Por Renan Pereira e Lígia Menezes
No remake de Vale Tudo, Belize Pombal interpreta Consuêlo, uma mulher exigente e mãe amorosa. Para dar vida a ela, a atriz mergulhou em questões delicadas narradas por outras mulheres até mesmo em filas de mercado, como o desgaste emocional nos relacionamentos de longa data.
“Percebi que os desafios afetivos entre Consuêlo e Jarbas ‘conversaram’ com muitas mulheres, que vêm também enfrentando problemas no relacionamento. E eu acho importante que a gente se conheça, saiba quais são os nossos limites, que a gente saiba o que é inegociável para a gente”, conta ela, que prestes a fazer 40 anos, passou a investir em processos de autoconhecimento, em busca de “plenitude” na vida.
Como Consuêlo, de Vale Tudo, você traz uma mãe muito amorosa, mas também muito rigorosa. Quais foram suas referências para construir esta figura materna?
São referências diversas e, para além das minhas próprias referências, tem o que o texto traz como base e como desenho da personagem também. Foi uma construção feita em camadas.
A sua personagem tem um aspecto especial: a amizade com Aldeíde (Karine Telles). Como são os bastidores com a Karine, a amizade e a troca de você?
Eu e a Karine nos conhecemos nesse projeto, e estamos trabalhando juntas pela primeira vez. É interessante também vivenciar personagens que têm diferenças, mas que conseguem dialogar bem a partir dessas diferenças. Na verdade, têm vários colegas que eu estou conhecendo agora, e que estão me conhecendo agora também, e essa profissão tem muito disso, né? A gente vai tendo encontros e oportunidades de conhecer pessoas diversas ao longo da trajetória.
Muito se fala sobre representatividade no audiovisual brasileiro. Como você avalia o significado de dar vida a uma mulher negra em uma família unida, afetuosa e bem-resolvida financeiramente, que foge aos estereótipos?
É muito significativo! Até porque o audiovisual realizado na TV aberta é forte e importante no nosso país e participa, inclusive, da reformulação de dinâmicas sociais. Sou muito feliz pela nossa família pretinha, humana e amorosa de ‘Vale Tudo’.
Quais características pessoais você empresta para a Consuêlo?
A vida da Consuelo é bem diferente da minha. Eu percebo que, nessa Vale Tudo de 2025, o fato de ser uma mulher negra retinta, que superou obstáculos socioeconômicos na vida, conseguiu alcançar avanços e posições interessantes profissionalmente, mesmo com as falhas humanas que todos nós temos, conversa comigo e com várias outras pessoas que assistem também, e isso é muito bom!’
A personagem enfrenta um momento no qual a vida sexual e o casamento estão estagnados. Muitas mulheres, depois de anos de casada, passam por esse momento. O que você descobriu em suas pesquisas para a personagem sobre este tema?
Fui descobrindo mais depois, com a devolutiva das pessoas, sobre algo que eu já percebia: observei grande insatisfação nas relações. Acho que a gente está num momento um pouco delicado para os relacionamentos a dois, relacionamentos românticos e afetivos sexuais. Para quem está casado, para quem está namorando, para quem quer casar, para quem quer namorar…
Percebi que os desafios afetivos entre Consuêlo e Jarbas “conversaram” com muitas mulheres, que vêm também enfrentando desafios nos relacionamentos. E eu acho importante que a gente se conheça, saiba quais são os nossos limites, que a gente saiba o que é inegociável para a gente, o que dá para flexibilizar, que a gente faça terapia, invista em processos que nutram essa relação com a gente mesma e de maior autoconhecimento.
Isso vai favorecer todas as áreas da vida e, com certeza, os relacionamentos românticos também. Mas é importantíssimo salientar que eu também estou aprendendo, que estamos todos aprendendo, dentro das possibilidades de cada um.
Além disso, pode nos falar sobre sua rotina? Para manter o bem-estar e dar conta de gravar a novela?
Quando eu estou em um projeto, eu fico muito, muito voltada ao trabalho. E por muitos colegas falarem sobre quão intensa é essa experiência, eu fiquei atenta logo no começo, me observando, entendendo como eu estava e reavaliando alguns cuidados comigo, com a minha saúde.
Sou uma mulher perto dos 40 anos, então, comecei a reavaliar o funcionamento do meu corpo hormonalmente, fui fazer exames, me cuidar para dar conta de viver em maior plenitude, não só no trabalho, mas na vida como um todo.
Tenho achado cada vez mais importante esse tema do cuidado da mulher com o próprio corpo, não só na questão estética, que também importa, mas sobre fazer o que nos faz bem. E tudo isso demanda energia, você tem que estar bem de saúde, inclusive mental e emocionalmente.
Você estava no Canadá quando passou no teste para “Justiça”, na Globo. Pode nos contar o que te encorajou a voltar?
Poxa, um projeto incrível, uma personagem incrível. Uma das protagonistas dessa série maravilhosa com uma história superpotente, com direção maravilhosa, com uma autora incrível, em uma emissora que tem muita força e muita importância, não só no nosso país! Vários motivos interessantes… acho que foi a hora, tudo se encaixou e fiquei muito feliz pelo motivo que me trouxe de volta. E muito grata também.
Você disse que falou com muitas mulheres, que são mães solos, para interpretar sua personagem em “Justiça”. O que descobriu nelas?
As mulheres que eu falei, que são mães solo, são mulheres que participaram ou participam da minha vida, mulheres próximas, amigas, parentes, familiares. Também ouvi mulheres em uma fila, no mercado, alguém que falou alguma coisa e escutei de fora… enfim, momentos em que você acaba tendo contato com as histórias das pessoas e compartilhando um pouco da sua história também.
Eu descobri algumas coisas, mas eu acho que o que me choca é essa normalização da dinâmica em que a mãe sempre tem um jeito, a mãe sempre dá um jeito, de arranjar o dinheiro pro remédio do filho, pro uniforme, pro material escolar, pra comida, pra escola, pro médico, a mãe sempre dá um jeito… e infelizmente a gente ainda tem um espaço de liberdade na nossa sociedade para o pai dizer que “esse mês não deu”. Isso me impressiona.
É de doer, é triste, e precisa mudar urgentemente. Se muitas mães sempre “dão um jeito” para a manutenção das necessidades dos filhos, não faz sentido que os pais não façam isso também.”
A matéria acima foi produzida para a revista AnaMaria Digital (edição 1483, de 22 de agosto de 2025). Se interessou? Baixe agora mesmo seu exemplar da Revista AnaMaria nas bancas digitais: Bancah, Bebanca, Bookplay, Claro Banca, Clube de Revistas, GoRead, Hube, Oi Revistas, Revistarias, Ubook, UOL Leia+, além da Loja Kindle, da Amazon. Estamos também em bancas internacionais, como Magzter e PressReader.
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