A juíza Angélica Chamon Layoun foi demitida do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) após a conclusão de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) que apontou a repetição de decisões judiciais em mais de dois mil processos.
De acordo com o relatório final, a magistrada teria copiado sentenças idênticas em ações cíveis para acelerar sua produtividade, além de ter desarquivado processos para assinar sentenças em seu nome.
A penalidade foi aplicada enquanto a juíza ainda estava em estágio probatório, o que permitiu sua exoneração sem a necessidade de processo judicial. Ela havia sido aprovada em concurso do TJ-RS e estava lotada em uma vara cível que, segundo sua defesa, acumulava processos há anos por falta de titular.
Em resposta à decisão do Tribunal, a defesa da magistrada ajuizou um Pedido de Revisão Disciplinar junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), alegando que a demissão foi desproporcional e que o processo teria vícios de instrução. O caso agora corre sob sigilo no órgão federal.
Entre os argumentos apresentados, os advogados de Angélica afirmam que ela enfrentou resistência interna e discriminação velada, por ser mulher, mãe de uma criança com autismo e vinda de outro estado. Ela começou a carreira na magistratura em Pernambuco, onde atuou por quase seis anos antes de se mudar para o Rio Grande do Sul.
Confira a nota da defesa na íntegra:
“A defesa manifesta profundo respeito pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, mas discorda veementemente da penalidade imposta à magistrada Angélica Chamon Layoun, por considerá-la desproporcional, juridicamente viciada e carente de prova de dolo ou má-fé, elementos indispensáveis à configuração de falta funcional gravíssima.
Esclarecemos que não cabe recurso interno no âmbito do TJRS. Por essa razão, foi ajuizado Pedido de Revisão Disciplinar no CNJ, onde se discute a proporcionalidade da sanção e vícios de instrução do processo disciplinar.
Por se tratar de processo que tramita sob sigilo, não é possível comentar o conteúdo integral dos autos ou os argumentos apresentados na petição de revisão disciplinar.
Ressalvado esse limite, cumpre esclarecer que a magistrada foi designada para uma vara cível que estava há anos sem juiz titular, com grande passivo processual e uma cultura de autogestão consolidada, sem rotinas estruturadas. Nesse cenário, buscou corrigir falhas operacionais, reordenar o fluxo processual e promover melhorias administrativas, enfrentando resistências internas que acabaram servindo de catalisador para o processo disciplinar.
Além dos desafios próprios de uma unidade desorganizada, a juíza enfrentou dificuldades adicionais decorrentes de discriminação velada, por ser oriunda de outro estado, mulher e mãe de uma criança de três anos à época, diagnosticada com transtorno do espectro autista (TEA).
A conciliação entre os deveres funcionais e o cuidado com uma criança com necessidades especiais representa um desafio adicional que qualquer mãe magistrada pode compreender.
Eventuais equívocos ou falhas operacionais, naturais em estágio probatório e agravados pelas dificuldades de adaptação a sistemas digitais complexos, não podem justificar o rigor da medida disciplinar aplicada.
A Corregedoria-Geral de Justiça deveria ter priorizado medidas pedagógicas e de orientação, e não punições de natureza extrema, especialmente quando não há má-fé, dano às partes ou violação da moralidade.
Este caso suscita reflexões importantes sobre como a magistratura lida com as especificidades enfrentadas por mulheres magistradas, especialmente aquelas que exercem a maternidade simultaneamente à função jurisdicional.
A situação vivenciada pela magistrada Angélica poderia ocorrer com qualquer mulher que enfrente os desafios da dupla jornada profissional e maternal no exercício da magistratura.
A atuação da magistrada foi pautada pela boa-fé, pelo compromisso com o serviço público e pela transparência funcional.
Confia-se que o CNJ saberá avaliar o caso com isenção e profundidade, garantindo o respeito ao devido processo legal, à proporcionalidade da sanção e às garantias da magistratura nacional.
NILSON DE OLIVEIRA RODRIGUES FILHO
OAB/RS 121.624
PEDRO HENRIQUE FERREIRA LEITE
OAB/PR 60.781
ADVOGADOS DA MAGISTRADA ANGÉLICA CHAMON LAYOUN
MEDINA OSÓRIO ADVOGADOS”