Linda, forte e decidida, desde que participou do programa ‘Big Brother Brasil’ em 2003, quando era a única mulher negra da terceira edição, Juliana, 37 anos, se tornou uma figura presente na TV, atuando em ‘Chocolate com Pimenta’ (2003), ‘Duas Caras’ (2007), ‘Caminho das Índias’ (2009), ‘Cheias de Charme’ (2012) e ‘O Tempo Não Para’ (2018), da Globo.
Também protagonizou um episódio da série ‘As Brasileiras’, na mesma emissora, em 2012. Junto com o diretor de cinema e marido, Ernani Nunes, idealizou a série virtual ‘Pra Nós’, transmitida em seu Instagram. E, com a retomada das gravações, está a todo vapor como a Renatinha de ‘Salve-se Quem Puder’.
A atriz ainda concilia o tempo entre a maternidade e o ativismo. Sim, sua voz ecoa fortemente a favor do movimento antirracista. Seu maior desejo? Que a pandemia sirva para fortificar as relações e a empatia entre as pessoas.
“Espero que a humanidade pare de normalizar coisas como o racismo e entenda que precisa desconstruir esse projeto de sociedade que se forma a partir da opressão do outro”, declara.
Que suas atitudes e propósitos nos sirvam de exemplo e inspiração!
TRILHA DE SUCESSO
Juliana foi rainha de bateria da Unidos da Tijuca e, neste ano, desfilou em três escolas. Além dos títulos carnavalescos, já recebeu o Prêmio Contigo! de Atriz Revelação, em 2008, e o Troféu Raça Negra de 2009. Com a participação nos programas humorísticos A Turma do Didi e Chico e Amigos, na Globo, ela reforçou sua veia artística também para o lado cômico. No cinema, ganhou espaço nas produções E Aí… Comeu? e A Comédia Divina.
SÉRIE VIRTUAL X PAPEL SOCIAL
A ideia do projeto Pra Nós era discutir desafios da maternidade e vida em família, mas assuntos relacionados à saúde e questões sociais também foram abordados: “No início da minha gestação foi importante ouvir algumas pessoas. Então, a série nasceu como uma forma de acolher quem agora vivencia o mesmo.”
Juliana é uma das atrizes negras mais reconhecidas no cenário brasileiro e costuma unir o trabalho com as pautas políticas e sociais: “Logo ficou claro que eu não poderia falar sobre maternidade sem discutir o combate ao racismo, até porque as desigualdades sociais são evidentes e minha militância se intensificou neste momento de pandemia”.
Não é à toa, portanto, que o programa enveredou para a discussão da necessidade de se construir uma sociedade mais justa. Mãe de Yolanda, de 2 anos, ela explica: “A maternidade é uma oportunidade para criar uma geração consciente. Por meio da educação, é possível conscientizar as crianças sobre a importância da empatia e o fim das desigualdades. Por isso, quando eu penso na criação da minha filha, percebo que tenho a missão de fazer com que ela contribua para um mundo melhor. Mas, para isso, a Yolanda precisa viver numa sociedade justa, que não a impeça de fazer nada por causa de uma determinada condição”.
RACISMO
A ex-rainha de bateria acredita que o racismo é menos discutido do que deveria no Brasil: “Enquanto a gente não reconhecer nossas mazelas e vergonhas, nada vai mudar”.
E ela vai além: “Às vezes, me sinto cansada porque, desde que nasci, vejo meus pais lutando contra o preconceito. Ainda assim, reconheço os avanços. Que a gente possa tornar o fruto desses debates em práticas efetivas, mudanças de condutas na criação dos filhos e políticas públicas e privadas que desconstruam as estruturas racistas do País. Uma sociedade mais democrática beneficia a economia, a imagem do Brasil e as nossas relações”, enfatiza.
Por outro lado, ela acredita que estamos em um momento de maior escuta: “Penso que 2020 entrará para a história. E espero que, lá na frente, quando a gente relembrar o que vivemos neste ano, possamos colher algo positivo. Desejo profundamente que a humanidade entenda a necessidade de abolir de uma vez por todas o preconceito”, declara.
FÓRUM DE PERFORMANCE NEGRA
O Fórum de Performance Negra, realizado em 2019, no Rio de Janeiro, contou com relatos importantes para entender o cenário do ramo das artes no País. A atriz foi uma das participantes, abordando a temática da mulher preta neste cenário, desafios e barreiras do dia a dia. De acordo com Juliana, sua participação é uma grande vitória.
“Por mais que meu objetivo artístico seja a versatilidade, sei que ainda somos muito subordinados por rótulos. Já vivi experiências em que amadureci, mas também que me frustraram e me fizeram sentir limitada. Até o momento em que eu me mobilizei e construí novas narrativas. O Fórum foi importantíssimo para discutir a respeito. Por isso, digo às mulheres negras: não acreditem na limitação de espaço e valor. Estudem muito e estejam junto de outros artistas negros. Próximas, nós nos fortalecemos”, fala orgulhosa.
CONSCIÊNCIA DESDE A INFÂNCIA
Juliana busca desde já falar sobre racismo com a pequena Yolanda, para que ela cresça segura e consciente: “Procuro ensinar os valores para ela. Minha filha brinca com brinquedos de todos os tipos e bonecas de todas as cores. Porém isso não basta se, na vida real, ela observa uma subalternação de pessoas negras, situações que façam juízo de valor pela cor da pele ou do cabelo. Quem educa precisa ter essa responsabilidade. Afinal, não educamos em uma bolha, educamos para a convivência!”.
“INJEÇÃO DE ÂNIMO DIÁRIA”
“A maternidade me transformou. A alegria da Yolanda é uma injeção de ânimo diária. Hoje, tenho mais responsabilidade, organização e cuidado comigo mesma. Preciso estar bem para cuidar dela. Profissionalmente, ganhei maturidade e maior discernimento dos caminhos que quero percorrer.”
Juliana reforça o quanto ser mãe é desafiador: “Esse papel carrega muitos desafios. Um deles é ensinar às crianças o quanto a autoconfiança e a autonomia são importantes. Também estimulo muito a troca de afeto”.
UMA PAUSA NA VIDA
Nesse período de isolamento social, além de dividir com o marido as tarefas domésticas e as atividades com a filha, ela realiza vários trabalhos on-line e garante: “Não é fácil, ainda assim, em termos de Brasil, posso garantir que é um privilégio conseguir tocar muitas obrigações de casa, porque a gente sabe que isso não é a realidade da maioria da população. Preciso agradecer por conseguir ter alguma produtividade no conforto do lar. Por outro lado, não é possível negar que senti demais a mudança brusca no ritmo de trabalho. A suspensão das gravações de Salve-se Quem Puder mudou totalmente minha rotina. Outros projetos também tiveram datas alteradas. Mas, quando tudo passar, voltaremos com força total… e sairemos melhor de tudo isso”, afirma.
Segundo a mamãe coruja, a filha vem reagindo bem à situação: “No início, ela amou estar com os pais o tempo todo. Depois, começou a dar sinais de irritação e pedir para ir à pracinha, ver as amiguinhas. Agora, com a retomada das gravações da novela, fico menos tempo com ela, que voltou a solicitar minha atenção. Talvez, se nosso País tivesse tido condutas mais adequadas inicialmente, nossas crianças poderiam já, já voltar à sua rotina. Enquanto isso, seguimos com o que não pode faltar de jeito nenhum: muito amor e afeto”.
E quando tudo isso passar? “Eu espero que a gente tenha aprendido o necessário e repensado certas atitudes, especialmente acabar de vez com o culto ao ódio, que muitas pessoas insistem em praticar. Numa situação de pandemia, o egoísmo e a falta do pensamento em prol do coletivo se tornam algo inadmissível. Vamos derrubar muros para construir pontes!”.
DESIGUALDADE SOCIAL
Questionada sobre o sentimento diante das diferenças sociais, Ju desabafa: “É um sentimento de grande tristeza e indignação. Como cidadã, tenho o dever de contestar e contribuir para que isso acabe. Como o combate ao racismo está diretamente ligado à desigualdade social, preciso lutar fortemente”.
SOBRE O BIG BROTHER BRASIL…
A ex-BBB Juliana Alves é enfática ao responder: não participaria novamente de um reality! Ela justifica: “Se perde muito quando você fica trancada num lugar com uma exposição daquelas. Não tem a ver com não gostar do programa. Só não abriria mão da minha liberdade, muito menos ficar longe da minha filha”, encerra.