acessos seguros para escapar em situações de emergência. Entretanto, as obras em andamento bloquearam passagens usadas para evacuação.
Segundo relatos enviados a grupos de mensagens da comunidade, familiares buscavam desesperadamente por notícias de idosos impossibilitados de deixar seus apartamentos. Alguns, inclusive, dormiam enquanto o fogo se aproximava, sem ouvir alarmes — que estavam desligados devido às reformas.
Essa vulnerabilidade ampliou o número de vítimas e reforça a necessidade de políticas públicas específicas para grandes conjuntos residenciais onde a população idosa é predominante.
Quando tudo poderia ter sido evitado: a tragédia por trás das obras irregulares
À medida que as investigações avançam, a narrativa ganha contornos ainda mais preocupantes. Três executivos da construtora responsável pelas obras foram presos sob suspeita de homicídio culposo. Autoridades afirmam que materiais inflamáveis — como lonas plásticas e telas inadequadas — facilitaram a propagação das chamas.
O chefe do Executivo local, John Lee, determinou inspeções em todos os conjuntos em obras de grande porte. A prioridade, segundo ele, envolve revisar andaimes, materiais usados e os procedimentos de segurança adotados pelas empresas.
Para especialistas e moradores, o incêndio era evitável. A combinação de obras mal planejadas, alarmes desligados, materiais inflamáveis, janelas lacradas e falta de fiscalização criou um cenário explosivo — e, infelizmente, previsível.
Resumo: A tragédia em Hong Kong expôs falhas graves de segurança em um conjunto habitacional antigo. Andaimes de bambu, materiais inflamáveis e reformas mal conduzidas aceleraram a propagação das chamas. Moradores idosos foram especialmente afetados, e especialistas afirmam que o incêndio poderia ter sido evitado.
Leia também:
Advogada que salvou família de incêndio teve 60% do corpo queimado








