Quem foi criança nos anos 80 e 90, antes da chegada dos tablets e celulares, certamente passou um bom tempo do dia em frente às Tvs assistindo aos desenhos da época. Independentemente do estilo de animação, esse era um hábito comum naqueles tempos. Mas os anos 2000 chegaram e, com eles, o acesso aos gadegts, inclusive por crianças, que passaram a destinar longos períodos diários em frente às telas, assistindo programas em looping, com a facilidade do Streaming.
Como pais e responsáveis, sabemos que é preciso respeitar as recomendações sobre o tempo de tela sugerido pela Organização Mundial da Saúde (menores de 2 anos não devem ter acesso algum; entre 2 e 5 anos, no máximo uma hora por dia; e entre 6 e 10 anos até duas horas diárias). Mas se, por um lado, não entregar nas mãos dos pequenos dispositivos móveis é mais fácil, restringir o acesso à TV é, muitas vezes, inevitável. Entretanto, é possível optar por desenhos de baixo estímulo e também por aqueles que trazem valores e conteúdos interessantes para o aprendizado.
Andressa Danyi Marques, mãe de Benjamin, de três anos, conta que é bastante criteriosa em relação a tudo que o filho tem acesso – e, é claro, isso envolve os desenhos animados. “A primeira coisa que eu verifico é a classificação etária indicativa e se o conteúdo é apropriado para a idade dele. Prefiro desenhos que tenham uma mensagem educativa e que incentivem valores positivos, que têm a ver com os valores que ensinamos para ele, como a amizade, a honestidade, a cooperação, o respeito. Mas, acima de tudo, eu sempre procuro assistir aos primeiros episódios junto com Benjamin para avaliar o conteúdo, ver se há algum comportamento ou linguagem que considero inadequados. Quando percebo que há alguma mensagem que considero negativa, converso com ele e explico o que é certo e errado a partir do meu ponto de vista. Claro que, no futuro, esse desenho não será mais assistido aqui em casa, mas uma vez que a mensagem já foi vista por ele, eu procuro iniciar um diálogo explicativo e entender a mensagem que, de fato, ele assimilou”, detalha. Além de sua análise, ela também tem o hábito de verificar se o desenho é recomendado por outras mães, por educadores, até por psicólogos ou se tem boas críticas.
Já Paty Beck, mãe de Benjamim, de seis anos, e Cora, de três, explica que como os desenhos e documentários escolhidos para os filhos têm um forte componente educativo, eles aprenderam muitas coisas boas através desses conteúdos. “Por exemplo, o Ben desenvolveu um grande interesse por vulcões. Como eu nunca soube muito sobre isso, buscamos documentários sobre o assunto. Alguns desenhos também abordam informações sobre vulcões, e ele depois explica o que aprendeu para seus amigos e adultos. Eu mesma já aprendi muita coisa com ele depois dessas experiências. A Cora já tem um interesse mais artístico. Ela me pergunta sobre pintura e flores, e nós buscamos conteúdo relacionado a esses temas. Ela adora desenhar e pintar, e também gosta de aprender sobre diferentes tipos de flores e plantas”. Mas um detalhe importante: os filhos nunca tiveram o controle da TV para escolher qualquer programa que quisessem. “No entanto, já aconteceu de irem à casa de amigos e assistirem algo que eu normalmente não permitiria, e depois ficarem pedindo para assistir em casa. Quando isso acontece, sou bem aberta em explicar para eles as consequências e o motivo das nossas escolhas”, pontua.
Na coluna de hoje, vamos falar um pouco mais sobre como os desenhos podem ajudar na formação dos nossos filhos e trazer algumas dicas bacanas sobre o assunto.
Toda tela precisa ser equilibrada
Nessa “briga” entre permitir e negar o acesso às telas para nossos filhos, o equilibrio entre tempo e conteúdos permitidos talvez seja a melhor resposta. Mas antes mesmo de entender como os desenhos podem ser ótima ferramentas para ensinarmos boas lições para os pequenos, é preciso entender que, mesmo com esse “benefício”, é preciso cautela.
A pediatra Andrea Patente, que é Neonatologista e especialista em prematuros e primeira infância, explica que pesquisas recentes têm mostrado que o uso excessivo de telas pode levar à diminuição do quociente de inteligência (QI). “Isso ocorre por falta de incentivo às atividades que exijam pensamento rápido e outras habilidades que contribuem para o funcionamento do cérebro”. A psicóloga Alessandra Assis pontua, ainda, que estudos recentes têm mostrado que o uso excessivo de telas tem sido relacionado ao aumento dos problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão. “A exposição a conteúdos inadequados, o isolamento social e a falta de interações reais podem prejudicar o bem-estar emocional das crianças. O tempo excessivo pode prejudicar diversos aspectos do desenvolvimento infantil, desde o físico até o emocional e o cognitivo. É importante limitar o tempo de exposição e promover atividades offline para o bem-estar emocional dos pequenos”, comenta.
Já Graziela Campos, psicóloga e logoterapeuta, lembra que quando pensamos em crianças, pensamos em seres humanos em fase de total desenvolvimento. “Quando uma criança passa um tempo prolongado diante das telas (e esse tempo prolongado pode variar nas diversas fases da infância), corre-se o risco de a criança não ter contato com situações básicas que a ajudariam nesse desenvolver-se, como contato com a natureza, com outras pessoas, com desafios necessários do dia a dia que a levariam a uma superação dos próprios limites”, diz.
É importante lembrar, ainda, que esses malefícios não acontecem apenas por telas de celulares e tablets. “O uso de telas e TV é semelhante. Estímulos visuais e auditivos em excesso podem prejudicar a capacidade de concentração e de memória. Isso pode ser aplicado em crianças e adolescentes, que estão em fase de desenvolvimento cerebral”, detalha Andrea. Além disso, os malefícios envolvem desde alteração visual a prejuízo no desenvolvimento cerebral. “Crianças muito pequenas que são expostas a telas estão relacionadas ao atraso cognitivo, distúrbios de aprendizagem, aumento da impulsividade e diminuição das habilidades de regulação das emoções e defict de atenção. Outros estudos mostram que o uso prolongado de telas também está ligado ao aumento do quadro de miopia em crianças e adolescentes”, complementa
Exemplos animados
Desenhos animados podem ser mais que apenas diversão: é possível, sim, que os pequenos aprendam lições valiosas com eles. Mas como escolher os desenhos certos?
Para Graziela, quanto mais nova for a criança, menos estímulo é recomendável que o desenho tenha, tanto em relação a cores, sons, movimentos. “Conforme a criança for crescendo, além dessa questão dos estímulos visuais e sonoros, deve-se atentar para as mensagens que determinados desenhos passam, se são adequadas para a idade, se fazem a criança ter um senso de respeito com o outro e consigo mesma”, orienta. Ela comenta, ainda, que há desenhos com mensagens muito positivas, que ensinam algo, e que os nossos filhos podem aprender lições que realmente podem levar para a vida como ensinamentos. “Existem desenhos que falam sobre ecologia, sobre relações familiares, sobre questões raciais e de gênero. Quando bem trabalhado e pensado, as mensagens positivas passadas para as crianças podem ser muito variadas”, completa.
Para Alessandra, pais e responsáveis devem considerar a idade da criança, o conteúdo do desenho (se é educativo, positivo e adequado), a duração do tempo de tela e se odesenho (se é educativo, positivo e adequado), a duração do tempo de tela e se o desenho promove valores e comportamentos saudáveis. “Também é importante observar o tipo de estimulação. Existem alguns programas infantis que apresentam ritmoslentos na narrativa e na apresentação das imagens, mas outros tendem a ser estimulantes em excesso”, exemplifica. E continua: “Os desenhos animados fazem parte da vida de todas as crianças e, inclusive, fez parte da nossa! Aprendemos inúmeras habilidades assistido desenhos. Os desenhos animados podem transmitir mensagens positivas e ensinamentos valiosos para as crianças. Alguns exemplos incluem a importância da amizade, da honestidade, da resolução de problemas, da empatia e da perseverança, a aprender com erros. Essas lições podem ajudar as crianças a desenvolverem habilidades sociais e emocionais importantes para a vida. Alguns desenhos que recomendo são Bluey, Caillou e O Show da Luna”. Além disso, sugere, é recomendável que os pais conversem com os filhos sobre o que assistiram nos desenhos, para reforçar os ensinamentos positivos, esclarecer dúvidas e estimular a reflexão crítica. “Essa interação pode ser uma oportunidade para fortalecer o vínculo familiar e promover a compreensão das mensagens transmitidas e ajudar a avaliar se o desenho está adequado para a criança”, complementa.
Andressa conta que Benjamin já aprendeu muitas coisas boas e importantes com desenhos. “Por exemplo, ele assistiu a um que ensinava a importância de compartilhar e ser generoso com os amigos. Eu percebi que, depois de assistir, ele começou a compartilhar mais os brinquedos com o irmão mais velho, a prima e coleguinhas. Detalhe: ele ainda não vai para a escola, então, essa mudança de comportamento foi bem nítida por aqui. Outro exemplo é desenho sobre emoções, que ensina de maneira muito simples o que é frustração, raiva, tristeza e que ajudou a gente (os pais) a ensinar o Benjamin a nomear as suas emoções e sentimentos em cada situação que vive no dia a dia. E, claro, têm aqueles desenhos bem práticos que ensinam sobre o xixi, o coco, o sono, sobre o alfabeto, os números e as cores, por exemplo. Esses desenhos não só entretêm, mas também educam e reforçam valores que incentivamos no nosso dia a dia, bem como exemplificam situações da vida prática”, complementa.
Mas é preciso ficar de olho nos desenhos que parecem fofos, mas que carregam mensagens duvidosas, como, por exemplo, o Pica Pau, que sempre queria levar vantagem sobre os outros; ou outros que colocam apelidos em personagens por determinadas características etc. Para Alessandra, isso pode promover a imitação de atitudes inadequadas e normalização de comportamentos inapropriados. “Desenhos que mostram personagens tirando vantagem dos outros ou praticando bullying podem fazer com que as crianças vejam esses comportamentos como aceitáveis ou engraçados, podendo replicá-los na vida real. Podem dificultar o desenvolvimento de empatia e respeito pelo próximo, além de reforçar estereótipos prejudiciais. É importante os pais estarem atentos a essas mensagens e conversarem com os filhos sobre esses aspectos. Quando personagens são rotulados ou ridicularizados com base em características físicas ou outras particularidades, isso pode ensinar as crianças a julgar ou tratar os outros de forma preconceituosa”, enfatiza.
Na família de Paty, quando ela desaprova algum conteúdo, como desenhos que mostram agressividade ou atitudes inadequadas, ela explica para os filhos por que certos comportamentos não são aceitáveis. “Também falo sobre como a TV nem sempre representa a realidade e a importância de pensar criticamente sobre o que assistem. Quando pedem para assistir algo que eu não aprovo, explico os motivos por trás da nossa decisão e reforço os valores que consideramos importantes, como respeito, empatia e cooperação. Tento ser consistente e clara nas explicações para que eles entendam e internalizem nossos valores”, detalha.
A hora da escolha
Mas, afinal, quais critérios as mães devem usar para escolher os desenhos que seus filhos podem assistir? Para a pediatra Andrea, a escolha do desenho animado deve levar em consideração a faixa etária indicativa. “Crianças são curiosas e alguns desenhos costumam responder dúvidas e contar curiosidades sobre a natureza, o que aumenta o conhecimento”.
A seguir, alguns desenhos de baixo estímulo, que são caracterizados por oferecerem uma experiência visual e auditiva mais tranquila e menos sobrecarregada. Eles possuem um ritmo mais lento, onde as histórias se desenrolam de maneira mais pausada. As animações são simples, com visuais menos coloridos e movimentados. A trilha sonora é suave e os efeitos sonoros não são invasivos. Esses desenhos geralmente têm um conteúdo educativo, com lições simples e positivas, e as interações entre os personagens são calmas e gentis. Essas características ajudam a evitar a sobrecarga sensorial, proporcionando um ambiente mais relaxante para as crianças, especialmente aquelas que são sensíveis a estímulos intensos.
1. Zé coleta – Netflix
2. (A)mar – Netflix
3. Tayo, o Pequeno Ônibus – Netflix
4. Festa de Palavras – Netflix
5. Os Octonautas – Max
6. Pocoyo – Netflix
7. Se Você Der um Biscoito a um Rato – Prime Video
8. TOTS – Disney+
9. Pequenos Einsteins – Disney+
10. Ursinho Pooh – Disney+
11. Bluey – Disney+
Abaixo, alguns conteúdos que ensinam sobre diversidade, cultura geral, inglês, matemática, ciências, arte etc.
1. Motown Magic: Focado na música Motown, ensina sobre diversidade cultural e musical, inspirando criatividade e celebração de diferentes culturas através de canções clássicas dos Jackson five.
2. Numberblocks: Ensina conceitos matemáticos de forma divertida e visual, ajudando as crianças a entenderem números e operações básicas por meio de personagens em forma de blocos.
3. Pergunte aos StoryBots: Explora uma variedade de tópicos de cultura geral e ciência. Pequenos robôs curiosos respondem perguntas de crianças, misturando animação e live-action para tornar o aprendizado envolvente.
4. Super Why!: Enfatiza a alfabetização e o desenvolvimento de habilidades em inglês. Personagens clássicos dos contos de fadas entram em livros para resolver problemas, incentivando a leitura e a compreensão de palavras.
5. Peg + Gato: Focado em matemática, segue uma menina e seu gato enquanto resolvem problemas matemáticos em diferentes cenários, reforçando conceitos como contagem, formas e medições.
6. Sid, o Cientista: Incentiva a curiosidade científica e o pensamento crítico. Sid, uma criança curiosa, explora perguntas científicas do cotidiano, promovendo o interesse por ciências.
7. Art Attack: Ensina arte e criatividade. Apresenta projetos de arte que as crianças podem fazer em casa, estimulando a imaginação e as habilidades manuais.
8. Doutora Brinquedos: Focado na diversidade e na importância do cuidado e da empatia. Acompanha uma menina que conserta brinquedos, ensinando sobre saúde e inclusão.
9. Dora, a Aventureira: Promove o aprendizado de inglês e espanhol, além de explorar diferentes culturas. Dora, uma menina aventureira, embarca em missões, incentivando a resolução de problemas e o conhecimento cultural.
Em termos práticos, quanto tempo de tela uma criança pode ter diariamente? Abaixo, Andrea Patente responde:
– Menores de 2 anos não devem ser expostos a celulares/ Tablets e TV Essas orientações também se referem ao uso de videogames;
– Crianças de 2 a 5 anos devem ser expostos a no máximo 1 hora de tela por dia. (celular/ TV/tablets);
– Crianças entre 6 a 10 anos pode aumentar o tempo para 2 horas por dia;
– Maiores de 10 anos esse tempo pode chegar a 3 horas, preferencialmente acompanhado de um adulto.
Abaixo, Paty Beck dá algumas dicas para escolher desenhos para os pequenos.
1. Baixa estimulação: Procuro desenhos que sejam de baixa estimulação, ou seja, que tenham um ritmo mais lento, cores menos vibrantes, sem muitos efeitos especiais e com vozes naturais. Isso ajuda a evitar a sobrecarga sensorial e a manter a calma;
2. Conteúdo educativo: Prefiro desenhos que tenham um componente educativo, especialmente aqueles que abordam temas relacionados à natureza, ciências, artes e habilidades sociais. Nos assuntos de interesse também buscamos documentários. E a interação deles vendo esse tipo de conteúdo é cheio de perguntas e interesses que levam pro dia a dia;
3. Temas positivos: Escolho programas que promovem valores positivos, como amizade, cooperação, empatia e disciplina positiva;
4. Interesse da criança: Também levo em consideração os interesses dos meus filhos. Se o Ben está interessado em insetos ou vulcões , por exemplo, busco desenhos que abordem esse tema de forma educativa e divertida;
5. Duração e frequência: Limito o tempo de tela a dois episódios por vez. Cada um deles, Ben e Cora, elege um episódio, e após isso, eles mesmos desligam. Não permito o uso diário, o que ajuda a garantir que o tempo de tela seja uma atividade especial e não uma rotina diária.
“Esses critérios ajudam a garantir que o tempo de tela seja uma experiência enriquecedora e não apenas um entretenimento passivo. Permito que meus filhos assistam a desenhos de baixa estimulação, com conteúdo educativo e temas positivos, e que estejam alinhados aos interesses deles. Documentários são bem-vindos, e limitamos o tempo a dois episódios por vez, com cada um escolhendo um episódio e depois desligando”, conclui.