Durante muito tempo, criou-se um mito popularizado de que cães não poderiam viver em apartamento. No entanto, é uma ideia equivocada. Ter cachorro em apartamento é aprovado não só pelos veterinários, como também é um direito assegurado em lei.
De acordo com o Art. 5º da Constituição Federal, a presença de cachorro em apartamento ou casa é permitida, contanto que não atrapalhe ou coloque em risco a vida de outros moradores. Isso significa que o veto dos condomínios aos animais domésticos, algo ainda comum, é ilegal. O morador que se sentir prejudicado pode procurar a Justiça.
Os locais também não podem proibir a presença dos pets em áreas comuns, como o elevador ou parques. Obrigar tutores a pegar seus animais no colo nestes locais ou mesmo subir de escada é passível de punição, com base no tópico de constrangimento ilegal (Art. 146 do Decreto-lei Nº 2.848/40).
Porém, vale ressaltar que os tópicos abordados contam com algumas ressalvas. Isso porque, além dos muitos direitos, os tutores que desejam ter cachorro em apartamento também têm deveres. AnaMaria esclarece algumas das principais obrigações.
O trânsito em áreas comuns ou o uso do elevador ao lado do pet só é permitido se o animal não representar um risco à saúde ou segurança dos demais. Além do mais, é necessário o uso de guia-curta, que impede a aproximação a outras pessoas.
Ainda sobre o uso de acessórios de segurança: de acordo com a lei, cães dóceis e que não representam perigo a terceiros não precisam usar focinheira. A obrigação desnecessária desrespeita a dignidade do animal e é enquadrada como crueldade e crime de maus tratos, conforme o Art. 32 da Lei Nº 9.605/98 e art. 3º, I do Decreto Nº 24.645/34.
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Como criar cachorro em apartamento?
Agora que você já sabe os direitos e deveres de quem tem cachorro em apartamento, é hora de entender o que fazer para promover o bem-estar do animal. Para isso, convidamos a médica-veterinária Marina Meireles, comportamentalista do centro veterinário Nouvet.
Inicialmente, ela explica que não há um consenso sobre um espaço ideal para que um cão tenha uma vida boa e saudável. Entretanto, é dever do tutor garantir que suas necessidades básicas, como socialização, estímulos cognitivos, passeios, etc, sejam atendidas diariamente.
E isso independe do tamanho da residência: “Muitos cães vivem soltos em quintais imensos, porém não possuem nenhuma atividade ou rotina, e vivem sob estresse crônico”. Ou seja, não há uma recomendação mínima para criar cachorro em apartamento.
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Porém, é importante bom senso na hora de escolher o amigo de quatro patas que irá te acompanhar. Raças de grande porte, como os labradores, ou os cães de guarda, como rottweiler e doberman, podem não se dar bem em um espaço reduzido.
Marina explica que não há uma definição correta das melhores raças de cachorro para apartamento. Na verdade, ela defende que tudo depende da rotina e do perfil de cada família: “Alguns tutores preferem raças que não soltam tanto pelo, como Poodle, Shih tzu, Lhasa. Outros, que vivem em espaços reduzidos, buscam raças de porte pequeno, pois não possuem espaço para caminhas e brinquedos grandes.
“No geral, raças pequenas e de pelo longo parecem ser as preferidas para os que moram em apartamentos”, ressalta.
O bem-estar do pet
Para quem tem cachorro em apartamento, é necessário compensar o espaço reduzido com outros hábitos e atividades, que buscam entreter o cachorro. Do contrário, pode gerar comportamentos destrutivos, como as investidas contra sofás, camas e outros móveis.
De acordo com a veterinária, o tédio é um dos principais responsáveis pela conduta. No entanto, ela ressalta que os tutores devem saber que destruir é um comportamento natural dos cães, especialmente em filhotes. Por isso, é importante traçar estratégias para lidar com a situação.
Uma delas, é redirecioná-lo para objetos adequados, como brinquedos ou mordedores. Além deste, há outras atitudes que tendem a ajudar os cães.
- Enriquecimento ambiental
Você já ouviu falar em enriquecimento ambiental? É importante para todos os pets, sobretudo aqueles que vivem em espaços reduzidos, como os cachorros em apartamento. A técnica consiste em um conjunto de atividades em prol do bem-estar do animal, com estímulos físicos, mentais, sociais, cognitivos, alimentares e sensoriais.
O ambiente enriquecido, com plantas, brinquedos interativos e atividades que incitem seus comportamentos naturais do cão, como forragear, cavar, roer, socializar e brincar: “O enriquecimento ambiental de qualquer animal está longe de ser um ‘plus’. É necessário para todos os animais que vivem sob os cuidados dos seres humanos”, reforça Marina.
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- Passeios
Os passeios são a forma mais comum de entretenimento para os cães. Ainda assim, há muitos tutores que negligenciam a importância da atividade ao ar livre. É por meio dela que o bichano fica mais livre para algumas necessidades, como farejar, marcar (com urina ou fezes), e explorar.
“Os cães “veem” o mundo através do faro, principalmente, então um passeio de qualidade é, no geral, aquele que permite que eles farejem” avalia a comportamentalista, acrescentando que a rotina ideal de passeios é única para cada indivíduo. Isso porque cada cão possui um nível de energia específico.
- Adestramento
O adestramento também se faz muito importante. É por meio dele que os cães aprendem os comandos básicos, como sentar, deitar, ficar e atender chamados — algo que, segundo a veterinária, todos os cães deveriam saber: “Esse aprendizado cria uma ponte entre o cão e o tutor, facilitando a comunicação e estreitando o vínculo”.
Só que o papel do adestramento vai muito além, sobretudo para cães de apartamento. É graças à técnica, que os animais domésticos aprendem a fazer as necessidades no local correto, evitando dejetos pela casa, além de treinos de dessensibilização ou habituação aos sons de interfone e vizinhos.
O adestramento também pode ajudar com os latidos dos cães, que costumam causar queixas e desentendimentos entre os vizinhos. O profissional avalia o histórico, rotina e estado emocional do cachorro, a fim de entender a causa dos latidos excessivos e, assim, auxiliar a família.
Segundo Marina, cada caso deve ser avaliado individualmente: “Pois o latido é tão somente um comportamento resultado de determinado estado emocional, seja ele euforia, alegria, estresse, ansiedade, dor, etc”.
Todas as considerações evidenciam que é possível criar cachorro em apartamento — o que pode ser uma experiência enriquecedora tanto para o animal quanto para o tutor. Isso, claro, desde que algumas precauções e práticas sejam adotadas para garantir o bem-estar do pet no ambiente.