A cantora e pastora Baby do Brasil fez uma declaração polêmica durante um culto evangélico, pedindo que vítimas de abuso sexual perdoassem seus agressores, inclusive dentro da própria família. A fala, que repercutiu nas redes sociais, levantou um debate importante sobre a revitimização e a normalização de relações abusivas.
O episódio ocorreu na última segunda-feira (10), durante um evento religioso realizado na D-Edge, uma das casas de música eletrônica mais tradicionais de São Paulo. No momento da oração, Baby do Brasil declarou: “Perdoa tudo o que tiver no seu coração nesse lugar, perdoa. Se teve abuso sexual, perdoa. Se foi na família, perdoa.”
O comentário foi recebido com críticas nas redes sociais, especialmente por minimizar a gravidade do abuso sexual e sugerir que o perdão seria uma solução para esse tipo de violência. O dono da boate e organizador do evento, Renato Ratier, afirmou ao G1 que a fala da cantora foi “infeliz” e que o combinado era que ela participasse apenas do louvor, sem realizar pregações.
Perdão e impunidade em casos de abuso sexual
Ratier tentou contextualizar a fala de Baby do Brasil, explicando que a intenção da artista poderia ter sido incentivar a libertação emocional das vítimas. No entanto, reforçou que “um abuso sexual tem que ser denunciado, e a justiça precisa ser feita. A pessoa tem que pagar criminalmente por isso.”
Essa questão levanta um ponto delicado: enquanto o perdão pode ser um processo pessoal, ele jamais pode substituir a responsabilização dos agressores. Para muitas vítimas, ouvir que deveriam “perdoar” pode parecer uma tentativa de minimizar sua dor e silenciá-las, impedindo que busquem justiça.
Relações abusivas e a cultura do silenciamento
A advogada e terapeuta Mayra Cardozo, especialista em violência de gênero, alerta que discursos como esse reforçam um ciclo de silenciamento e impunidade. Segundo ela, transferir a responsabilidade da cura para a vítima de um crime tão grave quanto o abuso sexual desestimula denúncias e normaliza a violência.
“Esse tipo de discurso não só desestimula denúncias, como também normaliza a violência, tornando-a algo a ser resolvido no âmbito privado, quando, na realidade, trata-se de uma questão estrutural e coletiva. Enquanto a narrativa do ‘perdão’ continuar sendo usada para proteger abusadores e deslegitimar a dor das vítimas, continuaremos perpetuando um sistema que favorece os opressores em detrimento dos oprimidos”, explica Mayra à AnaMaria.
A necessidade de justiça para as vítimas de abuso sexual
O problema central desse tipo de narrativa é que ela desvia o foco do essencial: garantir segurança, acolhimento e justiça para as vítimas. Como aponta Mayra Cardozo, o Estado e a sociedade precisam se comprometer com a erradicação da violência e a punição dos agressores, em vez de cobrar que as vítimas simplesmente “superem” o trauma por conta própria.
“O perdão pode ser um processo subjetivo e individual, mas ele jamais pode substituir a responsabilização dos agressores. Não há reparação sem justiça”, ressalta a especialista.
O impacto da fala de Baby do Brasil e o cancelamento do culto
Após a grande repercussão negativa, Ratier anunciou que desistiu de realizar cultos mensais na D-Edge, explicando que não tinha a intenção de gerar polêmica. “Se um dia eu quiser fazer algum culto, acho que vou procurar outro espaço para não gerar esse tipo de polêmica. Eu fiz de coração aberto, sem essa intenção”, declarou.
O caso abriu um espaço importante para refletirmos sobre como discursos religiosos e sociais podem reforçar a cultura da impunidade em casos de abuso sexual. A justiça é um direito das vítimas.
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