Menstruar não deveria ser um empecilho para seguir a rotina. Ainda assim, quem passa por dores intensas nesse período frequentemente precisa escolher entre cuidar do próprio corpo ou cumprir o expediente. É nesse contexto que surge a proposta da licença menstrual, um tema que tem ganhado espaço nas discussões sobre saúde e equidade de gênero no trabalho.
Apesar de gerar opiniões divididas, a proposta busca garantir dignidade a quem enfrenta desconfortos graves durante o ciclo. Mas será que o Brasil está pronto para esse passo? E como o assunto tem sido tratado em outros países?
O que é a licença menstrual e por que ela é importante
A licença menstrual consiste na possibilidade de se ausentar do trabalho por até três dias ao mês, com remuneração, quando há sintomas incapacitantes causados pelo ciclo menstrual. Embora a proposta ainda não tenha respaldo federal no Brasil, alguns estados e empresas já começaram a adotar medidas nesse sentido.
O termo pode parecer novo por aqui, mas surgiu no Japão, em 1947, como “licença fisiológica”. A origem da lei está ligada a reivindicações de trabalhadoras da década de 1920, que não tinham sequer acesso a banheiros durante o expediente. O desconforto físico e emocional de menstruar em ambientes despreparados motivou a luta por esse direito.
No entanto, é importante destacar que essa não é uma folga qualquer. A dismenorreia – nome técnico das dores menstruais – pode causar muito mais do que cólicas. Enjoo, cefaleia, cansaço excessivo, vômito e até diarreia são sintomas relatados por quem passa por esse processo mês após mês.
O avanço do direito de menstruar no Brasil
Ainda que o país não tenha uma legislação nacional sobre o tema, projetos de lei tramitam em diversas regiões. Em Santo André (SP), por exemplo, a Câmara aprovou uma proposta que prevê até três dias de afastamento por mês para servidoras públicas.
No Distrito Federal, o Projeto de Lei Complementar nº 12/2023 também busca garantir esse mesmo direito para quem sofre com sintomas graves. O Pará segue caminho semelhante, com proposta da deputada Lívia Duarte. E no Mato Grosso do Sul, a empresa Digix adotou a prática por conta própria: colaboradoras podem se ausentar sem atestado médico.
Em São Paulo, o Grupo Mol aderiu à iniciativa, permitindo até dois dias de afastamento por mês sem desconto salarial. Além disso, tramita na Câmara dos Deputados o PL 1249/22, que propõe incluir a licença menstrual na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), reforçando o reconhecimento do direito de menstruar em âmbito federal.
Como o mundo tem tratado o direito de menstruar
Diversos países já têm políticas públicas nesse sentido, embora a aplicação, na prática, nem sempre seja eficaz. No Japão, mesmo com legislação vigente há mais de 70 anos, poucas mulheres solicitam o benefício, por medo de represálias ou pela falta de remuneração completa.
Na Coreia do Sul, a lei garante um dia por mês sem salário, mas nem sempre é respeitada – como demonstrou o caso de um ex-CEO que foi multado por negar o direito às funcionárias. Taiwan, Indonésia, Zâmbia e Espanha também possuem regras específicas. Esta última, inclusive, tornou-se o primeiro país da Europa a sancionar a medida como parte do sistema público de saúde.
Além disso, empresas como a Zomato (Índia), Future Super (Austrália) e Louis Design (França) oferecem dias extras de folga para suas funcionárias, reconhecendo os desafios físicos do ciclo menstrual.
Quais os impactos da licença menstrual no mercado de trabalho?
Mesmo com respaldo médico e científico – como mostra o estudo “Dismenorreia & Absenteísmo no Brasil”, da MedInsight –, o tema ainda enfrenta resistência. A pesquisa revelou que 65% das pessoas que menstruam sofrem com dores incapacitantes, e 70% relatam queda de produtividade nesse período.
Ainda assim, especialistas e sindicatos na Espanha, por exemplo, levantaram preocupações sobre possíveis estigmas e discriminação no ambiente profissional. A proposta, embora avance no debate sobre o direito de menstruar, também precisa ser acompanhada de políticas que combatam desigualdades e garantam sua aplicação de forma justa.
Resumo: A licença menstrual ainda é uma realidade distante para muitas brasileiras, mas o debate avança tanto no setor público quanto no privado. O reconhecimento do direito de menstruar é um passo importante para tornar os ambientes de trabalho mais inclusivos e saudáveis. No entanto, para que funcione de forma justa, é essencial garantir a aplicação sem prejuízos ou estigmas para quem precisa desse cuidado mensal.
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