A história costuma começar com uma ardência depois do café da tarde, um enjoo sem explicação no fim do dia, aquela sensação de estômago “raspando” quando o intervalo entre as refeições alonga demais. Parece passageiro, mas volta. E volta de novo. Quando esse ciclo se repete, o problema pode estar em uma estrutura que deveria proteger o órgão da própria acidez: a mucosa gástrica. É aí que entra a gastrite.
Levantamentos citados pela Federação Brasileira de Gastroenterologia estimam que cerca de 7 em cada 10 brasileiros convivem com algum tipo de gastrite. Entre 2019 e 2023, foram mais de 59 milhões de internações por gastrite e duodenite no país, com maior concentração nas regiões Sudeste e Nordeste, segundo dados publicados no Jornal Brasileiro de Implantologia e Ciências da Saúde.
O que acontece no estômago de quem tem gastrite?
A gastrite é a inflamação da mucosa que reveste o estômago, barreira responsável por suportar a acidez necessária à digestão. “Quando essa proteção é agredida seja por infecção, medicamentos ou hábitos nocivos o estômago se torna vulnerável e inflama”, explica a gastroenterologista e hepatologista Patrícia Almeida, doutoranda pela USP. A causa mais frequente é a bactéria Helicobacter pylori, mas o quadro também se relaciona ao uso de anti-inflamatórios, álcool, tabagismo e estresse.
Dor ou queimação na “boca do estômago”, sensação de inchaço após porções pequenas, náusea, arroto excessivo, piora em jejum ou após bebidas alcoólicas e melhora temporária ao comer são sinais clássicos. Em situações de alerta, como vômitos com sangue, fezes escuras, perda de peso sem motivo, dor intensa, a avaliação médica deve ser imediata.
Mitos e verdades que atrapalham o tratamento
Para organizar o que realmente importa no dia a dia, reunimos os pontos que mais geram dúvida – com o que a ciência sabe até aqui.
Estresse é “o” responsável
Mito. O estresse piora sintomas e pode facilitar a inflamação, mas raramente age sozinho. Infecção por H. pylori, medicamentos (anti-inflamatórios), álcool, tabagismo e padrão alimentar têm papel central.
Café está proibido para quem tem gastrite
Mito. A tolerância é individual. Há pessoas que pioram com café, outras não. Teste supervisionado pelo médico e ajuste de dose/horário ajudam a decidir.
Leite alivia a dor
Mito. O alívio é curto. Em seguida, o leite estimula a produção ácida e pode agravar a sensação de queimação.
Antiácidos “resolvem”
Mito. Atuam no sintoma, não na causa. “A automedicação é perigosa, pois pode mascarar doenças mais graves e atrasar o diagnóstico”, alerta a médica.
H. pylori é protagonista
Verdade. A infecção é comum e, sem tratamento, sustenta inflamação crônica, aumenta o risco de úlceras e, em alguns casos, de câncer gástrico.
Anti-inflamatório por longos períodos faz mal ao estômago
Verdade. O uso prolongado e sem orientação reduz a proteção da mucosa, facilitando lesões e sangramentos.

Ultraprocessados e álcool pioram a dor
Verdade. “Esses alimentos são altamente irritantes para o estômago. Prefira refeições leves, naturais e com horários regulares, evitando longos períodos em jejum”, recomenda a especialista.
O que o tratamento costuma envolver
A conduta depende da causa: erradicação do H. pylori quando presente, ajuste de remédios que agridem o estômago, inibidores de ácido por tempo definido e, principalmente, rotina alimentar adequada (fracionar refeições, reduzir álcool e ultraprocessados, não fumar). Em consulta, o médico avalia a necessidade de endoscopia e define duração do tratamento.
Dá para reverter?
Em muitos cenários, sim, especialmente quando o diagnóstico vem cedo e a causa é tratada. “Mais do que tomar remédios, é fundamental adotar hábitos saudáveis e buscar orientação médica. O tratamento certo devolve qualidade de vida e previne complicações”, reforça Patrícia Almeida.
Resumo:
Queimação recorrente pode indicar inflamação da mucosa do estômago. No Brasil, a gastrite atinge grande parcela da população e, sem cuidado, abre caminho para úlcera e até câncer. Identificar a causa (H. pylori, remédios, álcool), evitar automedicação e ajustar hábitos acelera a recuperação e reduz o risco de complicações.
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